Tarefas do movimento negro após a eleição

 O movimento negro brasileiro foi um segmento do movimento social atuante na disputa eleitoral (2012), há tempo entendemos que as eleições é a principal batalha política e o caminho necessário para, no campo institucional, garantir a implantação de políticas públicas que enfrentem com efetividade e eficácia os nefastos desdobramentos do racismo sobre a população negra e incidam na desigualdade entre negros e brancos no campo econômico, social e político.

Não há caminhos para construção da justiça social, tão almejada pelos movimentos sociais e pelo povo, distante da política. A política é nossa mais preciosa e poderosa ferramenta contra as forças racistas e reacionárias que sempre detiveram o poder econômico e político no Brasil.

Temos que compreender a dimensão política e ideológica do racismo, ele avança para muito além dos campos da alteridade e da cultura, as correntes de pensamento antirracismo que focam todas as atenções nesses pontos subestimam ou capciosamente ignoram a luta de classe que o racismo enseja. Ao tempo em que o racismo estabelece conforto, segurança e privilégios para uns, dá suporte as guerras megalomaníacas, como a II Guerra Mundial, promovida a partir de ideários nazistas e o exemplo do genocídio tutsi em Ruanda ocorrido em 1992; justifica pilhagens, saques e superexploração do trabalho barato pelos estados imperialistas e colonialistas; assegura legitimidade para marginalização econômica e social de grandes massas humanas. No Brasil, verificamos que seus desdobramentos têm atendido perfeitamente os interesses da elite dominante e conservadora. A pobreza e a riqueza, aqui tem cor.

A participação do movimento negro no processo eleitoral (2012) cumpriu um ritual que tem se consolidado Brasil afora, envidamos esforços em torno de candidaturas negras a vereança ou a prefeitura; apresentamos nomes de quadros importantes e qualificados para disputar vagas de vereadores, onde não foi possível uma candidatura orgânica do movimento negro apoiamos candidaturas comprometidas com a plataforma da igualdade racial; compomos coordenações de campanhas majoritárias; contribuímos na construção de programas de governos dando enfoque nas medidas que promovam igualdade social e racial, sempre com vista a ascensão de negras e negros em espaços de poder.

É importante destacar que o movimento negro, apesar de não ser um campo monolítico, é majoritariamente de esquerda, há consciência que o embate para superação do racismo tem interface na luta de classe, sabemos que em última instância o objetivo do racismo é delimitar o lugar socioeconômico em sociedades multirraciais. Desse modo, para o movimento negro, apesar de reveses pontuais com a ascensão da direita contrária as ações afirmativas em curso, (Aracaju, Salvador e Manaus), o resultado das urnas foi positivo. Verificamos um virtuoso crescimento da representatividade dos partidos de esquerda e de centro esquerda (PT, PSB, PDT, PCdoB e PSOL), que passarão a administrar 1.446 municípios, 26% dos municípios. Somados aos partidos que compõe a base parlamentar do governo, as forças comprometidas com o governo Dilma administrarão 74,82% dos municípios brasileiros.

Essa acachapante vitória lançou base fundamental para 2014, considerando que em matéria política é pouco prudente antecipar fatos e tendências, hoje é possível afirmar que somente um desastre econômico ou um trágico fato político poderá ameaçar a reeleição de Dilma Rousseff. Estamos diante de um cenário promissor para maior aprofundamento do projeto político que ascendeu ao poder em 2003. No entanto, o ideário liberal, conservador e racista apesar de fragilizado pelo golpe do resultado eleitoral, ainda continua forte, vivo, com densidade social e política, um relaxamento no cumprimento dos programas de governos assumindo no processo eleitoral pode ser cobrado pelo eleitor.

O racismo é multifacetado, polissêmico e transversal, combatê-lo exige certa plasticidade nas formas de organização e ação, não há uma determinada tática capaz de superá-lo, por isso não é apenas o movimento social o grande palco para o embate organizado contra o racismo, precisamos fortes presenças nos partidos políticos, nas academias, nos governos, nos parlamentos, no judiciário, nas empresas e em outros espaços de poder, representação e sociabilidade. Assim como precisamos garantir espaços e condições para que a crítica se desenvolva, considero a crítica muito importante, especialmente em processos políticos que incidem na vida de milhões de pessoas.

A partir dos resultados eleitorais e da compreensão sobre o racismo, a tarefa do movimento negro na conjuntura imediatamente posta está ligada a incidir sobre os planos políticos dos governos municipais recém-eleitos em todo país. Para isso defendo que o movimento negro se mobilize nesses próximos meses para:

• Exigir incorporação de negros e negras nos cargos comissionados, em todos os escalões.
• Exigir a instituição de organismos de promoção da igualdade racial (secretarias, coordenadorias ou assessorias).
• Estimular a criação de frentes parlamentares de igualdade racial nas Câmaras de Vereadores de todos os municípios a partir de 200 mil habitantes.
• Criar conselhos de igualdade racial em todos os municípios a partir de 200 mil habitantes.
• Exigir a elaboração de planos de igualdade racial com metas quantitativas e orçamentárias.
• Exigir a imediata implantação do Estatuto da Igualdade Racial.
• Incluir o movimento negro como beneficiário de políticas de igualdade racial.

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