A satanização da sexualidade humana

Bush usar dinheiro público de um Estado laico para irrigar sua visão religiosa é indecente. Mas é abusar demais se contrapor a verdades científicas.

Não dá pra assistir calada à satanização da sexualidade humana em curso no que se convencionou chamar de a maior democracia do mundo, os Estados Unidos, pois o exercício pleno, voluntário e prazeroso da sexualidade é uma das maiores conquistas culturais da humanidade. O direito ao prazer é uma conquista da civilização.


 


 


No artigo “Os mistérios do hímen”, digo: “Um olhar histórico sobre a virgindade revela uma cultura terrorista eivada de preconceitos e tabus. Guardar ’virgindade’ ou transar sem a obrigatoriedade de casar são opções de foro íntimo das mulheres na era dos direitos humanos e após o advento da ’pílula’ – que separou, definitivamente, as delícias dos prazeres da transa da obrigatoriedade de procriar e de casar” (O TEMPO, 17.1.2007).


 


 


Fui tomada de súbito mal-estar ao abrir a “Folha de S.Paulo”, domingo passado, ao dar de cara com uma página dedicada aos Bailes de Pureza, “a última tendência entre cristãos conservadores, em que jovens juram manter a virgindade”, conforme o jornal.


 


 


Eis uma jogada marqueteira dos movimentos pela abstinência sexual que recebem forte injeção de dólares de Bush, via Escritório de Iniciativas Baseadas na Fé e Comunitárias da Casa Branca, que em 2007 distribuirá US$ 323 milhões, 37% mais que em 2006.


 


 


Bush, em 2003, destinou US$ 135 milhões para o Movimento Pró-Abstinência Sexual de Adolescentes e reduziu os fundos para as campanhas pelo Sexo Seguro!


 


 


Mark Regnerus, professor da Universidade do Texas e pesquisador do Núcleo Nacional de Estudos de Juventude e Religião, da Universidade da Carolina do Norte, entrevistado pela “Folha”, disse: “Na verdade, vejo os Bailes de Pureza como uma extensão da campanha pela abstinência sexual, parte da política doméstica do presidente Bush (…) A atual administração manda recursos para as escolas públicas que ensinem educação sexual do jeito que o presidente quer, com foco na abstinência”.


 


 


Mark Regnerus, autor do livro “Fruto Proibido – Sexo e religião nas vidas dos adolescentes norteamericanos”, elenca dados relativos a transar só após casar: evangélicos: 73,7%; protestantes tradicionais: 51,9%; católicos: 51,2%; judeus: 27%.


 


 


Regnerus pesquisa as repercussões da “Política ABC”, ação divorciada de noções rudimentares de direitos sexuais e direitos reprodutivos, alicerçada na visão fundamentalista de Bush e do Vaticano, que consta de três pontos: abstinência; fidelidade; e camisinha, quando absolutamente necessária.



 



Bush usar dinheiro público de um Estado laico para irrigar sua visão religiosa é indecente. Mas é abusar demais se contrapor a verdades científicas, já que tais ações difundem que a proteção da camisinha contra a Aids e demais DST's é duvidosa!


 


 


Todavia, a pregação fanática da abstinência sexual, que tem o voto de castidade como alicerce, mostra resultados que enfraquecem o movimento pró-virgindade como a pedra de toque da prevenção das DSTs e arauto da única moralidade possível.


 


 


A Universidade de Columbia pesquisou por sete anos 12 mil jovens de 12 a 18 anos, revelando dados desmoralizadores do puritanismo do movimento True Love Waits, que distribuiu 2,5 milhões de “carteirinhas de voto de castidade”: portadores(as) da carteirinha têm menor acesso à informação e não são sensíveis aos apelos de uso da camisinha; retardam o início da vida sexual em até 18 meses; se casam mais cedo e têm menos parceiros que os demais adolescentes.


 


 


Todavia, exibem uma taxa de contaminação por DSTs igual a quem não jurou castidade. É isso que Bush e o Vaticano oferecem ao mundo no lugar de educação sexual e da orientação para o sexo seguro!

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