Eleições de 2020: só une quem tem voz e luz próprias

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Manuela D'Ávila e Olívia Santana concorrerão a prefeita pelo PCdoB nas eleições 2020

Os desdobramentos políticos de 2020 seguem surpreendentes, como o ano surpreendente, e muitas vezes triste, que vivemos. A disputa política no campo progressista e a realidade concreta das eleições municipais ocasionaram a dispersão do campo progressista, em um momento de crescimento estarrecedor da popularidade de Bolsonaro. Diante deste pasmo, extraio algumas lições:

– O impressionante efeito de programas que fazem o recurso chegar na ponta, aos mais pobres e sua importância para a economia nacional é inegável. O Bolsa Família e o Auxílio Emergencial mostraram como a renda básica de cidadania tem um caráter salvífico, redentor, numa nação afundada na desigualdade;

– Desde a negativa de apoio de Ciro a Haddad e Manu em 2018, vemos sucessivas demonstrações de incapacidade das maiores forças políticas de esquerda entenderem que a Frente Ampla é o único caminho para vencer o bolsonarismo. Durante 2 anos de DR, ataques e demarcações de parte a parte, o cenário é soturno. Esse desacordo fundamental que cinge PT e PDT é o principal responsável pelo vácuo político no campo progressista que impulsiona a extrema direita. Bolsonaro, vendo que uma oposição – que detinha a maioria – era incapaz de unir-se, fez a frente conservadora. Deixou de demagogia, e definiu a feição de seu governo, agregando a direção de Trump, o pentecostalismo de negócios, parasitas e especuladores financeiros, grileiros, madeireiros, desmastadores e reis do gado com o “Centrão”, que nada mais é que o a base conservadora mais sólida e fiável para todo tipo de trairagem e negociata contra o país.

Ora, ora. Unir seu campo e dividir o do adversário(a) é o básico em política. Enfrentar  inimigo principal é outra lição. Que preço cobrará a arrogância dos maiores partidos da esquerda brasileira? E dos demais, o que deles se espera? Que fiquem olhando os graúdos e aguardem?!

As vitórias que tivemos até agora advieram da política de Frente Ampla. O Auxílio Emergencial, O FUNDEB e a lei Aldir Blanc demonstraram o potencial de uma ação coordenada, realista, articulada, ampla e justa.

As derrotas que se anunciam também decorrem em grande medida de não termos uma política de Frente Ampla. O PT e o PSOL, em diferentes momentos e circunstâncias, e com destaque para o PT, colaboraram com a Cláusula de Barreira, ou seja: de acordo com um percentual de votos nessas eleições já tão maculadas, haverá a redução de partidos. O mesmo PT que recusa a Frente Ampla operou para que os partidos de esquerda menores que a sigla de Lula, fossem crescentemente excluídos da vida democrática. Na lógica tradeunionista, pragmática e burra, pensaram o aquilo que publicamente expressou seu dirigente nacional Breno Altman, quem em posts, digamos assim, de garoto maroto, afirma: 

“O PCdoB luta com muitas dificuldades para alcançar a cláusula de barreira em 2022. Não seria a hora de se integrar ao PT como corrente interna? Os petistas, de quebra, além da incorporação desse valoroso partido, teriam quadros como Dino e Manuela para a estratégia presidencial.”

E ainda:

“A cláusula de barreira, em si, não é antidemocrática. Ao contrário: importante para impedir formação dos partidos de aluguel e fragmentação parlamentar. Mas precisa ser completada com o instituto das federações partidárias, para impedir que partidos ideológicos sejam ceifados.” 

É comovente a “solidariedade”  e risível a ignorância. A sabedoria, então, ai, ai. Ora, a Cláusula de Barreira é antidemocrática por essência, e é universalmente – junto com o voto distrital – aplicada para a exclusão das minorias, da esquerda, do povo, que é excluído do jogo eleitoral. Escancara-se  assim o incômodo no PT com as posições próprias do PC e o desejo de o eclipsar. Desvela-se a burrice de quem nos constrange à cooptação, ignorando a densidade ideológica e a História, que não começou em 1980. Por outro lado, resolve um problema das classes dominantes, cujos partidos carecem desesperadamente de união consevadora, para não desaparecerem, eclipsados pela extrema direita bolsonarista. É apenas um dos episódios em que o PT erra. Longe de liderar uma ampla frente, apequena-se, fecha-se, ao tempo em que vira alvo fácil.

