O governo e o impasse da Varig

A agonia da Varig promete se estender por mais e mais penosos capítulos,
depois do leilão inconcluso desta quinta-feira (8). A empresa resvala aos
solavancos para a morte, com võos suspensos e ameaças de arrresto de
aeronaves. Até o momento, o governo federal lavou as mãos, na esperança de
que tudo vai dar certo graças à mão invisível adamsimthiana do mercado.
Porém os interesses da nação brasileira exigem outro desfecho. E os da
integração sul-americana também.

Não se trata aqui da imagem que a empresa construiu ao longo de sucessivas
gerações de brasileiros. Ainda que real e respeitável, este joga um papel
lateral. Trata-se do papel real do transporte aéreo de cargas e passageiros
no mundo do século 21.

O setor, que exige enormes capitais e renovação tecnológica, já entrou no
século em crise, marcado por prejuizos, fusões, incorporações e associações.
O baque do 11 de Setembro de 2001 agravou o quadro, e vários Estados
nacionais, a começar pelo norte-americano, trataram de intervir em defesa de
suas companhias. A crise da Varig, com suas particularidades, é parte deste
panorama mundial.

Apenas os mais devotos fanáticos do neoliberalismo acreditam (há também os
que tentam fazer acreditar) que esses movimentos obedecem às puras leis da
livre concorrência. Em um segmento altamente oligopolizado, ao lado da lei
do mais forte atuam aí os interesses nacionais, na razão direta do poder e
do empenho de cada nação.

O Brasil precisa de uma companhia aérea internacional. Esta é condição
indispensável para que as conexões do país com o resto do mundo não escapem
por completo ao seu controle e não se estiolem em rotas ditadas a partir de
fora.

Pelo sim e pelo não, esta companhia é a Varig, com sua trajetória concreta,
suas qualidades e defeitos, sua prolongada crise e seu atual estado
pré-falimentar. Recuperar a Varig é do interesse nacional. Deixá-la
sucumbir, aliená-la a capitais externos ou fatiá-la entre as concorrentes
prejudicaria o Brasil.

Prejudicaria igualmente o projeto da integração sul-americano. De qual
integração se poderá falar caso, por exemplo, as rotas Manaus-Caracas ­ ou
Manaus-Bogotá, se assim preferirem os desafetos de Hugo Chávez ­ exigirem
escala em Miami?

É lícito questionar se uma ação do governo para salvar a Varig não deveria
ter ocorrido antes, com menor custo e melhor resultado. Cabe igualmente
recordar a contribuição do governo passado na sabotagem da empresa, ao
manter as tarifas aéreas congeladas ao par com o câmbio fictício, enquanto
negava o socorro do BNDES. Mas o que efetivamente importa é o presente, e o
futuro.

Nas condições concretas produzidas pelo leilão de quinta-feira, a
alternativa que mantém a Varig funcionando, em mãos brasileiras, é a oferta
feita pelo consórcio liderado pelo TGV (Trabalhadores do Grupo Varig). Há
sinais de que a recuperação da empresa só se viabilizará economicamente com
ajuda estatal. É do interesse nacional que a ajuda se efetive. O BNDES
existe, também, para casos assim.