Iraque será sim um novo Vietnã

Na semana que passou, o presidente dos Estados Unidos, George Walker Bush, mais uma vez, veio à público e falou bobagens. Desta vez, demonstrando não conhecer quase nada de história, comparou a atual Guerra do Iraque com a Guerra do Vietnã na década de 19

O conflito no sudoeste Asiático


 


 


A Guerra do Vietnã durou em torno de 13 anos. Teve seu início de 1962 e concluiu-se em 1975 com a famosa cena de um helicóptero estadunidense deixando o telhado da embaixada americana em Saigon com a sua capacidade lotada, como que puxando civis norte-americanos para fugirem do país. Foi a maior e mais fragorosa derrota dos Estados Unidos em uma das guerras em que se meteram ao longo de décadas de intervenções em vários países do mundo (estima-se que só no século 20, os americanos se envolveram em mais de cem conflitos em várias partes do mundo).


 


 


A superioridade americana foi completamente abalada. A tese central da elite governamental americana era que se caísse o Vietnã, outros países da região passariam para a órbita, para a esfera de influência da União Soviética e da própria China, ambas, à época, governada por Partidos Comunistas. Tal tese justificou na década de 1950, outras intervenções, na região chamada da Indochina, com a participação da França, resultou na divisão da Península Coreana em duas, em levantes no Laos e no Camboja, posteriormente, de fato, passando ao domínio de governos progressistas e de esquerda.


 


 


O Vietnã sofreu também com essa divisão. Incentivado pelo governo americano, o governo vietnamita pró-ocidental perseguiu duramente os comunistas, de forma que estes passaram, sob o comando de Ho Chi Minh e Nguyen Vo Giap, a organizar a resistência e tentar implantar no país uma República Popular de caráter avançado e socialista. Veio a divisão do país em dois, o do Norte governado pelos comunistas e o do Sul, sob total e completa influência dos americanos. Aos poucos os Estados Unidos foram se envolvendo cada vez mais nessa guerra, enviando armamentos, depois assessores militares e finalmente, após 1962, sob o governo democrata de Kennedy, tropas.


 


 


Mesmo com o assassinato de John Kennedy – dizem alguns pelo complexo industrial militar americano – a guerra não se concluiu. Ao contrário. Com a assunção de Lindon Johnson como presidente foi incrementado o envio de tropas, tendo chegado ao recorde de 500 mil soldados, para lutar contra guerrilheiros mal armados, mas armados pela maior arma que um povo pode ter: a sua determinação de resistir à ocupação estrangeira.


 


 


O erro da comparação de Bush


 


 


Diversos historiadores vieram a público criticar Bush pela sua incapacidade e pela sua ignorância. A tese central do presidente americano foi de que os EUA perderam a guerra, não porque foram fragorosamente derrotados, mas simplesmente porque saíram do Vietnã por pressão da opinião pública americana e que se lá tivessem continuado, poderiam ter vencido a guerra (sic). Isso é que é reescrever a história segundo seus próprios interesses.


 


 


A maioria dos especialistas vê a derrota pelo simples fato de que os americanos eram odiados pela população, seus soldados por mais bem treinados que fossem não sabiam o que faziam naquela região e fundamentalmente porque apoiaram um governo que era completamente odiado pela população local. E continuam fazendo isso até os dias atuais em diversas partes do mundo.


 


 


Ocorre que os neoconservadores vêm reescrevendo a história a cada dia. Agora, para ganharem apoio da população e da comunidade militar, Bush levanta a tese de que a saída poderá piorar a situação política no país, um caos será estabelecido e o país cairá nas mãos de inimigos dos Estados Unidos. Isso para justificar na prática a continuidade da ocupação.


 


 


É bem verdade que podemos dizer que há semelhanças e diferenças entre ambas as guerras. A grande semelhança é que ambas as guerras tem caráter ideológico, ainda que a do Iraque não seja contra o “comunismo”, mas acaba sendo contra o Islã e os povos árabes, que seriam hoje uma espécie de último reduto de resistência ao modo de vida americano em todo o mundo. Há, claro, o componente do petróleo ainda que Bush não admita que a presença americana em solo iraquiano seja para garantir o suprimento de petróleo aos Estados Unidos. Por fim, o número de mortes de americanos no Vietnã foi de 60 mil e hoje os mortos americanos chegam a “apenas” quatro mil soldados.


 


 


Quem tem sistematicamente comparado a Guerra do Iraque com o Vietnã é a oposição democrata, que vem insistindo que essa guerra será o grande atoleiro de Bush e dos Estados Unidos. Dessa forma, tocar nesse assunto, para muitos analistas foi para Bush uma espécie de “tiro no pé”, pois seria como reconhecer que há mesmo uma semelhança entre os dois conflitos e que os americanos acabarão, mais dia menos dia, perdendo essa guerra injusta.


 


 


Retirar ou não as tropas em 2008?


 


 


No início de setembro, o general comandante em chefe das forças armadas americanas no Iraque, David Petraeus, deverá divulgar seu relatório sobre a situação militar nesse país ocupado faz quase cinco anos. Desde fevereiro deste ano, as tropas foram aumentadas de 130 mil para 162 mil homens. O debate posto agora é quando essas tropas começarão a sair do país.


 


 


Petraeus, em seu relatório, ao que tudo indica, deve indicar a permanência das tropas pelo menos entre os anos de 2008 e 2009. Sem que haja alteração das quantidades de soldados. O que parece que esta ocorrendo, é uma contradição entre o alto comando das forças armadas estadunidenses. A grande imprensa noticiou semana passada que um dos generais americanos vai recomendar a Bush a redução das tropas no Iraque já em 2008 (1).


 


 


Essa proposta tem sido apoiada tanto por democratas de oposição, mas até por republicanos apoiadores de Bush, que vem perdendo apoio em seu próprio partido a cada dia. O que se fala ainda é que talvez os próprios democratas tenham dificuldades de enfrentar esse debate e, na campanha eleitoral de 2008, talvez não sejam mesmo tão enfáticos assim na questão da retirada imediata.


 


 


A proposta que será feita pela retirada gradual já em 2008, esta sendo veiculada por ninguém menos que o almirante Peter Pace, comandante em chefe do Estado Maior das forças armadas conjuntas dos Estados Unidos. Fala-se que ele irá recomendar a permanência de no máximo cem mil homens. A própria Inglaterra vem manifestando desejo de retirar seus quase dez mil soldados do sul do país, na região majoritariamente xiita.


 


 


Esse é um assunto que já tratamos muitas vezes em nossas colunas aqui no Vermelho e a ele seguramente voltaremos. Por ora, deixamos estes comentários e seguiremos monitorando a situação. Mas sigo arriscando um palpite: os americanos perderão essa guerra e vencerá o povo árabe e iraquiano.


 


 


Nota


 


Na semana passada deixei de publicar a coluna, conforme os leitores puderam perceber, pelo fato que passei quase toda a semana em Brasília em atividades sindicais com o sindicalismo classista.


 


(1) Ver artigo intitulado “Chefe do Estado Maior recomendará a Bush a redução das tropas no Iraque!”, publicado no jornal Estadão do dia 25 de agosto de 2007, página A25

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