Eleições polêmicas marcadas para março no Egito

A Comissão Eleitoral egípcia anunciou que as eleições presidenciais do país ocorrerão em março desse ano. Abdel Fattah al-Sissi, militar e atual presidente, anunciou que vai se candidatar para um segundo mandato. A eleição será a terceira após a queda de Hosni Moubarak, durante a Primavera Árabe

Sissi presidente egípcio

O presidente egípcio, Abdel Fattah al-Sissi anunciou que irá se candidatar para as eleições de março e tentar um segundo mandato. Militar e general, Sissi participou do golpe de Estado que tirou do poder o primeiro presidente eleito democraticamente no Egito, Mohamed Morsi, filiado ao partido da Liberdade e Justiça, conhecido por ter ligações com a Irmandade Muçulmana Egípcia, o movimento político de bases islâmicas mais organizado do país. Após o golpe militar do qual Sissi se tornou principal ícone, nas eleições de 2014 ele foi eleito para presidente, e governou o país africano até hoje com “mão de ferro e sem qualquer oposição”, como descreveu a jornalista portuguesa Sofia Lorena, que acompanhou sua eleição em 2014.

Lorena relata que durante o mandato de Sissi nos últimos sete anos, iniciou-se uma ofensiva para silenciar os jornalistas na hora de noticiar sobre qualquer manifestação contra o governo; 60 mil pessoas foram detidas por motivos políticos, e nos últimos dois anos 100 prisioneiros foram executados, enquanto outras 17000 pessoas desapareceram. “Em 28 anos de trabalho pelos direitos humanos nunca vi tempos tão obscuros para o movimento. Nunca imaginei que chegaríamos nisso”, disse ao jornal Publico Gamal Eid, o mais conhecido dos advogados de direitos humanos do Egito e diretor da Rede Árabe para a Informação sobre Direitos Humanos.

O único nome que reúniu alguma expectativa entre os egípcios inconformados com a política, a maioria jovens desiludidos desde que os militares tomaram o que era para ser uma revolução, foi Khaled Ali, advogado e ativista, conhecido pelo seu discurso anticorrupção e por ser defensor dos direitos trabalhistas. Ali ficou conhecido após liderar a luta pela soberania de duas ilhas localizadas na entrada do Golfo de Aqaba, que Sissi ofereceu aos sauditas como agradecimento por uma ajuda milionária- usada inclusive no combate contra a Irmandade Muçulmana. O advogado de 45 anos é filiado ao partido socialista egípcio Pão e Liberdade.

Ali foi acusado por um jornal estatal nacionalista de ser financiado pela União Europeia; contudo, a UE tem elogiado a presidência de Sissi. Como reporta Lorena em matéria do Publico, em outubro de 2017 Emmanuel Macron hospedou o militar em Paris, onde ambos assinaram um acordo para a compra de aviões de combate e softwares de vigilância. Em agosto do mesmo ano, Sissi assinou um acordo com a Alemanha para impedir a ida de refugiados para a Europa; o ministro das Relações Exteriores alemão, Sigmar Gabriel, chegou a dizer que os egípcios tinham “um presidente impressionante”. Comparado a Bernie Sanders pelo jornal The Guardian, devido as suas propostas de aumentar a cobertura dos cuidados de saúde e instituir um salário mínimo, Ali desistiu da corrida eleitoral na semana passada, acusando autoridades de perseguição e a Comissão Eleitoral de parcialidade.

O antigo chefe do Estado-Maior do Exército, Sami Annan, considerado o maior rival do presidente, foi impedido de se candidatar. Foi detido no âmbito de uma investigação por falsificação de documentos e violação das normas militares – que proíbem oficiais no ativo de concorrerem a eleições. Annan era visto por muitos como o candidato da Irmandade Muçulmana, depois de ter recebido o apoio da organização considerada terrorista pelo atual governo. Foi alvo de várias acusações e difamação ainda antes de ser detido. Um conhecido apresentador de televisão acusou Annan de "hostilidade para com o Exército egípcio". Já o antigo primeiro-ministro Ahmed Shafiq – tido como um forte opositor a al-Sissi – desistiu da corrida na semana passada, alegando que, após vários anos no exílio, perdeu a ligação com a realidade egípcia e não seria a pessoa "ideal" para liderar o país neste momento.

O panorama era e que Sissi iria concorrer sozinho, depois de uma série de desistências e candidatos afastados da corrida eleitoral, como conta a agência alemã Deutsche Welle. Várias figuras proeminentes da oposição apelam a um boicote às presidenciais, condenando a onda de repressão que terá ditado o afastamento dos candidatos da oposição. Contudo, nos últimos momentos, Mussa Mustapha Mussa, líder do partido liberal Al-Ghad – que apoia o regime de Abdel Fattah al-Sissi- se candidatou, apesar de não apresentar oposição ao atual presidente. 

Conforme a Autoridade Nacional de Eleições divulgou, o primeiro turno das eleições presidenciais será do dia 26 ao dia 28 de março, e o segundo turno será realizado, se necessário, de 24 a 26 de abril.