Desse modo, nem frente de esquerda, nem frente ampla, e sim pulverização e sinais claros de derrota nas eleições municipais, não só do PT, mas do campo progressista.

Ora, num tal cenário, que deveria fazer o PCdoB, imprensado pela esquerda e pela direita? Ser aba daqueles responsáveis pela divisão?!   Tomou para si as lições do então camarada Carlos Drummond de Andrade e disse:

Quando nasci, um anjo torto
Desses que vivem na sombra
Disse: Vai, Carlos! Ser gauche na vida

Ou seja, vai pra cima, PC! No rumo do nosso centenário, fica claro que só haverá unidade se nossa voz for respeitada. Assim foi também no movimento sindical. Anos e anos dentro da CUT nos ensinaram que ou teríamos voz própria, ou não viria a unidade. Dialeticamente, só tendo voz e cara própria poderemos nesse cenário defender a unidade e a existência do PCdoB. Assim, nosso Partido, experiente, vivo, cheio de ginga e de amor ao povo brasileiro, decidiu botar para moer, e pôs. Aonde houver chance de unir, união a mais ampla possível, aonde prevaleceu a dispersão, cara própria, contar com as próprias for;cas, não ser aba  e fazer o quociente. Assim, em Porto Alegre, com Manuela; em São Luís, com Rubens; em Florianópolis com Elson (PSOL); no Rio, com Benedita (PT) e a Enfermeira Rejane (PCdoB); em Belém, com Edmilson Rodrigues (PSOL), são exemplos de um princípio de unidade, na esquerda. País afora, no entanto, a dispersão tal que fomos confrontados infelizmente com a necessidade de resistir ou fenecer. E aqui, cair, em pé ou deitado, não é opção. As almas sebosas que e frustrem, nós venceremos a cláusula de Barreira e construiremos mais 100 anos de lutas.

Essa determinação levou ao mais ousado projeto do PCdoB em eleições municipais de sua história. O Partido se desdobra, tão pobre e combatido pelos poderosos e gringos, e faz das tripas coração, mas lançou suas chapas país afora, incluindo as candidaturas a Prefeitura em 13 capitais. E assim, com ousadia e generosidade, apresenta chapas de inegáveis qualidade e representatividade. Só fera: em São Paulo, Orlando Silva e a enfermeira e bancária Andréa; em Salvador, Olívia Santana, a cara do povo e da luta; em Fortaleza, o Professor Anízio e a legendária Helena Serra Azul; em Belo Horizonte, meu ex-presidente da UJS, Wadson Ribeiro;  Curitiba (PR), com Camila Lanes e Dr. Zequinha;  Maceió (AL), com Cícero Filho e Maria Yvone; Manaus com Marcelo Amil e Dora Brasil, e Natal com Fernando Freitas e Joana Lopes; Porto Velho (RO), com Samuel Costa, e em Vitória (ES),  Namy Chequer.

Em cada cidade, o Partido se desdobra em ampliar sua influência social, enfrentando as barreiras e a pandemia, com o foco em três questões: a nossa própria contribuição para tornar nossas cidades mais humanas,  na nossa independência e existência, superando o quociente eleitoral, ter voz ativa na eleição e lutar pela vitória do campo progressista. Assim, criou o Movimento 65, e precisa de plataformas ainda mais amplas para construir as múltiplas escadas que levam o povo da luta cotidiana até a consciência avançada. O PCdoB precisa se dirigir diretamente ao povo para crescer e poder influenciar mais fortemente os destinos do país, por mais do que nunca o Brasil precisa do PCdoB. Não temos dinheiro, mas temos vontade, verdade, a cara do povo, e sabemos como cuidar bem das pessoas, da política e dos dinheiros públicos. E o povo precisa saber.

