Julgamento por incêndio de filmes

O julgamento de Serge Bromberg, o filme chinês “Chaogtu e Sarula” e os 80 anos de Paulinho da Viola

Serge Bromberg | Foto: Reprodução

Na mais recente semana, foi levado a um tribunal da Justiça francesa, em Paris, o colecionador de filmes inflamáveis Serge Bromberg. O incêndio ocorreu em 2020, num depósito de filmes de várias bitolas de nitrato na rua da Liberdade, 30, Vincennes, que fica num banlieue (subúrbio periférico) da cidade. Nesse incêndio, que foi muito violento e destruiu mais de mil cópias de filmes, morreram três pessoas, e a razão principal do processo é justamente pela acusação de ‘assassinato involuntário’. O processado poderá ser condenado a três anos de prisão e mais pagar uma multa de 45 mil euros. A sentença virá em janeiro de 2023.

Na verdade, Serge Bromberg não é nem era só colecionador de filmes, mas tinha uma firma de restauração – Lobster Films – no centro de Paris, e ainda tem até hoje. Ele é uma pessoa totalmente ligada ao cinema não só na restauração, pois é funcionário da Defesa (o Ministério da Defesa na França), onde organiza restauração de filmes de interesse da Défense.

Além disso, foi um dos organizadores do Festival Internacional de Cinema de Animação de Annecy. E também trabalha para empresas de Hollywood. No Recife quem o deve conhecer é o também colecionador de filmes Lula Cardoso Ayres Filho.

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Sobre essa questão, o jornal Le Monde trouxe nesses dias uma enorme matéria ocupando duas páginas inteiras com um texto que se gasta bastante tempo para ser lido. É isso que considero interessante no Le Monde: o seu comportamento de um jornalismo século XX. Assim, a matéria aborda todas as questões do processo, mas continua mostrando sobre o colecionismo do amante de cinema. Tudo indica o quanto ainda é forte esse movimento de conservação das obras cinematográficas na França. Hoje, a firma de Serge Bromberg transforma os filmes das bitolas antigas 35mm e outras para o sistema ‘numérique’ (digital). A matéria não só mostra o clima da história, mas relembra os grandes colecionadores franceses e os oficiais como a Cinemateca francesa.

Uma matéria que inclusive retoma o chamado ofício da imprensa: esclarecer e também simplesmente despertar a opinião pública para questões relevantes da cultura, como a própria conservação e divulgação dos filmes.

Olinda, 21. 11. 22

Chaogtu e Sarula na Mongólia

Filme “Chaogtu e Sarula” | Foto: Divulgação

O filme é chinês e está na 7ª Mostra do Cinema Chinês, mas a paisagem dele é da Mongólia e de suas pradarias, inclusive porque a estória é uma espécie de western vivido entre um casal de pastores. E certamente o primeiro aspecto da realização que eu gostaria de destacar é o trabalho de interpretação não só pelos dois atores que vivem os personagens principais – o mocinho e a mocinha –, mas os outros intérpretes que fazem os personagens próximos do casal.

É bem claro que o cineasta Wang Rui se inspirou ou se influenciou nos grandes westerns de Hollywood, e assim levou o argumento para dramatizar o encontro ou desencontro entre o casal principal, para fazer com que eles vivessem o drama da separação com uma questão que os divide como se fosse no clássico “Shane”. “Chaogtu e Sarula” – o nome dos dois personagens – tem pouco menos de duas horas de duração, mas que se passam com tranquilidade. A Mongólia exterior tem uma belíssima paisagem que é bem aproveitada pela trama, que é simples, mas vai preenchendo inclusive como qualquer western, inclusive com brigas pessoais e lutas físicas. Em todo esse desenrolar os intérpretes se comportam com muita segurança, o que mostra o quanto o cinema chinês tem se desenvolvido não só quanto aos atores, mas nos vários outros setores como o de fotografia, música, tamanho dos diálogos e iluminação, que é talvez a grande chance para o aproveitamento da paisagem.

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E o nível dramático mantido pelos diálogos também é uma demonstração de que o cinema chinês já desenvolveu a sua produção.

Um belo diálogo que temos nesse filme não é na língua mandarim, mas na paisagem, ou melhor, na imagem que temos dos cavalos e da motocicleta. Um assunto que Hollywood já usou muito e que Wang Rui mostra ter plena destreza em utilizá-lo. Na sequência final, e em vários outros momentos do próprio desenvolvimento da história, o diretor coloca com criatividade cenas ‘flou’ ou com o personagem aparecendo apenas em algum detalhe, e assim consegue momentos de relevância poética.

Olinda, 17. 11. 22

Paulinho ainda continua Paulinho

Foto: Divulgação

Paulinho da viola fez 80 anos. Eu me lembro de quando ele esteve aqui no Recife, e passou alguns dias. Nós – eu e Jomard – fizemos uma longa entrevista com ele e publiquei no Caderno IV do Jornal do Commercio dos domingos, quando eu era editor desse caderno.

Paulinho da Viola era amigo de Dedé Aureliano, que era nossa amiga, principalmente de Jomard. A conversa foi muito longa e coloquei nas duas páginas centrais do Suplemento. Com muitas fotos de Vladimir Barbosa, que era do Jornal do Commercio e nosso amigo para todas as matérias. Claro que foi uma matéria apaixonada, talvez até mais apaixonada que as matérias que fizemos com Caetano e Gil. Isso pela própria personalidade de Paulinho da Viola. E o que li agora, quando ele se refere aos 80 anos como uma data em que já estamos bem mais maduros, mostra como ele hoje ainda continua a ser a mesma pessoa extraordinariamente simples. E tudo me lembra o tempo em que todas as minhas matérias eram feitas com Jomard e com Vladimir Barbosa. Até quando fomos para João Pessoa e lá rodamos a cidade uns dias.

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Os erros a que Paulinho da Viola se refere agora, que eram feitos, e hoje já não os fazemos, me parecem bem mais gostosos. O interessante seria se a gente conseguisse aprender lá, já naquele tempo de juventude. Hoje, a gente já não tem mais como errar. E isso fica mais triste, me parece.

Olinda, 12. 11. 22

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