Igreja Católica: nova direção, velhos dogmas

A Igreja Católica, do papa Francisco, excomungou quatro ministros bolivianos que se manifestaram em favor da descriminalização do aborto. A decisão foi anunciada pelo secretário geral adjunto da Conferência Episcopal da Bolívia, José Fuentes.

Repete-se, sob nova direção, o mesmo ritual medieval realizado no Brasil, em 2009, quando era papa Bento XVI, e o arcebispo de Olinda e Recife excomungou a mãe, os médicos e outros envolvidos no aborto sofrido por uma menina de 9 anos, violentada pelo padrasto – que foi poupado da ira clerical.

O religioso brasileiro, dom José Cardoso Sobrinho, argumentou que “a lei de Deus está acima de qualquer lei humana”, atropelando todo o avanço civilizatório conquistado após a Revolução Francesa de 1789. Na mesma linha, disse seu colega boliviano: "A pessoa que aborta, que incentiva o outro a abortar, assim como os relacionados à saúde que participam de um aborto (…) cometem um pecado diante de Deus, porque se convertem em donos da vida, e o único dono da vida, para nós, é Deus ". A pena está no cânon 1398 do Código de Direito Canônico, que ordena que "quem procura o aborto, se este acontece, incorre em excomunhão latae sententiae", que é uma excomunhão automática.

O atual papa, que vem sendo badalado na mídia da classe dominante por comportamentos apresentados como simpáticos à grande massa da população, realizou poucas declarações diretas sobre o aborto, o matrimônio ou outros assuntos sociais em que a Igreja Católica é abertamente reacionária. Mas um de seus principais assessores, Sean O’Malley, cardeal de Boston, reafirmou a posição: “Somos contra o aborto, não porque somos maus ou antiquados, mas porque amamos as pessoas. Isso é o que devemos mostrar ao mundo”.

Em março deste ano, o presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e Família da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom João Carlos Petrini, divulgou nota contestando decisão do Conselho Federal de Medicina favorável à interrupção da gravidez até a 12ª semana, como prevê a proposta de novo Código Penal, em discussão no Senado. No documento, chega ao cúmulo de dizer que, a partir desse posicionamento, o Conselho considera que “quando alguém atrapalha, pode ser eliminado”! Palavras de evidente má-fé, partidas da mais poderosa organização do obscurantismo religioso no nosso país.

Mais recentemente, no início de agosto, a CNBB lamentou a sanção da presidenta Dilma Rousseff à lei que obriga hospitais da rede pública a prestar assistência a vítimas de violência sexual. Os homens de batina ficaram contrariados com trechos como o que define violência sexual como "qualquer forma de atividade sexual não consentida" e prevê "profilaxia da gravidez" para tais casos. Eles discordam também de fornecimento, pelo Sistema Único de Saúde (SUS), "de informações às vítimas sobre os direitos legais e sobre todos os serviços sanitários disponíveis". Afinal, seu pastoreio prospera com a ignorância…

Carmen Fusco, médica e advogada com mestrado e doutorado em Epidemiologia pela Universidade Federal de São Paulo, estima, no Brasil, a ocorrência anual de 1.300.000 abortos inseguros, e a mortalidade é maior nas populações em situação de pobreza. Ela informa que o aborto é a primeira causa de mortalidade materna na América Latina (o continente católico por excelência) e a terceira no Brasil. Carmen deplora: “Neste contexto, cidadãs morrem sem necessidade ou ficam doentes com sérias complicações relacionadas ao aborto. Utilizam a rede hospitalar, com média entre 250.000 e 300.000 internações hospitalares anuais pelo SUS, o que gerou um custo avaliado pelo Ministério da Saúde em 17 milhões de dólares em 2008. Além disso, devido à clandestinidade, existe um mercado paralelo do qual fazem parte as clínicas clandestinas para as mulheres que puderem pagar pelo procedimento”.

Para esta realidade, os homens de preto, liderados por Francisco, estão cegos. Não amam a vida das vítimas, condenam-nas à lei de Deus e negam-lhes os direitos humanos.

PS: A quem interessar possa, um vídeo elucidador sobre a madre Teresa de Calcutá, classificada como “bem-aventurada” numa nota da CNBB (Jesus considerava bem-aventurados “os pobres de espírito, pois deles será o Reino dos Céus):

http://www.youtube.com/watch?v=pvBJXw4OYjw

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