Por que queimam as bruxas?

A inquisição, predominante na Idade Média, mostra bem a construção da demonização da mulher para prevalecer o domínio do macho, colocando as mulheres como o outro e incapaz de caminhar por si.

Alguns filmes nos aproximam de saber quem são as tão decantadas bruxas na história. A começar pelo drama espanhol Silenciadas (2021), com direção e roteiro de Pablo Agüero. Baseado no livro A Feiticeira, de Jules Michelet (1798-1874), que pode ser assistido pela Netflix.

Ficção e realidade se misturam com a atualização feita pelo diretor ao contar um fato acontecido na região do País Basco, em 1609, com a queima de centenas de mulheres acusadas de bruxaria. E qual o crime? A sensualidade, o canto, a dança, a alegria, a liberdade.

E como mulheres poderiam ter a pretensão de viver livres assim em pleno século 17, se ainda hoje tentam queimar as “bruxas” como ocorreu com Marielle Franco, em 2018? Ou como atacam sistematicamente as mulheres que ousam ser livres e estar na política, no movimento sindical, nos movimentos sociais e lutam por igualdade.

No filme, as seis jovens acusadas de bruxaria tentam assumir esse papel para enganar o inquisidor Rostegui (Àlex Brendemühl). As bruxas falam em euskera (língua ancestral do País Basco, região Norte da Espanha e Sudoeste da França), até para se diferenciar do idioma do dominador.

Ana (Amaia Aberasturi), Maria (Yune Noigueiras), Katalin (Garazi Urkola), Maida (Jone Laspiur), Oneka (Lorea Ibarra) e Olaia (Irati Saez de Urabain) assumem um suposto pacto com Lúcifer para ganhar tempo e escapar da pena de morte. Fazem um jogo de sedução com o algoz. Conseguirão escapar, afinal são bruxas?.

A inquisição, predominante na Idade Média, mostra bem a construção da demonização da mulher para prevalecer o domínio do macho, colocando as mulheres como o outro e incapaz de caminhar por si. Milhares de “bruxas” são queimadas por não se adequarem aos padrões propostos pelo patriarcado.

Silenciadas opta por uma linguagem atualizada porque muitas “bruxas” são atacadas de diversas formas nas ruas e nas redes cotidianamente no mundo. No Brasil a situação é calamitosa com 822 mil meninas e mulheres estupradas anualmente como aponta estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) , divulgado neste ano,.

No ranking de violência de gênero o Brasil está entre os primeiros colocados. Mulheres são agredidas todos os dias dentro de casa, nas ruas, no ambiente de trabalho, no transporte público, enfim em todos os lugares. Meninas e mulheres são violentadas, espancadas e mortas.

Condenadas pela sua condição de gênero, as protagonistas do filme se revoltam e tomam uma atitude capaz de balançar os alicerces da estrutura dominante. Assim Silenciadas faz pensar sobre todas as lutas das mulheres em toda a história para serem respeitadas como seres humanos, além de lutarem por igualdade. Também mostra as formas encontradas em todo o tempo para oprimir o feminino e assim manter o poder masculino incólume.

Mas as bruxas existem e ousam voar destemidas contra a opressão machista. Nos dias atuais são muitas e estão em todos os lugares, cada vez conquistando mais espaços contra a cultura do estupro, no combate à opressão de gênero e à pura maldade.

As bruxas de todas as idades que estão nas universidades, na política, no campo, na cidade, em casa, no trabalho, na vida. As bruxas que fazem a história e mudam o mundo com sua resiliência e resistência. É por isso que queimam as bruxas.

Assista ao trailer de Silenciadas

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