O destino de Haffmann

O filme ajuda a compreender o período histórico do terror nazista, mas que tem reflexos e concretude nos dias atuais, quando vemos jovens fazendo apologia ao nazismo.

Relutei um pouco para assistir a esse filme, imaginando que veria cenas por demais violentas e extremistas, próprias dos filmes que registram o período do Holocausto dos judeus pelas mãos do nazismo na Segunda Guerra Mundial, tema que tem gerado tantos relatos e documentários assombrosos como crimes contra a Humanidade. O extermínio de cerca de seis milhões de pessoas por causa de sua etnia é uma das mais pavorosas tragédias humanas do século XX.

A pelicula francesa “O destino de Haffmann”, dirigida por Fred Cavayé, baseada na obra de Jean-Philippe Daguerre, se passa por volta dos anos 1940 em uma Paris tomada pelos nazistas. Esse filme, sem dúvida, entra em minha lista de indicados, pois é de uma excelência e um primor marcantes, tanto no que se refere ao roteiro, à fotografia envelhecida, à trilha sonora impactante (música de Jean Lenoir  e de Andre Grassi),  à atuação dos atores e o suspense constante que envolve a trajetória permeada de contradições e conflitos dos três personagens principais. A personalidade sólida e envolvente de Joseph (Daniel Auteuil), proprietário de uma joalheria, um ouvires talentoso que cria joias, com rara beleza, nos impressiona: a distinção de seu caráter, o amor por sua família e por seu povo e a justeza de suas ações. O novo funcionário da joalheria, François Mercier (Gilles Lellouche), ambicioso francês, casado com Blanche (Sara Giraudeau), por quem é apaixonado e com quem sonha ter um filho, recebe uma proposta de Haffmann e passam a viver na casa do joalheiro Joseph, enquanto sua família foge do terror nazista.

Leia também: Nazismo e liberdade de expressão

Blanche, a esposa doce, sonhadora e melancólica, demonstra inicialmente não compreender a drástica realidade da ascensão nazista, mas no desenrolar da história se destaca assumindo uma posição protagonista, ativa e decisiva. Ela, que inicialmente aparece com uma atitude ingênua, torna-se uma mulher consciente do cenário turbulento em que vive, ao mesmo tempo em que fica desolada com a revelação dos traços inescrupulosos do marido François, que vão se revelando durante o enredo. Blanche se transforma em uma personagem justa e atuante, firme e resoluta, inclusive resistindo ao descontrole e imposições de seu marido em torno de ações das quais ela discorda.  Esse ambiente degenera em violência, com um estupro  da própria  esposa, que acaba por desvelar o caráter de seu marido tanto no campo pessoal como quando torna-se patente que se tornou um colaborador dos nazistas.

Leia também: Um ponto fora da curva ou novo normal na política?

A trama vencedora no Festival “du Film de Sarlat” (Sarlat-la-Canéda é uma cidadezinha do Vale da Dordonha, na região conhecida como Périgord, sudoeste da França), em 2021, nas categorias de Melhor Atriz e Melhor Filme (Prêmio do Público), pode ser vista no streaming da NetFlix.  Ela foi adaptada da peça que recebeu quatro prêmios Molière, encenando a realidade dramática e intrincada do gênero humano, nessa quadra da história de uma emblemática condição a que foram submetidas nações inteiras, pelo discurso do ódio, pelo racismo exacerbado e a difusão da noção absurda eugenista da “raça pura”.  Adolf Hitler, com sua ideologia, embasava as ideias do anti-semitismo e da superioridade racial branca alemã, galvanizando a maioria da população do país germânico e levando-a a apoiar o absurdo da II Guerra Mundial, que sacrificou milhões de vidas de alemães assim como dos países subjugados pela Alemanha nazista entre 1939 e 1945.

O filme é de relevância para compreender um período histórico de terror, mas que tem reflexos e concretude nos dias atuais.  No caso do Brasil, infelizmente encontramos situações em que indivíduos fazem apologia do nazismo. Os noticiários trazem diariamente noticiais de jovens envolvidos, participando ativamente de grupos neonazistas. Imagens nos são apresentadas em que muitos se sentem à vontade em circular publicamente exibindo símbolos da cruz suástica, que representam ódio, intolerância, extermínio e racismo, com esse envolvimento ideológico traduzindo-se por vezes em manifestações a favor da volta de um regime ditatorial hegemonizado pelas Forças Armadas. Para além de recomendar esse filme, é necessário que mantenhamos  viva a memória dos horrores cometidos pelo regime ditatorial brasileiro de 1964, ou seja, precisamos nos empenhar em garantir que esses horrores não caiam no esquecimento e sejam devidamente compreendidos pelas novas gerações.

Ficha Técnica

Título: O destino de Haffmann (pode conter spoiler)

Título original: Adieu Monsieur Haffmann
Direção: Fred Cavayé
Duração: 116 minutos
País: França, Bélgica
Gênero: drama
Ano:2022

Referência:

https://brasilescola.uol.com.br/historiag/holocausto.htm

https://www.revistajovemgeek.com.br/2022/08/revisar-critica-o-destino-de-haffmann.html

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
Autor