Mapa astral e responsabilidade pública

– Luciano, você precisa fazer o seu mapa astral.
– Mapa astral?…
– Sim, o mapa astral vai dizer o que o Universo espera de você, ajuda muito.
– Oxente, prefiro não fazer. O que o Recife espera de mim já é muito, imagine o Universo!

O diálogo com o amigo astrólogo leva uma certa ironia. Com a condescendência de todos os astrólogos do mundo. O problema é que esse companheiro de vocês entende nada de astrologia e bastante de responsabilidades. E não quer procurar mais sarna para se coçar. Ora, se as responsabilidades do cargo de vice-prefeito já são muitas, pra que assumir compromissos com o Universo? Seria areia em demasia para um caminhão tão limitado.


Brincadeira a parte, o fato real e incontornável é que a gente assume compromissos públicos por convicção e responsabilidade militante e deles se torna escravo. Escravidão consentida, tudo bem; e exercida com paixão, denodo e prazer, é verdade.



Mas você passa a viver ao sabor do tempo, das circunstâncias e das necessidades e humores da população. Aonde vai, há sempre alguém disposto a pedir que esclareça sobre tal ou qual problema da cidade, a apresentar queixas e a solicitar providências imediatas. Pouco importa se o ambiente é o do restaurante num dia domingo, ou a fila do cinema, ou o barzinho a beira-mar. Parece que você foi ali exatamente para ser abordado, e não para se divertir. E cuide de ter resposta pronta pra tudo, sob pena de colher um indisfarçável olhar de reprovação ou de desconfiança. Pois se espera que o vice-prefeito tenha na ponta da língua a explicação para a demora no início da pavimentação daquela rua de Casa Amarela, a data em que será lançado o próximo edital do concurso para a saúde e coisas assim.



E é preciso reconhecer que o cidadão está no seu direito. Tem mesmo é que cobrar explicações do governante.



Por isso, por precaução, é bom andar com o Manual de Sobrevivência do Vice-Prefeito à mão. Mas, lamentavelmente, o Manual ainda não existe. Ou então fazer mesmo o mapa astral e, quem sabe, sair de casa tendo conhecimento antecipado das cobranças que lhe serão feitas por munícipes interessados e atentos.



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Em tempo: Deveria escrever sobre tema mais relevante, porém daqui da janela da Pousada Lírio do Vale, em Piranhas, AL, às margens do Rio São Francisco, o escriba não encontrou ânimo para tanto. Fez essa despretensiosa crônica inspirado no fato de ter sido instado, no café da manhã numa pousada de Japaratinga, anteontem, a esclarecer a política da Prefeitura do Recife para o turismo a um casal pernambucano que reconheceu na mesa ao lado o seu vice-prefeito.

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