Com pibinho, galinha tenta alçar novo voo

Investimento e consumo. Essa é a base da dinâmica da economia, o motor do desenvolvimento de um país. No caso do Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre, que apresentou crescimento de 0,4%, não há nem uma coisa nem outra. O presidente Jair Bolsonaro, que confessa desconhecer como funciona a economia, comemorou o resultado que livra o país de uma recessão técnica dizendo que ele é fruto de investimento e que logo vem o consumo. Na prática, Bolsonaro fez como o personagem que ouviu o galo cantar, mas não sabe onde.

Assim como ele, outros tantos tentam explicar os fatos ignorando as circunstâncias indispensáveis e essenciais. São os que advogam a causa neoliberal, uma teoria que coleciona tragédias sociais e rendas financeiras fabulosas desde que apareceu na América Latina no final da década de 1970. Quem analisa esse crescimento munido de dados concretos e perspectiva mais ampla, como o Projeto de Lei Orçamentária de 2020 do governo, chega fácil à conclusão de que se trata daquilo que alguns economistas e analistas popularizaram como voo de galinha.

Essa tese avícola tem a ver com a inconsistência dos modelos macroeconômicos de alta dose de abstração matemática — como a tal confiança de empresários e consumidores — que não explicam nada concretamente. Questões como melhoria dos níveis de renda, dos investimentos e do consumo não entram como a essência da economia. Entram aquilo que o economista norte-americano John Kenneth Galbraith chamou de “manifestações de insanidade", referindo-se à massa trilionária de dinheiro que faz das fronteiras nacionais meras abstrações, o mercado dos títulos públicos — a dívida bruta brasileira continua em trajetória ascendente e chegou a R$ 5,441 trilhões em julho.

Um exemplo foi citado pela agência de notícias Bloomberg, que atua no mundo financeiro, sobre “analistas” surpreendidos com o desempenho ligeiramente superior ao esperado — eles previam crescimento de 0,2%. Uma boa definição para essa “insanidade” dos Nostradamus do mercado financeiro é a análise do colunista do jornal Folha de S. Paulo, Vinícius Torres Freire, ao dizer que essa “surpresa positiva” é “sintoma de que as pessoas ocupadas com essa numeralha se acostumaram a discutir migalhas, troco miúdo e gorjeta ruim”.

Um levantamento da própria Folha mostra que 62 meses depois do início da crise econômica os investimentos no Brasil em maio ainda estavam 24,8% abaixo do nível anterior a abril de 2014, mês que marca o início da descida da economia brasileira, segundo levantamento da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib). Esse é o ponto: a chamada “crise fiscal” impede que o Estado puxe os investimentos para gerar emprego e renda — segundo o IBGE, os empregos informais bateram novo recorde — e fazer a roda da economia girar, a começar pelo consumo das famílias, o principal componente do PIB no lado da demanda.

Seria a hora de abrir os cofres públicos para socorrer as urgências do povo, em especial o do BNDES, uma imposição dos prognósticos que indicam a retração da economia mundial, que incidirá negativamente num país que há seis anos não sabe o que é crescimento econômico. Outra medida urgente é o corte drástico na taxa de juros e o uso dos bancos públicos — como o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal — para impulsionar o crédito e, consequentemente, os investimentos e o consumo. Fazer aquela profilaxia básica de desprivatizar o Estado para dinamizar a economia.

Mas isso são medidas que servem a um projeto soberano e democrático de país. Não há a menor chance de que elas sejam adotadas por esse governo que, além das premissas de destruição da institucionalidade democrática, é comandado pela lógica da jogatina financeira do cassino global que tem no proclamado superministro da Economia Paulo Guedes uma espécie de crupiê. Enquanto isso, a degradação econômica e social se espalha e deve ser enfrentada com todas as forças que o país puder reunir.