Proposta das centrais para valorizar o salário mínimo joga pressão em Lula

Para os sindicalistas, reajustes condicionados apenas à inflação e à variação do PIB se tornaram insuficientes

As centrais sindicais querem arrancar do governo Lula (PT) um compromisso histórico em relação ao salário mínimo. Proposta elaborada pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) mostra um caminho audacioso, mas viável para recompor o valor do piso salarial dos trabalhadores brasileiros em médio e longo prazo. O documento, de 16 páginas, foi apresentado ao ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, nesta segunda-feira (3).

Segundo os sindicalistas, é preciso compensar não apenas as perdas acumuladas sob os governos Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL) – mas toda a defasagem imposta em mais de sete décadas. Se desde sua criação, em 1940, o salário mínimo fosse reajustado conforme as inflações anuais, seu valor hoje deveria ser de R$ 2.441,38.

O mínimo real, porém, está 87,5% abaixo desse patamar. Em 1º de janeiro, houve um aumento no piso de R$ 1.212 para R$ 1.302. Lula já anunciou um novo reajuste – o segundo no ano –, que será efetivado em 1º de maio, elevando o valor para R$ 1.320.

A política de valorização do salário mínimo instituída por Lula em 2003 previa aumentos com base em dois fatores: a reposição da inflação do período (de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor, o INPC) e o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) nos dois anos anteriores. O modelo ajudou a garantir o mais longo ciclo de fortalecimento do mínimo – o ganho real (acima da inflação) foi de 77,01% entre 2003 e 2017, segundo o Dieese.

As centrais propõem que, nos próximos três anos da gestão Lula, o aumento seja ainda mais robusto. Para isso, ano a ano, o governo deve somar três variáveis: a inflação, o crescimento do PIB de dois anos antes e um adicional de 2,40%. A crer nas projeções divulgadas pelo Banco Central, por meio do Boletim Focus, essa política garantiria uma valorização real média de 4,2% no triênio 2024-2026.

Adilson Araújo, presidente da CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), diz que o empobrecimento da população e a carestia obrigam um governo popular a ousar mais. “Não há como conceber que se mantenha a vigência de uma política que já de um bom tempo não garante as condições mínimas de vida digna das pessoas ou da sua própria família”, afirma o sindicalista. Reajustes condicionados apenas à inflação e à variação do PIB se tornaram insuficientes.

Adilson lembra que, conforme o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), o “salário mínimo necessário” para um brasileiro, em fevereiro, seria de R$ 6.547,58. “Com a elevada carestia dos alimentos, somente em São Paulo, 60% do salário mínimo é consumido pela cesta básica, calculada em fevereiro em R$ 779,38”, exemplifica.

As centrais também querem instituir um novo marco para a valorização do mínimo após o governo Lula. Essa política permanente teria vigência até 2053, baseada em quatro pontos: variação do INPC anual; aumento real equivalente à variação do PIB de dois anos anteriores; estabelecimento de um “piso” para o aumento real de 2,40% ao ano; e eventual revisão dos parâmetros da política a cada dez anos.

Com a proposta, as centrais jogam pressão no governo Lula. “Há acordo e entendimento do governo de que é preciso retomar a política de valorização do salário mínimo”, afirmou Luiz Marinho. “Vou me apropriar da proposta de vocês e, após o retorno do presidente Lula e comitiva que viajarão à China, em 11 de abril, retomaremos e daremos continuidade às conversas”, acrescentou o ministro.

A reunião foi avaliada de forma positiva pelas centrais. “Aumentar o valor piso nacional ê uma forma de distribuir renda”, declarou Miguel Torres, presidente da Força Sindical, defendendo uma política permanente. Sérgio Nobre, presidente da CUT, endossou: “Precisamos fazer o País voltar a crescer de maneira vigorosa, com geração de empregos de qualidade. A base para isso vai ser a injeção de recursos no bolso do próprio trabalhador, para ele consumir, a indústria produzir e os empregos aparecerem.”

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