Reforma eleitoral, a reforma possível


Enquanto o Senado é sangrado por sua crise, a Câmara dos Deputados se prepara para votar um pequeno mas consistente passo democratizante, a reforma eleitoral. Um dos seus destaques é a liberação das campanhas eleitorais na internet, inclusive via emails, blogs, twitter, orkut e até a captação de doações pela rede.
 


O conjunto de medidas da reforma eleitoral é resultado de um laborioso e complexo esforço de obtenção de consensos. Protagonizou-o um grupo de trabalho multipartidário, com representações da base do governo Lula e da oposição, trabalhando sob dupla pressão.
 


Uma é a do calendário eleitoral, que impõe ao menos 12 meses de prazo para que leis desta natureza tenham validade. A outra, a do apetite legislativo do Judiciário, que em outras ocasiões aproveitou-se da inércia do Congresso para fixar as suas próprias regras, às vezes exorbitando e coagindo, segundo as queixas de parlamentares, que citam como caso clássico a norma engessante da ''verticalização''.
 


Nasceu daí o Projeto de Lei 5498/09, que a Câmara pretende votar ainda nesta semana para dar tempo à tramitação no Senado – se sua crise o permitir. Deste modo as novas regras funcionarão já em 2010. A decisão quase unânime de votá-lo com urgência (houve um só voto contra) expressa a decisão de validá-lo.
 


''Estamos construindo um consenso progressivamente, num processo político rico e que facilitará e agilizará em muito a votação em Plenário”, disse o deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), que coordenou a redação do projeto. Ele o qualifica como o pacto político possível no momento e saúda em especial a derrubada das atuais restrições ao uso da internet, ''que nos colocará no século 21''.
 


O consenso vai além dos limites da Câmara. O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) saudou o projeto como “uma contribuição importante para a ampliação da democracia e da transparência nas doações a candidatos”. 
 


Com certeza não será nenhum unguento milagroso capaz de curar as chagas, deformidades e aleijões do sistema político brasileiro. O nome – reforma eleitoral – foi escolhido para marcar a diferença com a reforma política, mais ambiciosa e profunda.


 


Esta, porém, fracassou rotundamente nas duas vezes em que foi esboçada, em 2007 e novamente nos últimos meses. Ao que parece, remédios mais drásticos – especialmente o voto em listas partidárias e o financiamento público de campanha – esbarram em resistências intransponíveis em um corpo parlamentar que é fruto do velho sistema de voto em indivíduos e do financiamento privado – quase todo empresarial.
 


Nestas circunstâncias, o PL 5498/09 aparece como a modesta reforma democratizante possível, para hoje e 2010. Fica a esperança de que este debate retorne durante a próxima campanha eleitoral, forme convicções na sociedade civil e na massa de eleitores, detentora da soberania popular de onde emana todo poder, ou deve emanar.
 


É daí que pode nascer a vontade política capaz de vencer as resistências e renitências do velho sistema, derrotando o fato consumado de hoje com a força do fato novo de amanhã. Até lá, ao menos as regras do jogo não terão marcado passo caso a reforma eleitoral vire lei até outubro.