A partida começou. Haverá uma derrota universal? Poderemos nos unificar em torno das candidaturas frente amplistas e vencer no segundo turno? Haverá cabeças de lança que ampliem nossa liderança e alcem nossa voz. Tudo depende da política, contato e do voto. Tenho muita esperança que as vozes comunistas nas eleições municipais ajudarão às vitórias do povo. Isso se fará, entretanto, na medida exata de resistirmos firmes, e fazermos um trabalho consciente, das redes às ruas, das ruas às redes e para a urna. O PCdoB, que lançou Manuela a Presidenta e que assumiu espaço na chapa nacional em 2018 na vice, que projetou Flávio Dino ao patamar de Presidenciável, é o mesmo PCdoB que falará ao nosso povo, olhos nos olhos, na metade das capitais dos estados brasileiros.

Firmeza, trabalho, método, boa política, candidatos filhos do nosso povo, teremos nossas vozes para combater o bom combate pela vida de nossa gente, nos municípios brasileiros. Imagino a felicidade ter esse direito de votar no 65, de ter esses candidatos e candidatas tão representativos, de luta, nossos camaradas queridos. E, claro, preparem o lombo, porque somos pedra e vidraça.

Unir onde pudermos unir, mas contar sempre, primeiro, com nossas próprias forças, e aprender com esse desafio que veio para ficar, as chapas e as candidaturas próprias do PCdoB. Somente com cara e voz própria é que içaremos a bandeira da vitória, a bandeira da unidade, a bandeira da Frente Ampla.

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Um comentario para "Eleições de 2020: só une quem tem voz e luz próprias"

  1. Darcy Brasil disse:

    Eu iria um pouco mais para trás, e escreveria “desde a articulação de Lula e das principais lideranças do PT para isolar Ciro Gomes e impôr aos partidos institucionais de esquerda a candidatura de Haddad, vemos…”. Pois, muito antes de Ciro, de forma absolutamente equivocada, ter se recusado a participar ativamente da campanha de Haddad no 2° turno, leríamos, em janeiro de 2018, o que Emir Sader escreveu nas redes sociais: “entre Ciro e um poste, votaria no poste”. O Brasil 247 e o DCM, também a partir de janeiro de 2018, articularam uma sistemática campanha contra a proposta então aventada de uma chapa encabeçada por Ciro Gomes e apoiada pelo PT; nos espaços reservados aos comentários desses dois sítios , um bombardeio de injúrias e calúnias era desferido contra Ciro; comentaristas, como eu, que tentaram defender a unidade, lembrando que Ciro deveria ser tratado como aliado, foram excluídos permanentemente do espaço reservado aos comentários (o que me fez jamais voltar a abrir matérias no 247); pouco tempo depois,quando o PT ainda não tinha desencadeado a tática que levaria Haddad a ser seu candidato, isolando Ciro Gomes, a presidenta do PT, indagada sobre a possibilidade de o PT abrir mão de um nome próprio em favor de Ciro, proferiria a frase emblemática (e profudamente divisionista, sectária, agressiva, inaceitável para alguém que responde pelas articulações políticas de seu partido, frase que correspondia mais ao que diria um simpatizante sectário do PT, despreparado politicamente, do que a uma liderança madura de um partido que mantinha relações amistosas e de parceria com o PDT) “Ciro, nem com reza brava”. PS: não sou cirista e nem pedetista; ultimamente, tenho pensado no quanto foi correta a argumentação de João Amazonas que presenciei em defesa do parlamentarismo por ocasião do plebiscito. Tivesse o parlamentarismo sido aprovado, Bolsonaro jamais estaria à frente do Poder Executivo. O regime parlamentarista teria implicado em maior valorização dos partidos em detrimento do fulanismo, facilitaria a articulação da sociedade para pressionar o parlamento, valorizando mais a importância das pressões de baixo para cima, das ruas, dos sindicatos, dos movimentos sociais, em defesa de direitos conquistados e a conquistar, pois o parlamento é muito mais sensivel ao jogo de pressões e contra pressões de que se reveste a luta de classes, às pressões das ruas e da sociedade, por força de sua maior heterogeneidade e medo de ser derrotado nas urnas. Por último, fora essas duas observações, uma pertinente à sua análise e outra relacionada aos meus sentimentos políticos mais urgentes, concordo com 95% da análise.

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