As adversidades de José Serra

O governador paulista José Serra (PSFB) sentiu na pele, dia 3, a diferença de ritmo entre os desejos pessoais e as imposições da vida real. Foi o auge de uma série de más notícias para sua candidatura e que obrigaram o governador tucano a adiantar um calendário que pretendia mais lento, e dar sinais da vontade de candidatar-se à sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O desejo de Serra, bem a seu estilo protelatório, e à fama tucana, era ficar “em cima do muro” até a última hora, deixando a decisão para o momento que lhe parecesse mais favorável. Não deu.

A última pesquisa de opinião mostrou a queda de sua candidatura e a subida consistente das preferências por Dilma Rousseff que agora está em virtual empate técnico com ele. E vai crescer ainda mais, na medida em que a campanha eleitoral avançar e for ficando claro para a população que Dilma é a candidata que vai levar adiante o projeto de Nação e de governo inaugurado por Lula em 2003. Outra pesquisa, divulgada pela revista CartaCapital, mostra o potencial de crescimento de Dilma nesse cenário. A consulta foi feita na Baixada Fluminense para medir o “efeito Lula”, isto é, a capacidade de transferência de votos do presidente. E mostrou empate de 26% entre Serra e Dilma; mas quando a candidata do PT foi apresentada como “Dilma, candidata de Lula”, ela subiu para 42% e Serra caiu para 21%!

Para tentar protelar o anúncio de sua decisão sobre candidatar-se ou não, Serra semeou a adversidade que colheu em Minas Gerais, dia 3. No ano passado ele atropelou as pretensões do também tucano, o governador mineiro Aécio Neves. Como diz o povo, passou sobre ele “como um trator”: desprezou a sugestão mineira de fazer uma prévia dentro do PSDB para definir o candidato e jogou fora a chance de unir um partido cuja divisão é cada vez maior e aparentemente irremediável.

Sob os gritos de “Aécio presidente”, que constrangeram Serra em Minas Gerais, no dia 3, e sob a até agora incontornável recusa de Aécio em aceitar ser o vice numa chapa tucana “puro sangue”, as esperanças tucanas parecem esvair-se, resumidas agora (como estava nos jornais de sábado), para os tucanos paulistas de alta plumagem, na sugestão de que, pelo menos, Aécio aceite anunciar oficialmente a candidatura de José Serra!

As tropas tucanas vão para outubro divididas. Aécio não é um “anti-Serra” programático, mas opõe a ele seu próprio projeto pessoal fundamentado, como tudo indica, na oposição entre setores da elite dos dois estados. Um desses sinais, muito forte, foi o editorial do jornal O Estado de Minas, do dia 3, que apoia a recusa de Aécio sob o título “Minas a reboque, não!”.

Do ponto de vista programático Aécio tem o mesmo dna da alta cúpula tucana, oculto sob a sombra mítica de seu avô, Tancredo Neves. O programa aplicado por ele em Minas não fica devendo nada aos tucanos de mais puro sangue. A área social ficou à míngua em sua gestão e os investimentos em saúde, segurança pública e educação caíram de R$ 11,6 bilhões para R$ 8,7 bilhões. Mas teve o cuidado marqueteiro de criar uma vistosa “vitrine” para garantir a imagem do governador tucano, sendo escolhidas 200 entre as 4.000 escolas públicas do estado para serem apresentadas como “escolas referências”. São escolas voltadas para as classes médias e bairros mais ricos. As demais ficaram relegadas à mesma falta de professores, materiais, infraestrutura, etc, etc, de sempre.

O dna tucano do governador mineiro fica visível também quando ele reclama que Lula deixou de fazer as “reformas” na Previdência Social, na área fiscal e nas relações trabalhistas. Elas, diz o Aécio, são fundamentais “para a fundação de um Estado moderno”, repetindo o mesmo ideário dos cardeais emplumados, entre eles o mesmo José Serra com quem vem batendo cabeça.