Foro de SP volta a se encontrar em junho no Brasil, sob signo da vitória

Encontro em Brasília ocorre no momento em que a esquerda governa 10 países latino-americanos

São Paulo - Presidente Lula discursa durante ato político em comemoração aos 15 anos do Foro de São Paulo, em 2005. Foto Ricardo Stuckert/PR

O Foro de São Paulo, entidade que reúne partidos de esquerda latino-americanos, deverá fazer em Brasília sua primeira reunião presencial, desde a pandemia no final do mês de junho. As expectativas são de um evento de dimensões inéditas, de acordo com o comentário ao Portal Vermelho de Ana Prestes, secretária de Relações Internacionais do PCdoB.

“Esse vai ser um encontro muito importante depois de 2019, que foi o último encontro presencial em Caracas (Venezuela). Vai ser o primeiro após a pandemia, com expectativa de público muito qualificado e também em grande quantidade, com uma agenda bastante intensa”, antecipou a dirigente do PCdoB.

Aos 32 anos de articulação, o organismo internacionalista dos partidos de esquerda obtém um alcance excepcional com vitórias eleitorais em 10 países do continente. Para além da primeira onda rosa da América Latina, quando governos progressistas se espalharam pelos vizinhos do Brasil, grandes economias como Colômbia e México se agregam ao debate, agora.

O grupo, que tem como secretária-executiva a dirigente petista Mônica Valente, teve uma reunião de trabalho no último final de semana na Colômbia para discutir detalhes do encontro, visto como a retomada do Foro. Com a ascensão da extrema-direita no Brasil, com Bolsonaro, o organismo perdeu sua dimensão maior de integração continental.

Segundo Ana Prestes, mesmos em tempos de pandemia, o Foro nunca deixou de se reunir online. Além de todos os partidos membros, o evento em Brasília promete reunir chefes de estado, lideranças partidárias, não apenas da América Latina, mas da Europa, Ásia e África, como também da América do Norte, EUA e Canadá.

“Vai ser uma agenda muito forte sobre integração latino-americana. Agenda desse novo momento de ascensão de partidos de esquerda e progressistas aos governos da América Latina. vai ser uma avaliação sobre o período pandêmico e seus efeitos, e as lutas necessárias para que não se repita a tragédia humanitária que foi a pandemia para a América Latina”, afirmou Ana.

Ela também apontou os temas geopolíticos centrais do interesse do continente: muita discussão sobre conjuntura global, guerra na Ucrânia e relação da América Latina com a China. “Um mundo caminhando para a transição à multipolaridade”, concluiu.

O mapa das vitórias progressistas no continente inclui o Peru, que vive uma crise política, após o afastamento de Pedro Castilho do poder.

Novos desafios

Quando foi criado, na década de 1990, as principais pautas do Foro de São Paulo eram o combate às políticas neoliberais impulsionadas pelos Estados Unidos, a redemocratização dos países que recém abandonavam as ditaduras militares, fortalecimento das lutas populares e iniciativas que contribuiriam com a chegada dos partidos de esquerda ao poder.

Três décadas depois, o balanço é de que parte desses propósitos do Foro mantém vigência, num cenário ainda mais complexo de crise do capitalismo em nível mundial, guerra na Ucrânia e a política de contenção da China pelos EUA. 

No continente, prossegue a instabilidade política no Peru, que derrubou o governo de esquerda de Pedro Castilho. O tema da democracia ganhou centralidade, conforme os golpes institucionais vão se tornando regra em países como o Brasil, o Paraguai, o Equador, a Argentina e o Peru. Inflação e desemprego também ameaçam a governabilidade destes países, enquanto a Venezuela, a Nicarágua e Cuba sofrem efeitos de sanções e bloqueios econômicos pelos EUA.

Por outro lado, mecanismos de integração regional criados na primeira onda de governos de esquerda, como a Unasul (União das Nações Sul-americanas) e a Celac (Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos), devem ocupar nova centralidade no debate. O Brasil havia deixado a Unasul em 2019, durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL), mas volta agora com no terceiro governo Lula.

Lula começou seu governo com a proposta de uma conferência regional para discutir a Amazônia. Este é um tema caro ao novo governo brasileiro, que servirá ao propósito de integrar países como Peru, Bolívia, Equador, Colômbia, Venezuela, Suriname e Guianas.

Papel do FSP

O Foro de São Paulo reúne partidos e organizações da América Latina e o Caribe. Surgiu em 1990, fruto da articulação política do cubano Fidel Castro, e do então dirigente do Partido dos Trabalhadores (PT), Luiz Inácio Lula da Silva.

A construção foi liderada pelo Partido Comunista de Cuba (PCC), a Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN), da Nicarágua, e o Partido dos Trabalhadores (PT), do Brasil. O debate partia do enfrentamento à crise do socialismo soviético e ascensão do neoliberalismo. 

O primeiro encontro ocorreu no dia 4 de julho de 1990, em São Paulo. Na época, foi considerado o maior evento de partidos e movimentos populares do continente americano.

Atualmente o Foro possui 120 partidos membros. Do Brasil, além do PT, participam o PDT, o PCdoB, o PCB, o PSB e o PPS.

Embora seja apenas um mecanismo de concertação entre os partidos e movimentos sociais, o FSP é frequentemente utilizado pela extrema-direita e o liberalismo conservador para fazer guerra ideológica. O bolsonarismo utilizou do tema para criar uma caricatura conspiratória comunista, enquanto a imprensa conservadora procura destacar nuanças esquerdistas de cada país para tentar afastar governos moderados do organismo. As vitórias de esquerda e desmontes de partidos tradicionais de direita mostram que os ataques tem pouco efeito.

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