Terceirização e trabalhadoras: Fórmula para aprofundar exploração

Na opinião de Lucileide Mafra, presidente da Federação Amazônica das Trabalhadoras Domésticas, a terceirização irrestrita aprovada na quarta-feira (22) na Câmara dos Deputados e que segue para sanção presidencial vai aprofundar a desigualdade em que vivem as trabalhadoras domésticas. Segundo ela, a medida toma enormes proporções diante da fragilização da Justiça do Trabalho, refúgio da categoria quando tem os direitos desrespeitados.

Por Railídia Carvalho

“A partir dessa terceirização certamente muita gente será prejudicada, principalmente as trabalhadoras domésticas que ainda nem estão acostumadas com a lei complementar 150. Ainda tem muita diferença entre essas trabalhadoras e de outras áreas”, comparou Lucileide. 
A lei complementar 150 que regulamentou o trabalho das domésticas foi sancionada pela ex-presidenta Dilma Rousseff em meados de 2015. A regulamentação do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, por exemplo, foi uma das conquistas.
 
O FGTS também é um dos direitos que as empresas terceirizadas não respeitam, afirmou a dirigente. Ela experimentou pessoalmente a maneira como as agências que terceirizam serviços domésticos burlam a lei, exploram o trabalhador e oferecem um serviço precário. 
Justiçao do Trabalho fragilizada

“Quando o trabalhador vê que a contribuição que é descontada dele não é repassada ao INSS ou que a terceirizada não deposita o FGTS, ele vai entrar na justiça. Mas cada vez mais a justiça tem demorado em marcar audiências e em solucionar esses casos. Enquanto isso o trabalhador fica sem poder sustentar a família, sem dinheiro e disposto a aceitar qualquer atividade em quaisquer condições”, explicou Lucileide.

Segundo ela, a aprovação da responsabilidade subsidiária no PL 4302 vai transformar o trabalhador em um joguete nas mãos da terceirizada. “Se for sancionado o PL, o trabalhador só vai poder acionar a terceirizada, que vai dizer que não vai pagar porque o trabalhador tem uma segunda opção”. 
Na opinião do Procurador Geral do Trabalho, Ronaldo Fleury, o trabalhador pode ter que esperar de 4 a 5 anos até transitar em julgado e só depois poderá acionar o local em que efetivamente trabalhou. Lucileide lembrou que, na contramão do PL, a maioria das trabalhadoras domésticas aciona primeiro na Justiça o tomador de serviço e não a terceirizada. 
“De forma geral, o projeto afeta todos os trabalhadores mas a gente pode ter certeza que as trabalhadoras domésticas vão ser mais prejudicadas pelo histórico de negação de direitos e de não reconhecimento dessa profissão”, avaliou.
Mulheres penalizadas
Asseio e limpeza, recepção, telemarketing e telefonia são segmentos em que as mulheres são maioria e que estão entre as áreas onde a terceirização é mais frequente.
 
“Nós costumamos dizer que a terceirização fere de morte as mulheres trabalhadoras. Primeiro porque as funções terceirizadas são aquelas repetitivas, com menores salários, com menos garantia de direitos, com alto índice de acidentes de trabalho e assédio moral e que são ocupados na maioria por mulheres”, declarou Ivânia Pereira, secretária da mulher trabalhadora da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB).
Ela considerou gravíssima a aprovação do PL 4302 porque acentua a precarização nas terceirizadas e estende aos setores que tem contratação direta. “Quando a gente percebe essas empresas terceirizadas, de um dia para o outro, mudam de nome, CNPJ, não recolhem o FGTS, não depositam para a Previdência e praticam a quarteirização”, enumerou Ivânia.
Autorizada pelo PL 4302, a quarteirização permite que a empresa terceirizada subcontrate outras empresas para “contratar, remunerar e dirigir os trabalhos de seus empregados”. 

Exploração

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, Ângelo Fabiano Farias da Costa afirmou à Carta Capital que o lucro só será atingido através do arrocho salarial e da retirada de direitos. “Se eu pago determinado valor ao funcionário e coloco um intermediário nessa relação, não tem como ficar mais barato sem perdas para o trabalhador”. 
“Por isso que a CTB convoca todas as mulheres para se organizarem e participarem efetivamente da luta contra a terceirização, a reforma da Previdência e a reforma trabalhista. Qual é a igualdade que esse governo está propondo? No nosso entendimento ele está acentuando a desigualdade de gênero com a reforma da Previdência e todas as iniciativas que culminam com a ruptura de conquistas celebradas tanto na CLT quanto na Constituição Federal”, enfatizou Ivânia.