Ao agredir Dilma Rousseff, Bolsonaro agride o Brasil

A agressão de Jair Bolsonaro à ex-presidenta Dilma Rousseff, ao fazer galhofa sobre as sequelas das torturas que ela sofreu na resistência democrática à ditadura militar, revela a dimensão da bestialidade do presidente da República. Sua descompostura é condizente com as apologias que ele faz sistematicamente àquele regime que tinha as torturas e os assassinatos como métodos de governo, a truculência e a violência no lugar do diálogo e da mediação política.

Não foi uma mera manifestação casual, dessas que se enquadram na máxima de que palavras o vento leva. Começa que a zombaria desrespeitosa é uma repetição de outras proclamações sem margem para dúvidas de que Bolsonaro se vê como continuador da obra dos facínoras do regime de 1964. Lembre-se a sua declaração de voto no impeachment golpista de Dilma Rousseff em 2016, ele deputado federal e ela presidenta da República, dedicada a Carlos Alberto Brilhante Ustra.

Bolsonaro não fez tão somente uma homenagem ao facínora dos porões da ditadura militar. Ele fez questão de dizer que Ustra era o “terror de Dilma Rousseff”. A rigor, o torturador e assassino era o terror de todos os democratas e patriotas que combatiam aquele regime de terrorismo de Estado. Sem moral e sem compromisso com os valores humanos, restava ao regime o recurso da bestialidade, o uso da violência para suprir o vazio de ideias capazes de gerar consensos e progresso social. Num regime democrático, os pressupostos do golpe de 1964 jamais se firmariam.

Ao recorrer à apologia a esses métodos, Bolsonaro reafirma que ele representa a antítese dos saltos civilizatórios que fizeram o Brasil chegar ao século XXI com um razoável acúmulo de ideias progressistas. São conquistas dos abolicionistas, da luta pela independência nacional e pelo ideal republicano que atravessou todo o século XX. Tudo isso inscrito na Constituição de 1988, o pacto que garantiu as bases do regime democrático conquistado por meio de grandes lutas do povo, entre elas a resistência à ditadura militar, da qual Dilma Rousseff foi protagonista.

Ao agredir a ex-presidenta, Bolsonaro ataca e ofende a memória de todos os que lutaram por esses saltos civilizatórios. E reafirma seu desapreço à civilização, o que explica bem suas posturas em relação ao drama do povo diante do avanço da pandemia de Covid-19 e da crise econômica. É a tradução de um ideal autoritário, traço típico de quem se guia pela autossuficiência, como se nada mais fosse importante além do seu limitado conceito de poder. Bolsonaro age como um autômato, sem nenhuma condição de exercer o cargo que ocupa, representando toda a sociedade.

Ele só pode seguir na Presidência da República reafirmando constantemente que precisa de plenos poderes para impor suas vontades e seus métodos. Algo semelhante a outros regimes da história desprovidos de mediação democrática, entre eles a sua idolatrada ditadura militar. Não faz sentido imaginar Bolsonaro fora desse universo ideológico quando se tem em conta seus elogios a Ustra e agora essa agressão covarde e cruel à ex-presidenta Dilma Rousseff.

Diante dessas constatações, a ideia de que a defesa da democracia é a prioridade das prioridades renova seu sentido. Bolsonaro não está de brincadeira quando faz esses acenos e arroubos autoritários. Se houvesse nele algum sentimento, por menor que fosse, de apreço à Constituição – e consequentemente à democracia –, não haveria essas manifestações sistemáticas de apologia ao regime dos facínoras de 1964. O Portal Vermelho, ao tempo que se solidariza com Dilma Rousseff e com todas as vítimas dos ídolos de Bolsonaro, refirma a convicção de que a defesa da democracia por amplas forças da sociedade é uma urgência inquestionável.