Ditadura do mercado contra Mantega

A nomeação do economista Guido Mantega para o Ministério da Fazenda parece não ter agradado o todo poderoso deus-mercado. Logo após sua posse, Márcio Cypriano, presidente do Bradesco e da Febraban, a onipotente federação dos banqueiros, deu uma entrevista

A nomeação do economista Guido Mantega para o Ministério da Fazenda parece não ter agradado o todo poderoso deus-mercado. Logo após sua posse, Márcio Cypriano, presidente do Bradesco e da Febraban, a onipotente federação dos banqueiros, deu uma entrevista descarada exigindo a continuidade da política de responsabilidade fiscal, liberdade cambial e de metas de inflação. Os círculos financeiros tupiniquins e de Wall Street não esconderam a sua decepção com a escolha do presidente Lula. O Murilo Portugal [secretário-executivo do ex-ministro Antonio Palocci, que já havia servido ao governo FHC] seria uma opção melhor na visão do mercado, desabafou Maristella Ansanelli, economista-chefe do Banco Fibra.




Para atiçar os nervos dos banqueiros, pouco depois os maiores expoentes neoliberais do time de Palocci também pediram demissão – entre eles, dois queridinhos do mercado, Murilo Portugal e Joaquim Levy. Na seqüência, o novo ministro sinalizou que deseja promover mudanças, mesmo que tímidas, na política macroeconômica. Em suas primeiras entrevistas, ele defendeu a adoção de taxas de juros civilizadas e criticou o dogma das metas de inflação. Não seria nenhum pecado mortal se houvesse alguma mudança de dosagem na política de juros e de superávit. Empossado, Mantega afirmou que não dará continuidade as iniciativas do seu antecessor de aprofundamento do arrocho fiscal e de maior abertura comercial.




Mantida esta linha, a queda-de-braço entre o novo ministro e a ditadura financeira será inevitável. Com o objetivo de atingir o presidente Lula, o bloco liberal-conservador atirou para matar no confiável Palocci. Este sempre serviu aos interesses dos banqueiros e sempre foi blindado pela oposição direitista e por sua mídia por ter seguido a ortodoxia neoliberal de FHC. Mas, apesar de ter cedido tanto ao deus mercado, ele foi descartado e teve sua vida devassada por causa da sucessão presidencial. Agora, os especuladores e rentistas tentam enquadrar o novo ministro e fazem chantagens e ameaças; temem perder o comando da economia. Bombardearam Palocci por motivos eleitorais, mas desejam a manutenção do paloccismo!




Mudança de rumo?


A pressão do capital financeiro costuma ser implacável. Até críticos venenosos do governo Lula, como o errático Elio Gaspari, já estão indignados com esta nova onda de coação. Terrorismo de mercado, esse é o nome da tentativa de emparedamento do novo ministro da Fazenda, Guido Mantega, chiou em recente artigo. Se o novo ministro resistir às pressões dos banqueiros, mantiver distância da política econômica do antecessor e promover alguma mudança de rumo – mesmo que de forma cautelosa –, a oposição de direita terá dado um tiro no pé! Ao radicalizar sua ofensiva, embalada numa cruzada moralista hipócrita, forçará o governo Lula a adotar um comportamento mais sintonizado com os anseios mudanças da sociedade.




Como observa Valter Pomar, secretário de relações internacionais do PT, a jogada da direita ao destronar Palocci, visando nitidamente desgastar Lula, poderá ter um efeito contrário ao pretendido. O governo e o PT demonstraram, algumas vezes, agir melhor quando sob intensa pressão. Nesse sentido, a indicação de Guido Mantega para substituir Palocci pode ter impacto similar aos efeitos da indicação de Dilma Rouseff para substituir José Dirceu: não uma mudança da estratégia, mas uma inflexão ‘progressista’ ainda que dentro da mesma estratégia… A escolha de Guido Mantega sinaliza que Lula quer mais desenvolvimento, mesmo que ainda nos marcos de uma estratégia de convivência com a hegemonia do capital financeiro.




 


O renomado sociólogo Emir Sader também vislumbra esta possibilidade. Para ele, ao nomear Mantega, Lula aponta, não para mudanças imediatas na política econômica, mas sinaliza a sua disposição concreta de que um segundo mandato presidencial terá outra ênfase: desenvolvimento e distribuição de renda. Com esse gesto, estende uma ponte na direção do empresariado industrial e outra na direção dos beneficiários das políticas redistributivas. Ocupa um espaço que o cobertor curto da opção claramente neoliberal de Alckmin deixa descoberto. É, portanto, uma escolha para o presente, mas principalmente para o futuro. Hoje, mantêm-se a política econômica, flexibilizando-a, mas Lula aponta para uma política de saída do modelo herdado. Que ambos estejam certos para o bem-estar do povo e para evitar a revanche neoliberal.

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