A causa de Milosevich também é nossa (5)

Rotweillers e ratazanas
 


Derrubado pela contra-revolução que tomou o poder em Belgrado no dia 5 de outubro de 2.000, Milosevich tentou rearticular a resistência patriótica aos patifes que escondiam sob fraseologia “dem

Urgia tirá-lo da cena. Um punhado de rábulas encarregou-se de responsabilizá-lo pelas mais disparatadas irregularidades financeiras, inclusive de ter provocado “danos à economia sérvia” quando do surto de hiperinflação no início dos anos 1990. É preciso um cerebelo de eunuco político para falar em “danos” inflacionários num país cuja infra-estrutura produtiva acabara de ser arrasada pelos rotweillers do imperialismo. Mas um bom eunuco sempre diz “sim senhor”. Intimaram Milosevich a se apresentar à polícia. Ele desdenhou essa vulgar manobra dos “lacaios da OTAN”, como os chamava, para prendê-lo, avisando que não iria. Militantes do Partido socialista sérvio vieram, armados, ajudá-lo a resistir em sua casa, num subúrbio de Belgrado. A tropa de choque do ministro do Interior, Dusan Mihajlovic, foi rechaçada à bala ao tentar tomá-la de assalto. Mas o primeiro-ministro Zoran Djindjic tinha recebido ordens da embaixada estadunidense para prender rapidamente Milosevich e entregá-lo a seus carrascos. Mandou atacar de novo, até que, após vários tiroteios, num tipo de batalha que neoliberais e asseclas gostam de travar (toda a polícia especial sérvia contra um punhado de militantes socialistas cercados), logrou cumprir a tarefa na noite de sábado, 31 de março de 2001, para domingo 1º de abril. 


 


Esse Djindjic, chefe do Partido Democrático (sic), promovido a primeiro-ministro da Sérvia após a vitória da contra-revolução, confirmou ser uma das piores ratazanas que prosperaram nas ruínas de seu próprio país. Merece figurar, ao lado de Lech Walesa e de Vaclav Havel, entre os mais insignes e empedernidos reacionários da vitoriosa contra-revolução no Leste europeu. A Polônia, graças a Walesa, é hoje um bastião da mais obscurantista reação clérico-fascistóide; o tcheco Vaclav Havel um dos mais raivosos neo-liberais do planeta, tem se especializado em vomitar impropérios contra Fidel Castro. Nenhum deles, entretanto, nem seus congêneres búlgaros, romenos etc. chegou ao poder aproveitando o desalento provocado pela destruição da infra-estrutura de seu país, como foi o caso dos sérvios Kostunica e Djindjic, aquele revestindo de frases melífluas seu torpe ofício de traidor; este, mais quadrado, cumprindo com desenvoltura o trabalho sujo de esbirro do imperialismo.


 


 


Relatando o episódio do ponto de vista dos esbirros da OTAN, o jornalista Steven Erlanger (atualmente chefe do escritório de The New York Times em Jerusalém) compôs algumas frases que merecem ser incluídas em qualquer antologia da hipocrisia mediática. “Djindjic […]deseja assegurar que a justiça seja feita no sentido mais amplo e que a Sérvia não perca a ajuda externa necessária para melhorar as vidas dos eleitores que se voltaram contra Milosevich no ano passado”. Se respeitasse um pouco a inteligência do leitor, o periodista teria se servido da conjunção “ou”, não da “e”. Com efeito, ou bem o facho-liberal Djindjic estava preocupado com a mais ampla justiça (noção tão clara e confiável quanto a de “justiça infinita” que seria preconizada pelo celerado G.W.Bush, que acabara então  de chegar à presidência no lugar de Clinton, o tartufo), ou bem com a “ajuda externa” (cerca de US$ 50 milhões, além de empréstimos do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial).


 


 


A justiça é lenta, mas os gringos tinham pressa: o governo Bush, prossegue o referido articulista, precisava mostrar ao Congresso estadunidense que “as autoridades de Belgrado estavam cooperando o suficiente com o tribunal de crimes de guerra de Haia, nas questões de direitos humanos e no acordo Dayton de 1995, que colocou fim à guerra na Bósnia”.  Bush e seu bando não são conhecidos por um apego especial à causa dos direitos humanos. Não há, pois de ter sido esta a inspiração da mensagem que mandou seu embaixador entregar “aos líderes de Belgrado”[1], com a seguinte ordem: “Prenda Milosevich”. Entretanto, o jornalista foi sincero (ou tolo?) o bastante para esclarecer que “Washington não especificou sob quais acusações Milosevich deveria ser preso, nem insiste para que ele seja transferido imediatamente para Haia”. Tratados, pois com aquela falta de cerimônia de milionário texano, sem perder tempo com argumentos e outros floreios, os “líderes de Belgrado”, abanando a cauda ao som da voz do dono, cumpriram as ordens recebidas. Inteira razão tinha Milosevich ao tratá-los de “lacaios da OTAN”.


 


 


Dois meses depois, a despeito do mentiroso Kostunica ter reiteradamente afirmado que Milosevich seria “julgado” na Sérvia, ele foi entregue aos agentes da OTAN, sem nenhuma decisão judicial que autorizasse sua extradição e  entregue aos carcereiros d subserviente Tribunal Internacional de Haia, na Holanda.e encarcerado na Holanda, onde travaria seu último combate.


 


 


nota


1- “Autoridades”, “líderes de Belgrado” não são, nesse contexto, meros chavões jornalísticos. Em particular, chamar de “líderes” aqueles tristes personagens que aceitam ordens transmitidas pela Embaixada do país que destruiu o seu é contribuir para uma falsificação histórica.


(continua)


 

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
Autor