Francis: África o melhor lugar do mundo

Ei pessoal, atendendo a alguns pedidos, vou relatar um pouco da minha fantástica experiência no continente africano, foram 10 dias por lá, e vivi varias coisas, algumas surpresas e outras não tão surpresas, então vamos aos fatos.

No dia primeiro de fevereiro de 2007, cheguei do Kenia, que fica na costa leste do continente africano, fui para a capital Nairobi, pra dar uma palestra no Fórum Social Mundial. O fórum reuniu cerca de 60 mil pessoas de toda parte do mundo e a palestra que desenvolvi teve um publico de 50 pessoas de 03 continentes e 15 países diferentes, o tema era “A importância da organização do hip-hop”. Segundo os nativos, este foi o primeiro debate de hip hop promovido naquele país. Fui para o Fórum a convite da instituição Nação Hip-Hop Brasil, entidade de caráter nacional do qual eu sou filiado e militante, e me acompanhando foi a produtora do Grupo Cultural NUC, Raquel Benjamim, que desempenhou um excelente papel, e Toni C. da direção da entidade.


 


O Fórum foi realizado do dia 20 ao dia 25 de janeiro, na abertura teve um show do Martinho da Vila e de vários outros músicos. cheguei lá um dia após o inicio do fórum, pois era uma dificuldade enorme pra conseguir embarcar nos vôos. Nairobi é uma cidade que não tem estrutura pra tantos visitantes. Nos primeiros 6 dias de minha estadia, trabalhei muito, praticamente levantava na parte da manha, tomava café, banho, e saia para as atividades, e só retornava à noite pra tomar banho e dormir. Nos primeiros 5 dias fiquei na casa de uma família negra de classe media, que não era lá tão hospitaleira, tínhamos que retornar as 22h, senão corríamos risco de dormir na rua. No decorrer do Fórum além dos compromissos de participar das atividades, também montamos uma barraca da Nação Hip-Hop Brasil, era a única entidade brasileira com uma tenda oficial no fórum, nesta vendemos Cd´s do Renegado, CD Nação Hip-Hop Vol. 1, alem de camisas e livros. Presenciei varias manifestações artísticas, sendo que a maioria era de dança afro, que trazia grande esplendor e alegria. Diferentemente dos mitos, não topei com nenhum animal pelas ruas kenianas, é África, e não tem nada de primitivo, cidade é cidade em qualquer continente e onde eu estava era uma capital muito semelhante com as capitais brasileiras. 


 


Em uma conversa com o dono da casa onde estávamos hospedados, ele nos contou que no Kenia se fala quarenta e dois dialétos, e para que eles comunicassem entre si, foi necessário adotar uma segunda língua oficial (o inglês), e por isto, crianças, mendigos, empresários, todos falam o inglês alem de sua língua materna (que mostra também neste aspecto que eles estão muito mais avançados do que o Brasil, avanços estes que classificaria em 3 fatores, 1º por dominarem uma segunda língua oficial, 2º por uma questão prática, eles dialogam com o mundo e não por uma questão cultural que impõem que o inglês tem que ser uma língua universal, mutilando outras culturas, 3º os kenianos são tão inteligentes que dominam a língua do colonizador,  lembre-se, o Kenia só tem 45 anos de independência preservando as 42 línguas locais, e o colonizador não domina estas 42 línguas – A África esta ganhando de 43 a 1.


 


Por volta do sexto dia de estadia mudamos para um hotel no centro da capital, e ai pude conviver um pouco mais com o povão. Tive um certo estranhamento do óbvio, aquel lugar é ''um mundo só dos pretos'', é como se fosse São Paulo, mas só de pretos. Os garçons são pretos, os vendedores são pretos, os donos de hotéis são pretos, os mendigos são pretos, os taxistas são pretos, os patrões são pretos, na televisão são todos pretos, nos estandartes, nos desenhos pintados nas paredes, os comerciais de leite, de roupas, de cosmético, as aeromoças, os gerentes, os policiais, bem… vou ter que escrever 500 páginas pra que vocês entendam com perfeição, por isto que estranhei, porque por mais que eu sabia, você vê e viver é muito diferente. Não é equivoco quando disse que é “um mundo só dos pretos''.Brancos?


Existem! Mas quase não se vê, e quando vemos, você sabe que é europeu, pele branca de neve e olhos azuis. Achei isto fantástico, pois quebra qualquer preconceito e mito de estética branca, de competência ou capacidade, provando a tese do RZO.  “Todos são manos, todos são humanos”


Dos dez dias que fiquei lá, só vi uma keniana mestiça, há… por falar em keniana, na minha avaliação 89% delas são lindas, fogem do padrão, desde as crianças atá as tias, sem falar que eu nunca fui tão assediado na minha vida que nem fui lá, as pretas mais lindas que eu vi na minha vida ou que já sonhei, davam de cima de mim, é de se entender, pois eu sou gostoso pra caraio, de parar quarteirões de tão bonito que sou (risos), mas meu compromisso lá era outro, temos uma grande divida com a Mãe África! e não podemos misturar as coisas, brincar de turista? Não! Sou fruto daquela terra.


