Volkswagen deixa negociação sobre trabalho escravo e caso pode ir à Justiça

Denúncia envolve ao menos 14 trabalhadores explorados de forma análoga à escravidão em propriedade da empresa alemã em Santana do Araguaia, no Pará, nos anos 1970 e 1980

Antigos trabalhadores são ouvidos pela equipe do MPT. Foto: Divulgação/MPT

Após a montadora alemã Volkswagen decidir deixar as negociações em torno da reparação pleiteada pelo Ministério Público do Trabalho devido à exploração de mão de obra análoga à escrava nos anos 1970 e 1980, em Santana do Araguaia (PA), o caso deverá ser encaminhado à Justiça, segundo o MPT. 

A mesa de negociação envolvia o pagamento de indenização total no valor de R$ 165 milhões aos 14 trabalhadores identificados como vítimas, às centenas de outros escravizados que teriam que ser localizados para serem indenizados e às famílias daqueles que foram assassinados segundo relato dos trabalhadores. 

As ocorrências aconteceram em uma propriedade da montadora, em Santana do Araguaia, no Pará. A saída da Volkswagen das negociações ocorreu no final de março. As violações foram levadas em 2019 ao MPT pelo padre Ricardo Rezende, que integrou a Comissão Pastoral da Terra naquela região quando os casos ocorreram.

Segundo apurou a Agência Brasil, os depoimentos colhidos na ação dão conta de que trabalhadores viviam no local em situação degradante de trabalho, submetidos à violência e a violações de direitos humanos. 

As investigações demonstraram que tais violações incluíam falta de tratamento médico nos casos de malária, impedimento de saída da fazenda em razão de vigilância armada ou de dívidas contraídas – o que caracterizaria servidão por dívidas –, alojamentos em locais insalubres, sem acesso à água potável e com alimentação precária.

Segundo o procurador do trabalho responsável pelo caso, Rafael Garcia, “conseguimos levantar vários documentos e depoimentos de trabalhadores da época que foram escravizados e que comprovam que durante as décadas de 70 e 80, naquela fazenda, conhecida como fazenda Volkswagen, na atividade de desmate e da constituição de pasto foram utilizados centenas de trabalhadores, todos eles numa condição semelhante à de escravos”. Ele ressaltou que a fazenda foi dada à Volkswagen pela ditadura militar e que foi desmatada ali uma área correspondente ao município de São Bernardo do Campo.

Ainda de acordo com o depoimento do procurador à Agência Brasil, os trabalhadores viviam sob vigilância armada de pistoleiros e eram “submetidos a tortura física e psicológica porque dormiam ao relento em barracões improvisados sem qualquer tipo de assistência médica e muitos adoeciam de malária. Os trabalhadores contam que as tentativas de fuga eram castigadas por esses pistoleiros, e inclusive há trabalhadores que foram mortos, segundo relatos dos trabalhadores, dentro da fazenda”, relatou o procurador. 

Para o procurador, além do valor destinado às vítimas, a empresa deve pagar reparação à sociedade, uma vez que recebeu incentivos fiscais do poder público na época, totalizando R$ 700 milhões em valores atuais, para gerir seu negócio de criação de gado. 

A empresa alemã é conhecida também por sua colaboração com o regime militar. Entre as condutas estão, por exemplo, permitir a prisão de funcionários no interior de suas unidades; perseguir trabalhadores por atuação política e sindical; produzir informações para encaminhamento aos órgãos de repressão; colaborar financeiramente com o regime e permitir práticas de tortura na sede da montadora.

Leia também: As digitais da Volks nas torturas da ditadura

Com informações da Agência Brasil

(PL)

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