Como foi o esquema para fraudar o cartão de vacinação de Bolsonaro

Fatos trazidos à tona até agora mostram envolvimento de assessores do ex-presidente na adulteração de carteira de vacinação e colocam Bolsonaro no centro da crise

Bolsonaro e seu ex-ajudante de ordens, Mauro Cid. Foto: Secom

As informações obtidas pela Polícia Federal e tornadas públicas até o momento mostram a ação conjunta de aliados de Jair Bolsonaro — entre os quais seu ex-ajudante de ordem, Mauro Cid — para fraudar a carteira de vacinação do ex-presidente, de sua filha e de outras pessoas do grupo. Ao que tudo indica, e ao contrário do que Bolsonaro e seus aliados querem fazer parecer, ele tinha conhecimento e consentiu a investida. 

Ao autorizar a operação realizada nesta quarta-feira (3), o ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, destacou não haver indicação nos autos que “conceda credibilidade à versão de que o ajudante de ordens do ex-Presidente da República Jair Messias Bolsonaro pudesse ter comandado relevante operação criminosa, destinada diretamente ao então mandatário e sua filha L.F.B., sem, no mínimo, conhecimento e aquiescência daquele, circunstância que somente poderá ser apurada mediante a realização da medida de busca e apreensão requerida pela autoridade policial”. 

Ofício da Polícia Federal detalha todo o esquema usado para as adulterações, com a exposição de imagens e documentos sobre o caso. O texto aponta que “os elementos acostados nos autos evidenciaram que os investigados se associaram com o fim de praticar inserções de dados falsos relacionados à vacinação contra a Covid-19 nos sistemas SI-PNI e RNDS do Ministério da Saúde”. 

Ofício da PF detalha esquema

Tais condutas, segue o ofício, “tiveram como consequência a alteração da verdade sobre fato juridicamente relevante, qual seja, a condição de imunizado contra a Covid-19 dos beneficiários. Com isso, tais pessoas puderam emitir os respectivos certificados e utilizá-los para burlarem as restrições sanitárias vigentes”.

De maneira resumida e com base no que veio à tona até o momento, o esquema para fraudar as carteiras de vacinação contra a Covid-19 envolveu, entre outras, as seguintes ações:

  • Informações falsas sobre a vacinação de Bolsonaro, sua filha, Mauro Cid e a mulher deste, Gabriela Santiago Ribeiro Cid, entre outros, foram inseridas indevidamente no sistema do Ministério da Saúde;
  • A primeira tentativa de adulterar carteira de vacinação teria acontecido em novembro de 2021, segundo a PF, quando o coronel Mauro Cid tentou obter um documento para a esposa, Gabriela Cid, com dados de aplicação da cidade de Cabeceiras (GO);
  • A investida mais recente, após aquela tentativa fracassada, inclui o ex-presidente, sua filha e pessoas ligadas a ele. Os dados falsos sobre a suposta vacinação teriam sido inseridos no Sistema da Rede Nacional de Dados em Saúde pelo secretário de Governo de Duque de Caxias, João Carlos de Sousa Brecha, em 21 de dezembro de 2022. Foi nesse município que Cid havia conseguido o cartão de vacinação de sua esposa após aquela primeira tentativa;
  • As vacinas de Bolsonaro teriam sido aplicadas nos dias 13 de agosto e 14 de outubro de 2022 no Centro Municipal de Saúde de Duque de Caxias, mas foram inseridas no sistema meses depois, pouco antes de Bolsonaro e sua filha irem para os Estados Unidos;
Dados da suposta vacinação do ex-presidente, contidos em documento da PF
  • No dia 27 de dezembro, a suposta vacinação de Bolsonaro foi apagada do registro, sob a justificativa de “erro” pela servidora Cláudia Helena Acosta Rodrigues da Silva. A vacinação que supostamente teria sido feita em outros assessores permaneceu no sistema; 
  • De acordo com a Controladoria Geral da União (CGU), seria impossível Bolsonaro ter tomado o primeiro imunizante em Caxias, já que naquele dia ele concedeu uma entrevista no Rio, pela manhã, foi à Marcha para Jesus à tarde e voltou a Brasília à noite;
  • No caso da segunda dose, Bolsonaro esteve em Caxias pela manhã e foi para Belo Horizonte às 13h40. Ainda segundo a CGU, “não há nenhum indicativo” de que o ex-presidente tenha se vacinado naquele dia, “fato que se tivesse ocorrido seria amplamente noticiado, considerando sua notoriedade”;
  • De acordo com a Polícia Federal, um “usuário associado ao ex-presidente” emitiu certificado de vacinação contra a Covid pelo aplicativo ConecteSUS nos dias 22, 27 e 30 de dezembro, data em que Bolsonaro embarcou rumo aos EUA. Segundo as investigações, os dois primeiros acessos foram realizadas de um computador do Planalto e o terceiro pelo telefone de Mauro Cid.

Informações sobre a vacinação do ex-presidente estavam sob sigilo de até 100 anos, conforme decretado por Bolsonaro em janeiro de 2021. Em fevereiro de 2023, a CGU abriu investigação após receber denúncia de aculturação da carteira de vacinação do ex-presidente. No dia 13 de março deste ano, a CGU retirou o sigilo e em 3 de maio, a PF fez a Operação Venire. 

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Com agências