Não mate a mata!

Nos fins dos anos oitenta um rap sacudiu São Paulo. Ainda não havia acontecido o encontro que ficou marcado como o evento que deu o start pro debate sobre meio ambiente no mundo, a ECO 92. Tão pouco havia sido definido a agenda 21.

Pois bem, a galera da periferia paulista já cantava a preocupação com o meio ambiente.


 


Vivi intensamente esta época, e me recordo que na ponta da língua todo mundo sabia cantar a letra do Sampa Crew “Não Mate a Mata”. Alguns afirmam que este foi o primeiro rap que extrapolou o universo do hip-hop caindo nas graças da juventude em geral.


 


Com uma letra perspicaz e uma rima assimétrica, o Sampa Crew se tornou sucesso e por onde passava arrastava multidão. Naquele tempo o movimento hip-hop ainda era chamado por muitos de “função” e grande parte dos rapper’s que se apresentavam em shows faziam suas letras de improviso naquele evento. Tanto que não se cantava o rap, se fazia improviso. Alguns que não tinham a técnica da rima ensaiavam no lado de fora, no camarim ou até no banheiro do salão pra se apresentar no palco.


 


Olhando de hoje, penso que o grande sucesso do Sampa Crew se deveu ao fato do grupo ousar num tema que sempre foi preocupação dos jovens, o meio ambiente. E logo após foi incorporado em várias letras de rap por grupos de todo Brasil. Também pode ser creditado o sucesso da música em virtude do refrão da letra que sacudia a massa, sendo uma inovação trazida por este grupo em que as palavras sugeriam um trocadilho. No meu ver foi o primeiro rap com bom refrão no Brasil. Naquele tempo até mesmo às letras compostas pareciam muito com uma improvisação e os refrões sugeridos não tinham tanta fixação, eram muitos ingênuos ou sem criatividade.


 


Trazer esta parte da história a baila é importante pra afirmar que o movimento hip-hop é vanguardista na discussão do tema meio ambiente num momento em que a discussão do “aquecimento global” ganha a pauta nas agendas pelo mundo em todos segmentos.


 


Ratifica mais ainda que o encontro Eco Hip-Hop que está por vir nos dias 14, 15 e 16 de setembro na cidade de Campinas em São Paulo que tratará do tema: “Hip-Hop Contra o Aquecimento Global” não é coisa de momento nem estamos embarcando de chapéu tolado na questão.


 


Temos consciência de fato sobre a parada, tiozão.
Mais que isto, quando nem All Gore nem qualquer outro metido a salvador da pátria havia aparecido pra fazer proselitismo sobre o tema, a massa do movimento hip-hop brasileiro já cantava a defesa do meio ambiente.


 


Isto sem falar nos painéis de graffites que esboçavam a defesa do meio ambiente, e a preocupação em saber se as produtoras das latas de spray usavam “CFC”. Logo quando o assunto chegou no ouvido da galera, os grafiteiros procuravam olhar os rótulos das latas pra evitar as que continham tal composição. Isso que é consciência, Jão.


 


E pra quem achava que hip-hop só falava de: treta, tiro sangue, aí… muda de assunto.


 


Hip-Hop é consciência ambiental, preservação da fauna e da flora, desenvolvimento sustentável, estilo ecológico, proteção dos mananciais, cê tá ligado?


 


Podem ter certeza que foi a partir dessas letras de rap que muito muleque nas quebradas começaram a se ligar e orientar suas famílias a não jogarem lixos nos córregos próximos dos barracos, fazerem fossas sépticas, plantarem arvores, não desmatarem encostas e morros e valorizarem os rios, nascentes e mananciais. Cabe agora aos governantes fazerem de fato uma reforma urbana que dêem qualidade de vida as populações das quebradas próximas de mananciais e represas. Afinal de contas ninguém foi pra lá porque quis, foi falta de opção.


 


É nóis memu muleque, tamu junto e misturado com todos aqueles que lutam de fato pela preservação do Planeta Água.


 


Cantem comigo no refrão deste flash back:
''Não mate a mata, nem o matagal
Não mate a mata eu respiro muito mal'' Sampa Crew

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