O poeta e dirigente político uruguaio Mario Benedetti despediu-se da vida faz 10 anos, em 17 de maio de 2009. Perdeu a literatura, perdeu a humanidade, mas seu humor tranquilo e muitas vezes mordaz permanece na herança de seus escritos – expressão sensível e eloquente da consciência avançada da América Latina.
Por José Carlos Ruy
Publicado 16/05/2019 23:26 | Editado 13/12/2019 03:29
A literatura ficou de luto naquele domingo, 17 de maio de 2009: o grande poeta uruguaio Mario Benedetti deixou de viver. Ele tinha 88 anos de idade e deixou um legado de mais de 80 romances, ensaios, contos e principalmente poemas que fazem parte da mais elevada expressão do sentimento humano nesta parte do mundo e que registram a crença, como ele dizia, ”na vida e no amor, na ética e em todas essas coisas tão fora de moda”.
Mario Benedetti referiu-se a seu pai, na dedicatória do romance "Primavera num espelho partido", dizendo que ele fora "boa gente". Os poemas de Benedetti dão ao leitor a impressão de que ele próprio podia ser definido assim, como "boa gente".
Militante e dirigente de esquerda (em 1971 ele foi um dos fundadores do Movimento 26 de Março, marxista leninista, expressão política do Movimento de Libertação Nacional – Tupamaros), seus escritos oscilaram sempre entre um lirismo tocante e um compromisso social permanentemente reafirmado; muitas vezes, conseguiu a habilidade de unir estas duas dimensões, a lírica e a social, em poemas como este, escrito quando Che Guevara foi morto na Bolívia:
ou
Ou
ou
São textos que exprimem uma experiência de vida intensa e rica, que se desdobrou em inúmeras atividades para ganhar a vida (empregado de uma oficina, taquígrafo, caixa, vendedor, contador, funcionário público, tradutor e jornalista, antes viver somente de literatura), e muitas vezes a amarga paciência do exílio. Seus poemas, disse o escritor argentino Pedro Orgambide na introdução a uma antologia, "são o inventário de um homem de aparência simples, de gesto e voz medida, de um próximo, um ‘fulano’ que fala de amor", de "mulheres nuas, e leva às pessoas sua palavra despojada de solenidade", perseverando em "seu ofício de poeta que não é outra coisa senão seu ofício de viver."
Militante desde a década de 1940 da luta pela paz, foi um incansável crítico do imperialismo dos EUA. Foi um dos fundadores e diretor, entre 1968 e 1971, do Centro de Pesquisas Literárias da Casa de las Américas, em Havana (Cuba). Em 1971, ano de fundação do Movimento 26 de Março, foi nomeado diretor do Departamento de Literatura Hispanoamericana na Faculdade de Humanidades e Ciencias da Universidade da República, de Montevidéu, cargo que manteve até 27 de Junho de 1973, quando um golpe de estado iniciou a ditadura militar no Uruguai. Em consequência, Benedetti renunciou ao cargo na Universidade. Exilou-se na Argentina, Peru e, em 1976, em Cuba. Só voltou ao Uruguai em 1983, depois do fim da ditadura.
No poema Digamos, ele escreveu
No domingo, 17 de maio de 2019, o amanhã de Benedetti acabou, mas – como ele sempre soube – sobrevive em todos nós, os outros.