O enigma do crescimento de Bolsonaro nas pesquisas

(Foto: Marcos Corrêa/PR)

As últimas pesquisas, a exemplo da realizada pelo Datafolha, atestam que subiu aprovação e caiu a rejeição do presidente Jair Bolsonaro. Isso quando o país cruzou trágica marca de cem mil mortos pela Covid-19 e atravessa forte recessão, com quebradeira de milhares de empresas e com taxa de desemprego beirando 14%.

Paradoxalmente, duas vitórias da oposição incidiram para fazer crescer o desempenho de Bolsonaro. Primeiro: o auxílio emergencial R$ 600,00 à população carente é fruto de uma decisão do Congresso Nacional. Bolsonaro demorou uma eternidade para responder à pressão social que reclamava essa providência e quando o fez foi com a irrisória proposta de Paulo Guedes de R$ 200,00.

Cerca de 60 milhões de pessoas foram beneficiadas, com impacto social relevante. Neste país de arraigada tradição presidencialista, grande parte dos que recebem o benefício é grata “ao presidente”, a quem credita a paternidade do auxílio.

Segundo: confrontado pela oposição e pelos movimentos de frente ampla, acossado por inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF), Bolsonaro foi obrigado, momentaneamente, a conter sua escalada golpista contra a democracia. Esse reposicionamento político do presidente, deu uma falsa aparência de retorno à alguma normalidade institucional, criando um movimento de rearranjo de forças na sociedade.

Em vez de dar sequência aos ataques ao Congresso Nacional, ele pôs de lado seus capitães do mato e os substituiu por lideranças do Centrão, a quem outrora amaldiçoava.

A fotografia do instante indica números favoráveis ao presidente. Mas essas mesmas pesquisas refletem uma sociedade crispada, dividida, sendo Bolsonaro rejeitado por segmentos importantes e por um percentual significativo da sociedade. Se 47%, segundo o Datafolha, isentam o presidente de responsabilidade quanto a mortandade provocada pela pandemia, 52% o responsabilizam (destes, 11% o culpam inteiramente).

É preciso deixar claro que, embora o presidente empreenda mutações na sua conduta política e até possa também fazê-lo em aspectos da pauta econômica de seu governo, a essência não se altera: Bolsonaro segue neofascista e, como disse o ministro Edson Fachin, do STF, sem mencioná-lo, trata-se de um cavalo de troia, infiltrado no âmbito do regime democrático, pronto para destruí-lo, oportunamente.

O anúncio dessas pesquisas provocou certo estranhamento, em especial em setores da oposição. Como se explica Bolsonaro ter aumentado sua aprovação no contexto de uma tragédia nacional, cuja dimensão elevada é decorrente da conduta irresponsável e criminosa do presidente? Se desfazem ilusões de setores da oposição que julgavam o governo Bolsonaro fraco e batido.

De onde provém a resiliência de Bolsonaro e, agora, a recuperação de força? A raiz é a grande derrota do campo democrático, popular e patriótico – em especial da esquerda – nas eleições de 2018. Quando um bloco neofascista chega ao governo da República pelo voto, a luta para apeá-lo do poder pode ser longa. Não se refaz de um revés desse porte da noite para o dia.

Certa autofagia que setores da esquerda seguem a praticar, a falta de convergência tática do campo da oposição, por certo, dão margem de manobra a Bolsonaro. Outro fator, nada desprezível: o imperialismo estadunidense o respalda, os grandes grupos econômicos e financeiros também.

Todavia, as “mutações” de Bolsonaro, a pantomima de um “social-desenvolvimentista” que ensaia trajar, não cabem na sua figura real. Além do que essa pantomima provoca contradições na sua base de apoio. Os banqueiros e os grandes grupos econômicos e financeiros temem que Bolsonaro enverede pelo caminho do que chamam de “gastança”. Exigem que a Emenda Constitucional do teto do gasto se mantenha intocável.

Desde a posse, Bolsonaro perdeu em torno de 20% dos 55, 1% dos votos que obteve do segundo turno das eleições. Apesar das adversidades, a oposição, os movimentos de frente ampla e a resistência democrática demarcaram o território da vida política e social do país.

O campo da vida, da democracia, dos direitos se confronta com o campo do neofascismo bolsonarista, responsável pela tragédia de mortes, pelo desemprego em massa e por falências de milhares de empresas.

O campo da vida, da democracia e dos direitos seguirá, agora, nesta nova etapa das eleições municipais, confrontando Bolsonaro, responsabilizando-o pelos crimes que tem cometido e apontando meios e caminhos para o país sair da crise, gerar empregos, assegurar a renda mínima aos milhões de brasileiros vulneráveis e o socorro às micro, pequenas e médias empresas, além de investimentos públicos capazes de impulsionar a economia.

quanto mais urgente as forças oposicionistas sejam capazes de colocar os interesses da nação e da classe trabalhadora no topo das prioridades, Bolsonaro irá se desmascarar. É como diz o adágio: o diabo por mais que se fantasie, sempre deixa uma ponta do rabo à mostra.