Desafios para a superação da tragédia social bolsonarista

Até recentemente, o termo McJob, ou MCemprego, era um termo muito debatido mundo afora como sinônimo de trabalho duro e com baixo salário, frequentemente precários e com poucas possibilidades de crescimento profissional. Agora, debate-se a “uberização” como atualização desse conceito, um fenômeno que atinge sobretudo os jovens, como pode ser visto no desfile de ciclistas e motociclistas pelas cidades do país, trabalhando como entregadores por aplicativos de internet.

O crescimento do trabalho precário se deve à crise do capitalismo, tendência que se agravou muito desde a quebra de Wall Street em 2007-2008. No Brasil, além dos efeitos internacionais contou para a explosão dessa modalidade trabalhista as rupturas com os paradigmas macroeconômicos inscritos na Constituição, sobretudo após o golpe do impeachment golpista de 2016 e a imposição da pauta ultraliberal e neocolonial do ministro da Economia do governo Bolsonaro, Paulo Guedes.

A chegada da pandemia pegou o país totalmente vulnerável e fez a crise do emprego atingir proporções de tragédia social. O resultado aparece nos dados da Pnad Covid, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelando que 24,2% do grupo economicamente ativo entre 14 e 29 anos estavam desempregados em novembro. Em maio deste ano, o percentual era de 18,4%. A juventude é responsável por 6,8 milhões de todos os mais de 14 milhões de brasileiros desempregados.

A Pnad Covid revela também que a quantidade de pessoas que trabalham de maneira informal, sem carteira assinada, chega a 34,5% da força produtiva do país. A participação dos jovens é ainda maior, chegando a 39% (ou 8,4 milhões) no penúltimo mês de 2020. O percentual só é maior entre os que têm mais de 60 anos: 50,7%. Os jovens são atingidos também pelo salário precário, com rendimento de R$ 1.530 em novembro, bem abaixo do valor geral de R$ 2.334.

A face mais cruel desse cenário é o desemprego, altamente potencializado pela pandemia. Com o Estado transformado em comitê de administração da ciranda financeira, os efeitos da longa crise aparecem por toda parte. O cassino global, uma máquina predadora da economia real sempre esfomeada, dotou os Estados de uma parafernália que funciona dia e noite a serviço da especulação financeira. Enfrentá-lo é o grande desafio, principalmente para os trabalhadores, nos dias que correm.

O país passa por uma gigantesca redistribuição da riqueza social a favor dos ricos, um fenômeno do capitalismo em escala global que hipertrofia o capital sob a sua forma financeira e desvaloriza a força de trabalho como mercadoria. Enfrentar essa dicotomia é um desafio que perpassa diferentes esferas da luta democrática, a começar pela disputa que vem sendo travada em torno da sucessão na presidência da Câmara dos Deputados.

A luta prioritária é pela vacinação em massa, mas, associada a ela, deve estar a busca urgente de fonte de renda e de auxílio às pessoas sem emprego, às empresas em situação de vulnerabilidade e aos estados e municípios. Mesmo potências capitalistas como Estados Unidos e países europeus anunciam a continuidade de políticas de transferência de renda e estímulo econômico em 2021. A agenda econômica do governo Bolsonaro não contempla esse paliativo, muito menos ações efetivas para que o Estado sirva de alavanca para a retomada da economia.

Em cada ação política no país esse dilema está presente. O bolsonarismo criou uma clivagem que polariza interesses de forma cada vez mais radicalizada. A pauta do ministro Paulo Guedes tem apelo no Congresso Nacional, mas, como componente do projeto autoritário do bolsonarismo, tende a enfrentar obstáculos. A força e a capacidade de articulação da oposição, apoiadas numa ampla mobilização popular, pode impor derrotas ao governo Bolsonaro, inclusive em aspectos da sua pauta econômica.