Ciclones Extratropicais: por que o Sul do Brasil é suscetível a esses fenômenos?

Pesquisador do Inpe explica os fatores por trás da intensificação dos ciclones e os possíveis impactos das mudanças climáticas.

Cidade de Roca Sales ficou devastada após enchentes | Foto: Maurício Tonetto/Divulgação/Governo do Rio Grande do Sul

O Sul do Brasil tem enfrentado um aumento na ocorrência de ciclones extratropicais, fenômenos meteorológicos comuns que podem se tornar devastadores quando ganham intensidade e atingem o continente. Desde julho, pelo menos quatro deles atingiram a região deixando um rastro de destruição. O último evento, ocorrido na primeira semana de setembro no Rio Grande do Sul, resultou em pelo menos 40 mortes e prejuízos que ultrapassam a marca de um bilhão de reais.

Segundo levantamento mostrado pelo G1, o Sul responde por 77% dos alertas em razão do estado de Santa Catarina, que registrou 64 ocorrências entre janeiro de 2013 e agosto de 2023. No mesmo período, foram cinco ocorrências no Rio Grande do Sul e duas no Paraná.

Mas por que essa região é aparentemente mais suscetível a esses fenômenos?

O papel da diferença de temperatura e umidade

O pesquisador Manoel Alonso Gan, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), esclarece que a formação desses ciclones extratropicais está diretamente relacionada à diferença de temperatura e umidade entre o continente e as águas próximas à costa. Essa disparidade impulsiona o deslocamento dos ciclones do continente mais frio e seco em direção ao oceano mais quente, resultando na transferência de calor e umidade para a atmosfera.

“Neste ano, a temperatura da superfície do mar está ligeiramente mais alta do que a climatologia desta época do ano. Isso contribui para que o oceano forneça mais energia em forma de calor e umidade para a atmosfera e, assim, os ciclones podem se tornar mais intensos”, analisa o pesquisador.

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Gan explica que fatores como o aumento da temperatura da superfície do mar contribuem para a intensificação desses fenômenos. O calor do oceano aquece o ar próximo à superfície, tornando-o menos denso e mais instável, o que por sua vez causa uma queda na pressão do centro do ciclone, potencializando sua força. Além disso, o ar sobre o oceano mais quente retém mais umidade, e quando se eleva para níveis mais altos da atmosfera, essa umidade se transforma em chuva, liberando calor latente que aquece ainda mais a atmosfera e diminui a pressão na superfície.

“Durante esse processo, há liberação de calor, conhecido como calor latente, que aquece mais atmosfera e a torna mais instável e, assim, a pressão em superfície cai mais um pouco”, detalha.

Mapas disponíveis no Inmet mostram a temperatura da superfície do mar ao longo da costa brasileiraCada período dever ser comparado com a variação climatológica da época, para saber se as águas estão mais quentes ou não.

Fatores diversos em jogo

“O ciclone não foi a única explicação para toda essa chuva”, ressalta Gan. Segundo ele, o recente episódio no Rio Grande do Sul não pode ser atribuído exclusivamente a um ciclone extratropical, já que outros fatores, como o estacionamento de uma frente com ar quente e úmido vindo da região Amazônica e a formação de baixa pressão, também podem ter desempenhado um papel crucial. “Faremos uma análise detalhada do caso para compreender com precisão os fatores que contribuíram para essa situação”, afirma.

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O pesquisador também menciona que, embora não haja dados disponíveis quantificando o número e a intensidade de ciclones extratropicais no Brasil, estudos indicam uma tendência de redução na formação desses ciclones devido às mudanças climáticas. “No entanto, observa-se um aumento na frequência de ciclones mais intensos”, pondera o pesquisador.

A previsão para os próximos meses, de acordo com uma nota técnica emitida pelo INPE, Inmet e Funceme, indica chuvas acima da média para o Sul do Brasil, refletindo a influência do El Niño. Isso requer uma atenção contínua e um monitoramento rigoroso dos eventos climáticos na região, à medida que os ciclones extratropicais continuam a representar uma ameaça para a área.

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com informações do MCTI e agências

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