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Celso Marconi: Um filme sobre a guerra no Líbano e a emoção pessoal 

Esse filme que tem um título em português, O Ocaso de um Povo, outro em alemão, Die Fäelschung, e outro em inglês, Circle of Deceit, é dirigido pelo cineasta alemão Volker Schlöndorff. Lançado em 1981, foi visto por mim quando eu era crítico de cinema profissional no Jornal do Commercio. Se alguém procurar no arquivo do jornal, encontrará minha crítica, que o considerava um bom trabalho.

Por Celso Marconi*

Cinema alemão

Agora eu o revi no site Making Off. A minha opinião continua a ser de aplausos, não só pela estrutura cinematográfica, mas como um drama psicológico intenso, embora o filme possa receber a classificação simples de um drama de guerra. Procurei a tradução do título Die Fäelschung, e encontrei só “As falsas”. Mas um amigo que mora na Alemanha, Vládmir Combre de Sena, me informou que a tradução correta seria “A falsidade”.

Poderíamos entender o título como uma referência à relação dúbia da personagem vivida por Schygulla. Ou então, se tentarmos compreender por que esse título seria usado, somente buscando intenções implícitas, tanto no conjunto da estória quanto na vida dos outros personagens, encontraríamos razão semelhante.

Esse filme é bem característico do cinema alemão, ainda que a produção seja uma coprodução da Alemanha com a França. Mas, como o diretor é o principal condutor da narrativa, é alemão. O que o espectador encontra é um drama consistente, forte, denso, tanto enquanto drama sobre a guerra civil no Líbano, quanto sobre um drama individual. E nessa parte, sobre a vida pessoal de um jornalista alemão que é enviado a Beirute para cobrir a guerra, Schlöndorff contou com o excelente e reconhecido ator alemão Bruno Ganz, o que talvez tenha sido fundamental para a consistência dramática do filme.

A película também possui a presença da bela e eficiente atriz Hanna Schygulla. Até dá saudade quando a revemos vivendo uma senhora que mora em Beirute e se incorpora à vida da cidade, inclusive adotando uma de suas crianças. Nele, vemos ainda a bela atriz Gila von Weitershausen, que interpreta a mulher do jornalista Laschen. Já no começo do filme, ela vive um momento erótico muito bem desenvolvido.

O ator Jerzy Skolimowski, que vive o fotógrafo, interpreta-o com uma presença fundamental, pois através dele o diretor mostra muitas cenas da sangrenta guerra, já então dividindo irmãos, além de palestinos e israelenses. Volker Schlöndorff manteve a narrativa sempre numa intensidade densa, tanto nos momentos de guerra quanto nas cenas individuais, e isso instiga certamente os atores – e tudo com um muito bom trabalho de montagem. O roteiro musical completa a dimensão dramática, sem muito se destacar.


Cartaz da versão original, em alemão, de O Ocaso de um Povo

Penso que deveria ser mudado nesse filme o título, pelo menos em português. Há uma sequência final muito expressiva e que merece atenção, quando Bruno Ganz volta para casa e se joga no banheiro com roupa, sapatos e vai aos poucos se despojando da sujeira do corpo e das roupas, Depois sai vestido num belo roupão, com um visual que tenta dizer, me parece: “Escapei desse horror e volto para minha vida. Esqueçamos tudo o mais”. É um desfecho no mínimo cínico, filosoficamente.

* Celso Marconi, 89 anos, é crítico de cinema, referência para os estudantes do Recife na ditadura e para o cinema Super-8