Reforma da previdência de Bolsonaro ameaça economia dos municípios

Pesquisa realizada pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip) aponta que os benefícios pagos pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) superam o valor da arrecadação e do repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) de 87,9% dos municípios brasileiros (4.896). É essa economia gigantesca que está sob ameaça com a proposta de reforma da Previdência no Congresso Nacional.

Por Iram Alfaia

Trabalhador rural

“O fato de a maioria dos municípios brasileiros e de todas as regiões e estados apresentarem valor de benefícios superior ao FPM e à arrecadação, apenas reafirma a tese da importância da previdência social como promotora de cidadania e de justiça social”, diz o documento.

Responsável pelo sustento de milhões de famílias brasileiras, sobretudo nas pequenas cidades e nas áreas rurais, a pesquisa diz que os recursos da aposentadoria têm cumprido um papel importante na composição da renda familiar e no fomento da economia dos municípios.

“Não fossem os benefícios pagos mensalmente a aposentados e a pensionistas, principalmente no meio rural dos pequenos municípios, já teria se instalado uma situação de calamidade na maioria das cidades brasileiras”, conclui o estudo.

Com base em informações de dezembro de 2017, os dados revelam que o INSS pagou 34 milhões de pessoas, das quais 24,9 milhões do setor urbano e 9,5 milhões do setor rural.

Segundo o juiz federal e doutor em direito público João Batista Lazzari, que prefaciou o estudo, os dados apurados pela ANFIP provam que a previdência social é a responsável pela “maior e mais expressiva política pública de redistribuição de renda do Brasil, atuando fortemente na redução das desigualdades regionais”.

“O mais impressionante é que a maioria dos benefícios pagos, 67,7%, correspondeu a um salário mínimo, sendo que, na clientela urbana, esta faixa de beneficiários representou 55,6% do total e, no meio rural, quase a totalidade dos benefícios, alcançando 99,3%”, explicou João Lazzari.

Alerta aos municípios

Em entrevista ao Vermelho, o presidente da Anfip, Floriano Martins de Sá Neto, diz que o estudo visa alertar aos municípios sobre os dados que são omitidos quando se faz uma reforma que tenta impedir o acesso aos benefícios previdenciários.

“O governo não tem interesse em divulgar, mas os munícipes e os comerciantes precisam saber que reforma da previdência vai matar a galinha dos ovos de ouro (…) São esses recursos que mobilizam as economias e chegam até a ser superior ao que o governo repassa pelos fundos constitucionais”, argumentou.

Nesse contexto, o presidente da Anfip diz que os mais prejudicados com a proposta de reforma da previdência do governo Bolsonaro são as pessoas mais pobre da população.

“Nessa parte o próprio governo confessa. Ele colocou na exposição de motivos que basicamente 80% da economia que fará com a reforma virá das aposentadorias urbanas, rurais, PIS/PASEP e mais o BPC (Benefício de Prestação Continuada – pagos a idosos e deficientes pobres) ”, disse Floriano de Sá Neto.

São R$ 800 bilhões que sairão da atividade econômica com o R$ 1 trilhão que o governo pretende economizar em dez anos.

“Fica claro que é a previdência que movimenta o pouco do dinheiro que gira nessas economias e que fixa o homem na área rural e nos pequenos municípios, o dinheiro vem da aposentadoria”, afirmou o presidente da Anfip.

Na sua análise, a proposta da previdência contribui para que a pobreza entre os idosos volte a crescer após anos de redução, trazendo consequências danosas para os grupos familiares. “É esse ponto que buscamos trazer para a racionalidade do debate, esse lado que não é falado”, diz.

Aposentadoria rural

Segundo o estudo, a aposentadoria rural constitui a principal fonte de rendimento das famílias rurais, tendo ultrapassado, na última década, os rendimentos advindos do trabalho na agricultura familiar.

“Com efeito, embora a Previdência seja paga, hoje, a 30% das famílias rurais, ela responde por 32% da renda per capita do universo dos domicílios rurais. Isto significa que quase 1/3 da capacidade de consumo de toda população rural vem da Previdência”, diz a pesquisa.

Além disso, o pagamento dos benefícios das aposentadorias rurais não se limita às famílias que o recebem, elas são fundamentais para a economia dos municípios do interior do país, sobretudo naqueles com menos de 50 mil habitantes.

“Quanto mais a população vive na área rural mais relevante é do ponto de vista econômico”, diz Floriano Sá Neto, para quem as mudanças nas regras como o aumento da idade para 60 anos (homens e mulheres) vai inviabilizar a aposentadoria e condenar essa população a viver no cinturão de pobreza dos centros urbanos.