Ditadura do mercado contra Mantega
A nomeação do economista Guido Mantega para o Ministério da Fazenda parece não ter agradado o todo poderoso deus-mercado. Logo após sua posse, Márcio Cypriano, presidente do Bradesco e da Febraban, a onipotente federação dos banqueiros, deu uma entrevista
Publicado 06/04/2006 08:16
A nomeação do economista Guido Mantega para o Ministério da Fazenda parece não ter agradado o todo poderoso deus-mercado. Logo após sua posse, Márcio Cypriano, presidente do Bradesco e da Febraban, a onipotente federação dos banqueiros, deu uma entrevista descarada exigindo a continuidade da política de responsabilidade fiscal, liberdade cambial e de metas de inflação. Os círculos financeiros tupiniquins e de Wall Street não esconderam a sua decepção com a escolha do presidente Lula. O Murilo Portugal [secretário-executivo do ex-ministro Antonio Palocci, que já havia servido ao governo FHC] seria uma opção melhor na visão do mercado, desabafou Maristella Ansanelli, economista-chefe do Banco Fibra.
Para atiçar os nervos dos banqueiros, pouco depois os maiores expoentes neoliberais do time de Palocci também pediram demissão – entre eles, dois queridinhos do mercado, Murilo Portugal e Joaquim Levy. Na seqüência, o novo ministro sinalizou que deseja promover mudanças, mesmo que tímidas, na política macroeconômica. Em suas primeiras entrevistas, ele defendeu a adoção de taxas de juros civilizadas e criticou o dogma das metas de inflação. Não seria nenhum pecado mortal se houvesse alguma mudança de dosagem na política de juros e de superávit. Empossado, Mantega afirmou que não dará continuidade as iniciativas do seu antecessor de aprofundamento do arrocho fiscal e de maior abertura comercial.
Mantida esta linha, a queda-de-braço entre o novo ministro e a ditadura financeira será inevitável. Com o objetivo de atingir o presidente Lula, o bloco liberal-conservador atirou para matar no confiável Palocci. Este sempre serviu aos interesses dos banqueiros e sempre foi blindado pela oposição direitista e por sua mídia por ter seguido a ortodoxia neoliberal de FHC. Mas, apesar de ter cedido tanto ao deus mercado, ele foi descartado e teve sua vida devassada por causa da sucessão presidencial. Agora, os especuladores e rentistas tentam enquadrar o novo ministro e fazem chantagens e ameaças; temem perder o comando da economia. Bombardearam Palocci por motivos eleitorais, mas desejam a manutenção do paloccismo!
Mudança de rumo?
A pressão do capital financeiro costuma ser implacável. Até críticos venenosos do governo Lula, como o errático Elio Gaspari, já estão indignados com esta nova onda de coação. Terrorismo de mercado, esse é o nome da tentativa de emparedamento do novo ministro da Fazenda, Guido Mantega, chiou em recente artigo. Se o novo ministro resistir às pressões dos banqueiros, mantiver distância da política econômica do antecessor e promover alguma mudança de rumo – mesmo que de forma cautelosa –, a oposição de direita terá dado um tiro no pé! Ao radicalizar sua ofensiva, embalada numa cruzada moralista hipócrita, forçará o governo Lula a adotar um comportamento mais sintonizado com os anseios mudanças da sociedade.
Como observa Valter Pomar, secretário de relações internacionais do PT, a jogada da direita ao destronar Palocci, visando nitidamente desgastar Lula, poderá ter um efeito contrário ao pretendido. O governo e o PT demonstraram, algumas vezes, agir melhor quando sob intensa pressão. Nesse sentido, a indicação de Guido Mantega para substituir Palocci pode ter impacto similar aos efeitos da indicação de Dilma Rouseff para substituir José Dirceu: não uma mudança da estratégia, mas uma inflexão ‘progressista’ ainda que dentro da mesma estratégia… A escolha de Guido Mantega sinaliza que Lula quer mais desenvolvimento, mesmo que ainda nos marcos de uma estratégia de convivência com a hegemonia do capital financeiro.