É hora de ousadia na economia

Esta semana foi fértil em notícias que os setores econômicos consideram promissoras, e que apontam para aquilo que julgam ser o fortalecimento dos chamados fundamentos da economia.



O diretor gerente do FMI, o espanhol Rodrigo Ratto, garantiu que, em breve, o Brasil será elevado pelas agências que julgam o risco de um país ao cobiçado grau de investimento, que sinaliza aos donos do capital que o país é seguro para seus investimentos.



No dia 12, o governo oficializou a mudança na meta do superávit primário, que caiu dos atuais 4,25% do PIB, que o governo vem mantendo desde 2003, para 3,8% neste ano, podendo chegar a 3,6% em 2010, último ano do mandato do presidente Lula.



É uma mudança importante. Como cada 1% do PIB corresponde a 25 bilhões de reais, esse corte libera mais de 10 bilhões de reais para investimentos. Essa alteração está ancorada nas previsões de queda da dívida pública (o ministério do Planejamento calcula que ela vai diminuir dos atuais 44,9% do PIB para cerca de 36% em 2010), e de crescimento de 4,5% neste ano e 5% em 2008, 2009 e 2010.



Esse ajuste corresponde também ao fortalecimento das reservas internacionais do Brasil, que alcançaram a marca histórica de 111 bilhões de dólares e colocam para o país problemas novos, entre eles o de encontrar a melhor forma de investir esse volume de dinheiro para garantir retornos melhores e mais seguros.



Hoje, mais da metade das reservas está investida em títulos do Tesouro dos EUA (cerca de 59% do total), colocando o Brasil no grupo dos dez maiores credores do governo americano, ao lado da China, Japão, Coréia do Sul, Taiwan, Reino Unido, Alemanha, França e Suíça, e alguns paraísos fiscais.



O problema é o baixo rendimento destes papeis e o risco cambial que representam por serem cotados em dólar, cujo valor está em queda e compromete a rentabilidade dos investimentos.



De fato, esta é uma situação nova – o Brasil só viveu conjuntura semelhante no final da Segunda Guerra Mundial, da qual saiu credor, dono de reservas altas para a época, e que o neoliberalismo do governo do marechal Eurico Gaspar Dutra e a abertura comercial correspondente a ele torrou em poucos meses com a importação de quinquilharias e objetos de luxo para o consumo da classe dominante.



Embora a situação atual seja diferente, o chamado ''mercado'' já se manifesta contra mudanças mais radicais. Um exemplo é a declaração de Alex Agostini, economista-chefe da agência de classificação de risco Austin Asis, à Folha de S. Paulo. ''Não há um consenso sobre o tamanho ideal das reservas. US$ 200 bilhões zeraria a dívida externa e ainda traria um colchão de US$ 30 bilhões para eventualidades'', disse, numa frase que embute a defesa de um superávit primário alto e, assim, da mesma política econômica ortodoxa e restritiva do desenvolvimento que vem sendo praticada há pelo menos vinte anos. E que, em linhas gerais, foi mantida pelo governo Lula.



Do outro lado deste debate está a sociedade brasileira, que exige a retomada do desenvolvimento. Embora ninguém descarte, no cenário atual, que a demonstração de boa vontade para com os investidores seja uma imposição, há que se considerar também que a economia brasileira, os trabalhadores e os empresários ligados à produção têm razão em considerar insuficiente a queda na meta do superávit primário. Os brasileiros também precisam de garantias, e a principal delas é a busca do desenvolvimento e do fortalecimento do emprego e da renda dos trabalhadores. Se os fundamentos da economia vão bem, é mais do que hora de destravar o desenvolvimento e demonstrar ousadia na busca de indicadores que mostram a melhoria do bem estar social dos brasileiros.