A democracia nas entidades sindicais

O golpe militar de 64 promoveu um grande ataque contra as entidades sindicais brasileiras comprometidas com a luta dos trabalhadores. Aproximadamente 10 mil sindicalistas foram banidos do movimento sindical. Até 76, as iniciativas tomadas pela recons

Simultaneamente, cerca de 20 mil sindicalistas, estimulados por órgãos estadunidenses, fizeram cursos, inclusive muitos deles, nos EEUU. Aprenderam a combater as idéias marxistas e aplicar a concepção tradeunionista, de conciliação entre capital e trabalho, transformando os sindicatos em órgãos assistencialistas.


 



A partir de 1976,com a ditadura apresentando sinais de desgaste e com o avanço do nível de consciência política dos trabalhadores, inicia-se a possibilidade de organização e mobilização sindical tendo como objetivo básico a luta por melhores salários e condições de trabalho, objetivo este que desembocaria um pouco mais à frente na crítica ao regime ditatorial e na luta que se expressou no “Abaixo a ditadura”.


 



Foi exatamente em 1976 que um grupo de professores – do qual tive a oportunidade de participar – começou a se reunir para discutir os problemas de salário e de condições de trabalho enfrentados pela categoria.


 



E numa destas reuniões, deliberamos buscar conhecer o Sindicato dos Professores de Campinas, que era completamente omisso e funcionava quase de maneira clandestina (não em função da repressão da ditadura, mas sim para não ser “importunado” pelos professores).


 



Encontramos uma entidade que reproduzia o regime ditatorial vigente: número pequeno de sindicalizados (por volta de 5% da categoria), controle rígido das decisões nas mãos do presidente e de outros dois diretores, assembléias divulgadas com letras minúsculas (entre os “classificados”) em jornais pouco lidos por professores, ausência de mecanismos democráticos para aferir opiniões da categoria, impedimento de acesso às listas de sindicalizados, exigências de mais de 10 documentos para se sindicalizar. Este esquema funcionou por mais de 15 anos.


 



Crescia o movimento pela democratização do poder político no Brasil. As grandes greves do ABC, lideradas pelo atual Presidente da República, trouxeram um novo alento aos trabalhadores. Voltavam à cena política, os operários, protagonistas fundamentais do modo de produção capitalista,sobretudo aqueles  que ocupavam lugar de destaque no coração do capitalismo no Brasil, o ABC paulista.


 



Depois de cinco anos de persistente luta diária,  assumimos a direção do Sindicato dos Professores. Fruto dos estudos e da experiência de luta pela democracia no sindicato e no país , é que ouso apresentar aos leitores algumas idéias que possam contribuir para que as nossas entidades sindicais sejam as mais amplamente democráticas possíveis:


 



1. As instâncias de deliberação do sindicato (congressos, assembléias, reuniões de diretorias) devem decidir as políticas, orientações fundamentais da atividade sindical e não qualquer dos seus membros individualmente. Deve existir a permanente possibilidade de opiniões divergentes e contribuições individuais de cada um. O trabalho coletivo é dinâmica permanente no desenvolvimento do sindicato e decorre da compreensão de que o conjunto das atividades se deve aos esforços conjugados de todos.


 



2. Direito à participação nas correntes sindicais e nos partidos políticos: evidentemente todo o membro da categoria (e portanto , inclusive os diretores do sindicato) tem direito a manifestar, nas instâncias de deliberação da entidade sindical, suas concepções políticas e sindicais e respectivas propostas. Através do voto, decidem-se quais as táticas, estratégias, atividades que a entidade sindical irá adotar. A chamada “partidarização da entidade” ocorre quando o presidente ou a diretoria desrespeitam a maioria e impõem autoritariamente suas idéias e práticas à atividade sindical.


 



3.  Democracia nas entidades sindicais implica em: 


a. Garantir o funcionamento adequado das instâncias de deliberação da entidade, criando condições objetivas para a participação dos diretores e da categoria.
b. Eleger e garantir o funcionamento do trabalho dos delegados sindicais e das organizações por local de trabalho.
c. Socializar as informações com a categoria de forma mais eficiente possível, utilizando os meios mais avançados que a tecnologia oferece.
d. Realizar Planejamento Estratégico e Situacional (PES) para estabelecer, em conjunto, prioridades e, como conseqüência, uma distribuição adequada de recursos financeiros.
e. Formar sindical e politicamente os diretores e a categoria, buscando elevar o nível de consciência política e democrática.
f. Estimular a participação dos diretores e da categoria nas campanhas salariais e nas lutas mais gerais dos trabalhadores, na busca da democracia e do desenvolvimento econômico com valorização do trabalho e distribuição de renda.
g. Realizar eleições livres, com regras claras, com ampla divulgação de todo o processo, com permissão de acesso às listas de votantes, com tratamentos semelhantes às chapas inscritas, enfim com todas as medidas que caracterizam um processo democrático.
h. Manter relação aberta com os funcionários da entidade, respeitando os seus direitos e possibilitando a participação deles em determinadas atividades da entidade.
i. Estabelecer um processo de avaliação do trabalho desenvolvido na entidade de acordo com as determinações do Planejamento Estratégico e Situacional.


 


Ao participar deste rico processo nas entidades, os diretores coletivamente irão se formando política e administrativamente. Neste sentido, a participação sindical tem uma dimensão educativa que se reflete por um lado no crescimento intelectual, emocional e social dos diretores e por outro, no crescimento dos membros da categoria. Dialeticamente, podemos afirmar que estes seres irão se formando e adquirindo melhores condições para o exercício de novas funções que a vida política impõe.


 


 


Concluímos que o processo de democratização das entidades não é simples. Nem mesmo o processo mais geral de democratização que o país atravessa nos últimos anos, conseguiu romper barreiras culturais enraizadas na estrutura do sindicalismo. Ao lado de sindicatos que conseguiram determinados passos significativos rumo à construção de uma estrutura interna mais dinâmica e democrática, convivem entidades extremamente fechadas e burocratizadas, centralizadas fortemente nas mãos de 1 ou 2 diretores.


 


Mas mesmo entre aqueles que avançaram no terreno da democracia, ainda há um largo caminho a percorrer… Cabe a nós, sindicalistas classistas, a tarefa de continuarmos perseguindo objetivos democráticos, mas tendo consciência que a verdadeira democracia só será viável quando o capitalismo for superado e substituído pelo socialismo.


 


 


Bibliografia


 



Antunes, Ricardo – O que é Sindicalismo – Coleção Primeiros Passos – Círculo do Livro S. A. – São Paulo – 1996.
Cunhal, Álvaro – O Partido com paredes de vidro – Edições Avante – Lisboa – 2002.
Koval, Boris – História do Proletariado Brasileiro – Editora Alfa-Ômega – São Paulo – 1982.
Lênin, Vladimir I. – Sobre os sindicatos – Editora Pólis – São Paulo – 1979.
Jornal do SINPRO/Campinas – Campinas – SP.
 
  


 


Nota



        
Esse artigo foi publicado inicialmente na Revista Debate Sindical. Para esta publicação, foram introduzidas algumas modificações. 

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