Barroso critica era Bolsonaro: “Tivemos um retrocesso civilizatório”

Para ministro, “prolongado período de descrédito das instituições – em que se extraiu o pior das pessoas em termos de ódio e agressividade – desaguou no 8 de janeiro”

Foto: Roberto Jayme/TSE

O nome do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) não foi citado nominalmente na entrevista concedida pelo ministro Luís Roberto Barroso ao Valor Econômico e publicada nesta terça-feira (2). Mas foram os vários os momentos em que Barroso, próximo presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), disparou críticas ao legado bolsonarista.

Uma das respostas do ministro deixa clara a condenação aos quatro anos sob a era Bolsonaro. Questionado sobre eventuais avanços na relação com o Executivo após a posse do presidente Lula, Barroso não atenuou. “Infelizmente, no passado, nós tivemos um retrocesso civilizatório. Ninguém deve achar que isso é normal”, afirmou.

“Na vida, a integridade vem antes da ideologia”, agregou o magistrado, elogiando a postura de Lula. “As relações entre o Judiciário e o Executivo devem ser relações institucionais de respeito mútuo. Meu sentimento é que as coisas estão se passando dessa forma.”

Esse legado de Bolsonaro acabou por ecoar, segundo Barroso, no golpe de 8 de Janeiro, em Brasília. Naquela data, mais de mil apoiadores do ex-presidente invadiram e depredaram sedes dos 3 Poderes, a exemplo do próprio STF.

“O prolongado período de descrédito das instituições – em que se extraiu o pior das pessoas em termos de ódio e agressividade – desaguou no 8 de janeiro”, declarou. “Claro que você tem pessoas que vivem as narrativas falsas, que cultivam a mentira e querem dizer que foi coisa de gente infiltrada. Mas sabemos quem estava lá – pessoas que não aceitaram o resultado das eleições e estavam pedindo o golpe de Estado, o que é crime”.

Barroso afirma que o mero apoio às ações golpistas, mesmo que à distância, é intolerável: “Estamos lidando com pessoas que cometeram crime, seja pedindo a ruptura violenta da ordem democrática, seja depredando o patrimônio público. Ninguém em sã consciência pode apoiar aquilo, não importa se conservador ou liberal”.

Nesse ponto, ele ataca em particular os bolsonaristas que ainda questionam as urnas eletrônicas, base do processo eleitoral no Brasil desde 1996. “Essa ideia de que houve fraude nas eleições é uma obsessão pela mentira. O processo foi todo transparente. Estiveram lá dentro a Polícia Federal, o Ministério Público, as Forças Armadas, as universidades, os organismos estrangeiros – e ninguém foi capaz de detectar fraude.”

A saída, de acordo com o ministro, é denunciar as mentiras e punir os crimes. “As pessoas precisam passar por um processo de ‘desobsessão’ da mentira, aceitar o resultado eleitoral e se preparar para competir na próxima eleição”, diz ele.

Com relação aos denunciados, Barroso defende a concentração dos processos no STF. “Quem conduz essas ações é o ministro Alexandre de Moraes. Mas a mim parece natural que, sendo os mesmos fatos, os julgamentos devem ser únicos. Se distribui para as instâncias inferiores, haverá uma fragmentação dos processos e uma multiplicidade de decisões”.

Barroso também explicou seu voto a favor da constitucionalização da contribuição assistencial para os sindicatos e explicou as diferenças para o imposto sindical. “O Supremo continua a entender que a contribuição sindical não pode ser imposta, pois, por lei, é facultativa. Em segundo lugar, o STF mantém a posição de que a contribuição confederativa para centrais de trabalhadores também é facultativa”, disse.

“A contribuição assistencial é uma terceira modalidade, ajustada em caso de negociação coletiva entre o sindicato dos empregados e o patronal. Nós queremos incentivar a negociação coletiva”, justificou-se. “A contribuição assistencial não é compulsória. Se o trabalhador não quiser contribuir, basta não aderir ao acordo.”

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