Máximo Gorki, o escritor da revolução proletária

“A história do trabalho e da ação humana é bem mais interessante e significativa do que a história do homem como individualidade.” Esta frase, que inicia o texto Como aprendi a escrever, de Máximo Gorki, define os rumos básicos que estruturam sua obra literária.

Por José Carlos Ruy

Gorki - Reprodução

Para Gorki, “não existem ideias fora do homem: o homem é somente o homem, o criador de todas as coisas, o criador de milagres e o futuro senhor de todas as forças da natureza. As mais belas coisas deste mundo são as criadas pelo trabalho, por hábeis mãos, e todos os nossos pensamentos e nossas ideias nascem do processo do trabalho”.

Filho de uma serva e de um rebocador de barcos no Volga, ele nasceu em 16 de março de 1868 com o nome de Aleksei Maksimovitch Pechkov. Desde os 10 anos teve que trabalhar para viver: foi descarregador no porto, jardineiro, corista de teatro, ajudante de sapateiro, pintor de ícones, vendedor de frutas, ferroviário e, sobretudo, padeiro.

Sem frequentar escolas, tudo o que aprendeu lhe foi ensinado pelo que chamou ironicamente de “minhas universidades”: a vida.

Pechkov adotou o pseudônimo de Gorki (significa “amargo”) em Tifilis, ao publicar sua primeira novela, em 1892. Considerado o maior escritor soviético, Gorki vai além do realismo tradicional e, escritor eminentemente proletário, abriu uma nova fase na literatura, dando continuidade ao grande realismo burguês do século 19, de Balzac, Stendhal e Flaubert. Ele inaugurou um realismo de tipo novo, que alguns chamaram de “socialista”. O povo pobre, principalmente os marginalizados, são os personagens centrais de sua obra.

A luta titânica de seu povo e sua conscientização no conflito contra o czarismo é o tema de uma de suas obras mais importantes, A Mãe, cuja ação se passa na revolução malograda de 1905 e que, por isso mesmo, destinava-se a não deixar esmorecer o ímpeto popular. “Esse livro vem precisamente a tempo”, comentou Lênin, o líder da Revolução Russa.

A confiança na revolução, dirigida pelo partido dos operários, não transparece apenas na literatura de Gorki. Mas foi uma característica essencial de sua personalidade, que cedo levou-o aos grupos revolucionários e ao marxismo. Em sua juventude ele conheceu deportados e degredados políticos e soube que existia gente que lutava para transformar aquele mundo de miséria, pobreza e imensa exploração. Também Gorki foi vítima de prisões e perseguições.

Sua atividade literária ligou-se intimamente à luta política. Um verso de O anunciador da tempestade (Cantemos a loucura dos bravos) virou verdadeiro apelo revolucionário. Em 1903, já um escritor de renome, ele aproximou-se dos bolcheviques e foi aprofundando sua diferença em relação aos intelectuais liberais.

Em 1905, publicou, no diário bolchevique A Vida Nova, suas “notas sobre o espírito pequeno burguês”, onde denunciou a vacilação e ridicularizou o comodismo e subjetivismo dessa camada social. Sua atividade contra o governo czarista levou-o ao exílio, que só terminou com a Revolução Russa de 1917. Buscou animar a vida intelectual, principalmente com a atividade cultural dos operários. Tornou-se Comissário do Povo para a Melhoria das Condições de Existência dos Cientistas, em 1918.

Em 1921 adoeceu e, por insistência de Lênin, foi tratar-se no exterior, voltando à URSS em 1928, sendo então muito homenageado. O contato com a obra do regime socialista, que lançava as bases de uma vida nova para o povo russo, fez Gorki lançar-se ainda com mais vigor na defesa dos interesses do proletariado revolucionário.

O romancista passa a compor obras autobiográficas e de reminiscências, que muitos consideram aquilo que de melhor ele escreveu. Dedicou-se também a animar os jovens autores soviéticos, “atira-se para essa corrente literária que não cessa de aumentar, lê manuscritos, prefacia, corrige, explica, discute linha por linha e, não conseguindo responder a cada um, escreve cartas coletivas dirigidas a grupos” de escritores operários, registrou Nina Gourfinkel no livro Gorki.

Gorki dedicou-se à defesa e edificação de uma vida nova fazendo aquilo em que era mestre, escrevendo e ensinando a escrever. No 1º Congresso de Escritores Soviéticos, em 1934, apresentou um relatório que foi usado como base para a edificação oficial da doutrina estética do realismo socialista.

Numa longa carta para escritores estrangeiros, em 1932, ele falou na força operária na criação de novas formas de vida e fez uma pergunta que completa aquela sua profissão de fé no homem citada no início deste artigo: “De que lado estão vocês, os mestres da cultura? Com a força operária da cultura, pela criação de formas novas de vida, ou contra essa força, pela conservação da casta de espoliadores irresponsáveis, da casta podre da cabeça aos pés, que continua agindo em virtude da lei da inércia?”

Gorki havia conquistado o direito de colocar esta questão central da cultura de nosso tempo de maneira tão inequívoca. Sua vida e sua obra o autorizavam a isso.