A peleja de Deus com o diabo, nas urnas

Na campanha eleitoral deste ano, mais uma vez inúmeros candidatos evocaram seus deuses para buscar o voto dos que comungam as mesmas crenças. De forte formação cristã, mas sem ter freqüentado os bancos universitários, o presidente Luiz Inácio Lula da Silv

A mão esquerda foi cravada: A professora universitária alagoana, senadora e socialista-bíblica, candidata Heloísa Helena (PSOL/PSTU), anatematizou: “Se comparar a Jesus é demais. Como sou cristã e conheço muito bem a Bíblia, ele está muito mais para Judas ou Pilatos”. Na mão direita, pregou a mesma ladainha o médico e discípulo da Opus Dei, candidato Geraldo Alckmin (PSDB/PFL): “Em uma ação cínica, ele ainda se compara a Cristo. É o Judas dessa história. Traiu o povo brasileiro”. (nos evangelhos, Judas Iscariotes foi o apóstolo que traiu Jesus e Pôncio Pilatos, o governador da Judéia). O golpe embaixo veio do douto e ex-ateu-confesso Fernando Henrique Cardoso, que exorcismou: “Isso não é Cristo, é o Demônio. E temos que expulsá-lo daqui”. (O Coisa-ruim dispensa apresentação)
O episódio não foi o único da campanha eleitoral em que a religião foi utilizada para abençoar ou esconjurar candidatos. No Rio de Janeiro, panfletos atribuídos à entidade Grupo de Defesa da Vida, mas sem assinatura, foram distribuídos nas portas de igrejas contra a candidatura da deputada Jandira Feghali ao Senado, em represália à sua ação em favor da descriminação do aborto. O arcebispo fluminense, D. Eusébio Oscar Scheid, orientou os padres a criticar a candidata comunista nas celebrações religiosas. Fiéis de denominações evangélicas receberam a cartilha Alerta à família brasileira, criticando o candidato ao governo do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), por aceitar a legalização do casamento homossexual. No Distrito Federal, um pastor disse, no horário gratuito, sob o balido de suas ovelhas, que, mais do que ser eleito deputado, deseja ver toda a Câmara “de joelhos”…
Vivemos tempos reacionários, dominados pelo grande capital e pelas elites conservadoras. Os meios de comunicação realizam verdadeiro bombardeio obscurantista, em todas as formas e linguagens. Mesmo os estabelecimentos de ensino perpetuam o misticismo. O papa Bento XVI, no recente diatribe em que atacou os islâmicos, teve por alvo principal a ciência que, desde o iluminismo “se empenha com astúcia para obter uma explicação do mundo que torne Deus supérfluo”. Já no dia 26 último, Kirstin Harms, diretora da Deutsche Oper (Ópera Alemã) em Berlim, cancelou a apresentação da ópera Idomeneo, Re di Creta (Idomeneu, rei de Creta), de Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791), por medo de que artistas e público fossem atacados por radicais islâmicos. (No final dessa peça, Idomeneu cambaleia sobre o palco, ao lado das cabeças decepadas de Buda, Jesus, Netuno e Maomé, colocadas sobre cadeiras). O líder do Conselho Islâmico Alemão elogiou a decisão, afirmando que “a encenação fere os sentimentos dos muçulmanos”.
Em tempos assim, ganha relevo a luta ideológica, o enfrentamento das idéias reacionárias e místicas com a luz da ciência e da concepção materialista e dialética da história, com o estudo a e difusão da filosofia marxista, “guia prático para a ação”, como a classificava Lênin. O alerta do alemão Bertolt Brecht se mantém atual:
“Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de
hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem
sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural
nada deve parecer impossível de mudar.”

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