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Celso Marconi: Coringa, um produto da cultura pop 

Foi simplesmente pelo sucesso de público que me senti atraído para ver Coringa, essa atual versão da série que se liga ao comics norte-americano, tendo o personagem Batman como figura principal. E digo sucesso de público não pelo número de espectadores – mas pelo número de pessoas, críticos ou não, que vi considerar o filme de Todd Phillips como “um impacto total”, que “deixa a gente estático”. Então me senti obrigado a ver esse produto novo do cinema hollywoodiano.

Por Celso Marconi*

Coringa

Coringa não chegou a me impactar. Soube que saiu uma reportagem quando o filme ganhou o Leão de Ouro no mais antigo festival de cinema do mundo, o de Veneza, e nela se comentava que havia um acordo, alguns anos antes impossível, para uma dobradinha entre Veneza e o Oscar. Certamente, em 2020 o grande premiado do Oscar será o Coringa.

O roteirista e diretor Todd Phillips tem no Coringa seu décimo produto. Mas nenhum dos seus filmes anteriores fez grande sucesso de público. Na maioria, são documentários. Se Coringa não fosse ligado à estória do Batman, ele não faria o sucesso que está fazendo. É um filme de excelente confecção técnica e artística. A partir do roteiro, da fotografia, das interpretações, da trilha sonora, da direção, a obra se faz admirar.

Mas é claro que a atração que ele está despertando tem a ver mesmo com a série. Multidões continuam a se ligar aos quadrinhos, e particularmente aos comics norte-americanos. Lá e em todo o mundo. Não é simplesmente cinema, mas cultura em termos fundamentais.

Minha ligação com Batman e Gotham City é longínqua, e talvez tenha me divertido um tanto com esses assuntos, acompanhando o artista brasileiro Jards Macalé, quando ele criou personagem e música satirizando, sem dúvida, a cultura norte-americana. Mas é verdade que mesmo o brasileiro que não leia quadrinhos é influenciado tranquilamente por esses objetos e fatores.

Entrando um pouco na análise do argumento de Coringa, levo em consideração uma matéria sobre o filme que o Jornal do Commercio do Recife publicou recentemente, não na página de cultura, mas na de Internacional. E a grande questão era se o filme de Todd Phillips tinha como base estrutural o marxismo. Foram ouvidas pessoas da direita política e citadas pessoas da esquerda.

Com certeza, estão todos em dúvida se está havendo “infiltrações” marxistas no cinema hollywoodiano. É até risível. Entretanto, não podemos ter dúvidas de que a filosofia criada por Karl Marx perpassa hoje toda a Cultura. É uma base de formação cultural. E toca qualquer um que trabalhe principalmente com criação intelectual.

A meu ver, qualquer um que julgue uma obra artística leva sempre em conta um aspecto fundamental: é um trabalho artesanal ou uma criação de arte? Coringa, de Todd Phillips, é um excelente produto artesanal, a ponto de não se deixar dominar por exageros técnicos, como é comum no cinema norte-americano. Há uma certa naturalidade na linguagem, nenhum excesso de efeitos especiais. Mas não há o clic da verdadeira arte.


Atração despertada pelo Coringa está relacionada à série em HQ, particularmente aos comics

Quero me referir ao fato de que vi Coringa num ótimo cinema do Shopping Patteo. E numa versão dublada. Antigamente, já fui a favor e também contra dublagem para os filmes estrangeiros. Na verdade, hoje sou a favor. No Coringa, o trabalho é excelente. Inclusive é bom notar que, nesse filme, os escritos referentes a momentos da vida do personagem criam os papéis em português num trabalho muito bem aprimorado. Tecnicamente, temos que dar a cotação “ótimo” para esse filme.

* Celso Marconi, 89 anos, é crítico de cinema, referência para os estudantes do Recife na ditadura e para o cinema Super-8. É colaborador do Prosa, Poesia e Arte.