Governo responde à ruína econômica com arrogância

Que o governo do presidente Jair Bolsonaro está fazendo água por todos os lados, parece ser incontestável. Além dos perrengues políticos, ele insiste numa agenda econômica sem nenhuma chance de fazer o país retomar patamares de crescimento compatíveis com o seu potencial — uma premissa que seria fundamental para, antes de tudo, estancar o processo de degradação social que avança em marcha acelerada sobretudo entre o povo trabalhador.

Um estudo do Instituto Brasileiro de Economia (IBRE), da Fundação Getúlio Vargas (FGV), apontou o 17º trimestre consecutivo de aumento da diferença da renda entre os mais ricos e os mais pobres. O índice de Gini, que mede a renda do trabalho per capita, alcançou 0,627, o maior patamar da série histórica iniciada em 2012. Quanto mais perto de 1, maior é a desigualdade.

Conforme o levantamento, a variação acumulada real da renda média entre os mais ricos (10% da população) e os mais pobres (40% da população) mostra que, no período pré-crise (até 2015), os mais ricos tiveram aumento real de 5% e os mais pobres, o dobro, 10%. No período pós-crise, a renda acumulada real dos mais ricos aumentou 3,3% e a dos mais pobres caiu mais de 20%. Considerando a série histórica, desde 2012, a renda real acumulada dos mais ricos aumentou 8,5% e a dos mais pobres caiu 14%.

Não há argumento aceitável, para quem analisa o cenário do país com base em dados da realidade, que justifique essa agenda fora das regras de uma ideologia de costas para esse verdadeiro drama social. O que explica, por exemplo, o dado divulgado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), dando conta de que o Produto Interno Bruto (PIB) crescerá menos da metade da média mundial neste ano — 1,4% e 3,2%, respectivamente?

Dizem que isso tem a ver com as dificuldades do governo para aprovar “reformas”, em especial a da Previdência Social. É uma tese. Mas, como toda tese, ela precisa de comprovação. Como diz o economista Amir Khair, especialista em finanças públicas, a despesa previdenciária está estacionada desde 2014. A queda na arrecadação — provocada pela crise — é o principal fator de aprofundamento do "déficit" na Previdência. O professor de economia da PUC-SP, Leonardo Trevisan, diz, por sua vez, que o discurso de que tudo irá mudar depois da “reforma” da Previdência tem colocado o Brasil em uma paralisia. Trevisan diz ainda que esta “reforma” só terá efeito, se ela for feita, daqui a oito anos. 

O desafio, para a agenda do governo, é o déficit primário de R$ 139 bilhões para este ano, que, por sua lógica, deve ser socorrido com a “reforma” da Previdência Social, as privatizações selvagens e os contingenciamentos orçamentários, que atingem as despesas públicas primárias, ou não financeiras, como no caso dos gastos com saúde e educação. Significa cortar gastos sociais para pagar mais juros, em resumo; uma proposta de uma malignidade total porque, além das consequências imediatas, provoca mais desemprego. Cortar gastos não faz a economia crescer, mas, sim, cair.

Um detalhe que chama a atenção é a frieza e a arrogância dos representantes do governo ao defender essa maldade. Um caso assim — além dos histrionismos do ministro da Economia, Paulo Guedes — se deu sobre o anúncio do Relatório Bimestral de Avaliação de Receitas e Despesas na tarde de quarta-feira (22). O secretário de Orçamento Federal George Soares disse, em entrevista ao site Conjuntura Econômica, que ocorreram erros de política fiscal e monetária de grande magnitude no passado e que este governo não apoiará medidas que aumentem os gastos para gerar choque de demanda.

Isso quer dizer que não haverá, com esse política ecnômica, nenhuma medida efetiva para atacar flagelos como o desemprego em massa e todas as suas consequências sociais Como ele mesmo diz, é uma cópia descarada do governo Reagan, que criou o supply-side economics. Ou seja: é a mera repetição de uma modelo que deu em crises graves e que aumentou substancialmente os ganhos rentistas — dos ricos —, às custas de um brutal empobrecimento da imensa maioria da população.