No Japão para o G7, Lula levará o Brasil de volta ao debate com países ricos

Desde 2009 o Brasil não era convidado. Esforço pela paz e segurança alimentar devem ser os focos do Brasil na cúpula

Desde os primeiros governos, Lula foi convidado celebrado entre os países do G7. Aqui, em 2009, com o presidente americano Barack Obama e a chanceler alemã Angela Merkel. Foto de Ricardo Stuckert

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva viaja nesta quarta-feira (17) para o Japão. Ele vai participar da 49ª Cúpula do G7, em Hiroshima, que começa no próximo sábado, dia 20, e termina no dia 21, segunda-feira. O grupo reúne os 7 países mais ricos do mundo: Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido.

O Brasil participa da Cúpula do G7 como país convidado. O convite ao presidente Lula foi feito pelo primeiro-ministro do Japão, Fumio Kishida. Há 14 anos, um presidente brasileiro não era convidado para esta cúpula. Lula foi o último, em 2009, na Itália.

Além do Brasil, também foram convidados a Índia, a Indonésia, a Austrália, as Ilhas Comores, as Ilhas Cook, a República da Coreia e o Vietnã. Representantes do Banco Mundial, da Organização das Nações Unidas (ONU), do Fundo Monetário Internacional e a Agência Internacional de Energia também estarão presentes.

Em entrevista ao Portal Vermelho, a especialista em Relações Internacionais, Flávia Loss Araújo (FESPSP), considerou que o G7 está mais forte. Ela acredita que, com a guerra da Ucrânia, há um motivo para estarem mais unidos economicamente. Até então, as reuniões do grupo eram reduzidas ao utilitarismo de Donald Trump para advertências a seus aliados da Europa.

De acordo com o Ministério das Relações Exteriores, a retomada da participação do Brasil em reuniões do grupo sinaliza o engajamento do país com o G7 e marca o equilíbrio no posicionamento brasileiro em temas sensíveis do cenário internacional.

O jornalista Wevergton Brito, vice-presidente do Cebrapaz (Centro Brasileiro de Solidariedade ao Povos e Luta pela Paz), também comentou ao Portal Vermelho suas expectativas para o encontro do Brasil com os países mais industrializados. Ele também acredita que a participação de Lula terá muito peso com o retorno do Brasil à cena internacional, especialmente agora que vai presidir o G20, o grupo das economias em desenvolvimento. 

Temas sensíveis

De acordo com o embaixador Mauricio Lyrio, na pauta do G7 estão a guerra da Rússia contra a Ucrânia; o desarmamento nuclear e o enfrentamento das vulnerabilidades dos países de baixa e média renda com a inflação.

Mudanças climáticas, transição energética, segurança alimentar, saúde, direitos humanos, questões de gênero e tecnologia também estão na pauta.

Ao final da cúpula do G7, devem ser apresentados dois documentos com os posicionamentos dos países sobre os vários temas debatidos durante o encontro. Um, apenas com os países membros do grupo, e outro com os países membros e convidados.

Participação brasileira

Dois temas estão no foco do líder brasileiro, segundo o secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros do Ministério das Relações Exteriores, embaixador Mauricio Lyrio. Em dezembro, a Índia passará a presidência do G20 para o Brasil. Os encontros também devem abordar os diferentes temas da agenda internacional sob a ótica dos países em desenvolvimento.

A expectativa da professora Flávia para a participação brasileira é que o presidente Lula volte a focar nos temas tradicionais desses grandes fóruns. “Ele deve exortar para que tenha mais investimentos para o desenvolvimento econômico, deve pautar as questões sociais que são tradicionais na política externa brasileira. Vai trazer a agenda da sustentabilidade, que é algo que o Brasil quer mostrar como nova posição, depois de tudo que vimos no governo Bolsonaro”, antecipou Flávia.

Mas a especialista sabe que o tema da guerra também é centro de preocupações para o presidente brasileiro. “Lula deve provavelmente falar algo a respeito, com mais cautela para não ser mal interpretado, como ocorreu recentemente, mas deve tocar no assunto sob o viés de uma saída negociada para a guerra na Ucrânia”, avaliou. 

No entanto, para Wevergton, a participação de Lula no debate sobre a guerra e a produção do texto final deverá ser uma “queda de braço”. Ele avalia que a declaração final do G7 deve se manter no tom bélico da OTAN, pela dominância dos países aliados. Mas há também a declaração mais ampla com participação dos países convidados.

“O Brasil  tem uma postura mais equilibrada em dizer que o foco deve ser a busca pela paz. Assim, a declaração mais ampla vai ser uma queda de braço. A tendência é o Brasil se recusar a assinar e endossar uma declaração com uma visão unilateral, transformando apenas a Rússia na grande vilã e sem nenhuma nuance”, disse.

Nesse quesito, ele acredita que o Brasil pode contar com a Índia como aliada, com uma postura semelhante. “Seria uma surpresa o Vietnã não expressar visões mais próximas do Brasil”, acrescentou. 

A depender do Brasil, de acordo com sua análise, será uma declaração com foco na busca pela paz e na garantia de segurança alimentar, que não agrave a crise que o mundo está vivendo de produção de alimentos, e que afeta principalemente os países mais pobres.

“Lula tem muita autoridade e é um dos atores que tem feito mundialmente um esforço para que sejam iniciadas negociações de paz sem pré-condições. Agora tem o presidente da África do Sul que se juntou nesse esforço, com a concordância da Ucrânia de tentar mediar o diálogo. Isso deve jogar água no moinho da paz, se o Lula for bem sucedido. Acho que ele tem chance pela respeitabilidade”, avaliou.

Segundo o embaixador Mauricio Lyrio, o governo brasileiro trabalha para que a declaração final reflita a visão do Brasil a respeito da guerra entre Rússia e Ucrânia e da segurança alimentar no mundo.

“Como é uma declaração sobre segurança alimentar e há efeitos do conflito na Ucrânia sobre acesso a alimentos, uma referência inicial deverá ser feita ao conflito na Ucrânia. E, naturalmente, o governo brasileiro negocia essa linguagem, para que seja compatível com a linguagem que o Brasil tem usado sobre o tema, inclusive tem defendido na negociação de resoluções em diversas instâncias internacionais, como a própria ONU”.

Lula colocou o Brasil entre as nações que decidem os rumos do mundo.

Agenda em Hiroshima

No sábado, o presidente irá participar da reunião chamada: “Trabalhando para enfrentar crises múltiplas, incluindo alimentação, saúde, desenvolvimento e gênero”. E depois marcará presença na sessão intitulada: “Esforço comum em prol de um planeta sustentável e resiliente, incluindo, clima, energia e meio ambiente”. No domingo, Lula estará presente na sessão intitulada “Na direção de um mundo próspero, estável e pacífico” e de uma cerimônia de depósito de flores no Memorial da Paz de Hiroshima.

Além de participar da cúpula, o Brasil também terá encontros bilaterais com Japão, Índia e Indonésia. O governo brasileiro tenta uma reunião com o chefe da França, Emmanuel Macron. 

Lula se encontra com Fumio Kishida poucos dias após o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, participar do G7 Financeiro em Niigata, no Japão, e receber a demanda de empresários locais por um acordo comercial entre o país asiático e o Mercosul.

Autor