 


Nos dias do fórum, eu e meu amigo Toni C., que mora em São Paulo, coincidentemente usamos a camisa do grupo AfroReggae do Rio de Janeiro, o interessante foi que varias pessoas de vários países diferente vinham nos abordar perguntando se eramos do AfroReggae, e ai nós explicamos que eramos parceiros. Pelo que eu me lembro tinham pessoas da Áustria, Espanha, Inglaterra, Canadá, Itália, EUA, alem de pessoas de vários estados brasileiros.


 


Em uma visita que fizemos, fomos na segunda maior comunidade periférica do Kenia, lá tem um baixíssimo índice de desenvolvimento, é miséria total mesmo lembrando que lá é muito diferente do centro, como no Brasil, não existe saneamento básico, o esgoto é a céu aberto, ruas de terra, casas de madeira e piso de terra, água encanada quase não existe, desemprego total, e a única fonte de renda que eles tem são as feiras, vários produtos recolhido no maior lixão do país que fica ao lado da favela, produtos que a gente chama aqui de “paraguai”, alem de frutas, legumes e carnes expostos ao sol. Mas uma coisa que me chamou atenção neste lugar foi o amor que eles tem pelo Brasil. Tinham varias imagens graffitada do Ronaldinho Gaúcho e ônibus pintados imitando o ônibus oficial da seleção brasileira. Presenciei também alguns grupos de hip-hop local, e a grande resistência em prol da vida que aquelas pessoas tem. Agora o que mais me emocionou foi quando chegamos ao nosso foco da visita, uma rádio comunitária, ou melhor… a única rádio comunitária daquele pais. Na conversa com dois dos fundadores eles disseram que a proposta era montar uma TV comunitária, mas que não conseguiram recursos para isto, e na tentativa de dar voz para aquela comunidade eles iniciaram um processo de pesquisa na internet para procurar alternativas, foi quando eles ouviram falar em “Uma tal de radio favela” localizada em Belo Horizonte. Neste momento os olhos do fundador ate brilhou (ele ainda não sabia que eu era de belo horizonte) ao falar do cara que havia sido preso 5 vezes e que resistiu contra o estado até conseguir concretizar os seus sonhos. Passaram então a se inspirar nesta rádio, mobilizaram a comunidade para construi-la com ajuda de uma ong internacional eles conseguiram a doação dos equipamentos.


 


Três semanas após a implantação da rádio, o governo oprimiu e fechou, com a mobilização da comunidade eles reabriram a rádio, dando prioridade para as minorias que não tem espaços em outros meios de comunicação, como o hip-hop local. Além de programas educativos, casando com outros projetos em prol do desenvolvimento comunitário.


 


Nesta conversa eu me identifiquei e disse a eles que morava em Belo Horizonte e que sou parceiro da rádio Favela, sai de lá com a missão de colocar eles em contato direto a rádio, eles ficaram muito empolgado com a possibilidade deste dialogo direto e com a troca de experiência, e me passou o projeto e os contatos para que eu entregasse à Radio Favela. O que já fiz.


 


Curiosidades
• Fiz meu 29º aniversario na África, lá eu tive certeza do quando que eu amo o Brasil as pessoas que nele residem, depois que voltei eu brinco que pra mim voltar pra lá definitivamente só falta concluir a lista dos 150 melhores amigos e levar todos pra irem morar lá comigo.
• Muito engraçado é ver uma multidão de pessoas correndo nas ruas, para os kenianos isto é muito comum, vi até pessoas de jaqueta e palito correndo nas ruas em baixo de sol do meio dia.
• Lá, quase não existe arroz e feijão, e é muito comum comer com as mãos, sem talher.
• Grande parte dos ônibus de lá, tem 2 televisão, vídeo, e toca rap o tempo todo, e tem muito ônibus grafitado e desenhado com referencias de lideres negros e hip-hop, principalmente 2Pac e Malcom X.


 


Considerações finais


Gostaria que este texto fosse aceito como um texto produzido por um “rapaz comum”. Não gostaria que as pessoas generalizassem as informações inclusa neste texto, pois temos que ter muita sensibilidade para entender as particularidades de variados locais, não como melhor ou pior, mais como diferente, neste caso um diferente que respeita a vida e a humanidade, pois só assim faremos jus ao tema central do Fórum Social Mundial, “Um outro mundo é possível, se agente quiser”.



Francis é disc jokey do NUC – Negros da Unidade Consciente, MG.

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