"Eu acuso": Por que? Para que?

Desde a eleição de Eduardo Cunha na presidência da Câmara – junto com a incapacidade de Dilma montar uma maioria progressista – é público que os conservadores são maioria na casa. A agenda que os coesiona é a da austeridade para os mais pobres com as reformas que estão em curso. A pergunta que devemos fazer é: o que pode ser o centro de gravidade de uma nova maioria no Congresso? 

A eleição – supostamente – se avizinha e é mais que necessário discutir os alicerces de um bloco que seja capaz de propor uma nova agenda para o país.

Não vivemos, contudo, dias fáceis. A crise que se instalou na República não tem um desfecho previsível. A preponderância do Judiciário no desequilíbrio entre os demais poderes não pode ser ignorado. Arvorando-se da sua suposta probidade, os juízes e procuradores fazem o que querem e negligenciam, inclusive, a própria lei pelo “combate à corrupção.” A PGR já derrubou o chefe do Poder Legislativo e, agora, insiste para afastar o chefe do Poder Executivo. Onde isso vai parar? Devemos avaliar seus atos pelos seus meios ou pelos seus resultados? Não há nada de positivo nesse conluio entre o Poder Judiciário e os meios de comunicação de massa (Organizações Globo e afins) “que criminalizam a política e subordina o discurso jurídico aos critérios do mercado, reproduzindo desta maneira a lógica do estado de exceção”.

De um lado, a política é vista como algo nocivo, do outro, o “direito” levado ao cabo por esses juristas desconsidera a própria constituição. O direito penal – em tese – é do fato, não do autor. Por mais amargo que seja, temos que ter um certo receio de que estejamos a abrir precedentes perigosos demais com o desejo de punir nossos “inimigos”. Temer e Aécio serem denunciados, Cabral e Cunha presos e tantos outros exemplos que contemplam a nossa sanha vingativa. Mas isso tudo é válido mesmo se deixarmos de lado a lei? É vantajoso calar-se ou omitir-se perante essas arbitrariedades que colocam em xeque o Estado de Direito? Quando um juiz em março de 2016 anulou a nomeação de Lula por Dilma (num flagrante arbítrio) ninguém contestou nada. E tinha lá… fotos do magistrado nas passeatas pelo impeachment e postagens de “fora dilma” nas redes sociais o qual não deixava dúvidas de sua parcialidade. Ninguém disse nada. Pelo contrário, cumpriu-se uma decisão judicial viciada. Enquanto isso, juízes comprometidos com a democracia são perseguidos pelo Conselho Nacional de Justiça. De tal modo foi o arquivamento da representação contra Moro pelo TRF-4. O juiz da 13° Vara de Curitiba fez um verdadeiro espetáculo com os grampos ilegais expondo a presidência da república. Qual foi a resposta dos desembargadores? O ineditismo da Lava Jato exige medidas excepcionais.

Deve-se considerar que tudo está conectado. Não há fio solto. A sanha dos “órgãos de controle” em interferir na administração pública está correlacionada com esse ambiente que vivemos. Foi só a partir desse contexto que o Corregedor teve a audácia suficiente de numa briga com o Reitor da UFSC, o qual aquele está subordinado, pedir seu afastamento. A sua prisão foi por obstrução à justiça, mas os meios de comunicação divulgaram como se o Reitor participasse do desvio de verba. O resultado todos nós sabemos… o constrangimento e o linchamento levou a morte do reitor. Cada vez é mais comum decisões judicias contorcidas. Indícios e presunções viram prova, prova é transformada em uma mera crença; prisão preventiva passa de exceção à regra; decisões absurdas como a permissão de “cura gay” ou permitir discurso de promoção de ódio nas redações do ENEM são deferidas e comemoradas; fundamentação da sentença utilizando discurso de Bolsonaro ou a Bíblia ao invés da própria lei.

Precisamos recompor uma estabilidade democrática e o caminho para isso não é um punitivismo barato, tampouco acreditar que a salvação da pátria está nessas corporações do judiciário. É necessário defender o Estado de Direito ou o pouco que ainda resta dele. Defendê-lo como princípio e não ao sabor dos ventos. Na década de 90 utilizava-se o discurso da ineficiência para privatizar o setor público. No auge do neoliberalismo, os argumentos de um Estado pesado e incapaz era o combustível para liquidar o patrimônio público. Hoje, aliado a essa receita, há a criminalização dos gestores. Basta denunciar “este é corrupto” e é suficiente. Não precisa de provas, não é necessário o devido processo legal. Basta apenas uma simples denúncia do Ministério Público e os meios de comunicação dão a satisfação de julgar e condenar sumariamente. Estão transformando cada autarquia, cada empresa ou fundação pública – aos olhos da população – em organizações criminosas. O seu objetivo, entretanto, não é de sanar a corrupção, mas sim de entregar esses setores aos interesses estrangeiros. Enfim, o que é mais assustador é dessa realidade lembrar àquele velho ditado de criança… “se ficar o bicho pega, se correr o bicho come.”

1. Cf. artigo do professor Rogério Dultra sobre o tema: http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/sistemapenaleviolencia/article/view/25949

2. https://www.conjur.com.br/2016-set-23/lava-jato-nao-seguir-regras-casos-comuns-trf

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