Governo Lula discute criação do Bolsa Família Indígena

Sem anúncio oficial, reportagem do BdF diz que a intenção é derrubar barreiras burocráticas de acesso e atender especificidades regionais.

Lula no acampamento Terra Livre de 2022 | Foto: Mídia Ninja

O governo Lula (PT) está discutindo internamente a criação do Bolsa Família Indígena. Segundo reportagem do Brasil de Fato (BdF), publicada nesta quinta-feira (16), a intenção não é criar outro benefício social, mas flexibilizar o calendário de pagamento e derrubar barreiras burocráticas de acesso ao programa. O anúncio não é oficial.

Caso se concretize, as mudanças poderão beneficiar famílias indígenas que vivem em comunidades distantes de centros urbanos, no interior da Amazônia, e que precisam fazer longas e caras viagens para sacar o dinheiro. A proposta está em um ofício da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) obtido com exclusividade pelo BdF.

Juci Carneiro, gestora territorial indígena do povo Macuxi que atua junto a organizações indígenas de Roraima, diz que as mudanças podem corrigir o problema enfrentado pelas famílias indígenas desde 2003, quando o Bolsa Família foi criado.

“Há comunidades que só têm acesso por via aérea, outras apenas por via fluvial. No período de estiagem, quando os rios estão baixos, fica mais difícil ainda. Então os custos são altíssimos”, explica Juci Carneiro.

Isso porque para ir aos centros sacar as parcelas, os indígenas gastam com combustível e alimentação o que acaba deixando a viagem mais cara do que o próprio valor do Bolsa Família. “E o parente geralmente não vai para a cidade sozinho. É um hábito cultural se deslocar com a família, então o custo aumenta ainda mais. Nem sempre o valor a ser recebido compensa o gasto que vai ter nesse deslocamento. Por isso a quebra do calendário é importante”, diz a gestora territorial indígena.

Por esse motivo, a principal medida proposta pela Funai é que o prazo para sacar os benefícios sociais aumente de 120 para 180 dias. Em uma segunda etapa, o órgão indigenista sugere que o período seja estendido ainda mais, para 270 dias, com o aval do Congresso.

Outro ponto em discussão é para que o saque ocorra de maneira independente do dia previsto no calendário de pagamentos – hoje vinculado ao Número de Identificação Social (NIS) dos beneficiários.

O Bolsa Família Indígena não foi anunciado publicamente pelo governo federal. Antes de oficializar a mudança das regras, a Funai aponta no ofício a necessidade de consultar os povos e organizações indígenas, conforme prevê a convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Problemas com estadia

Com aumento do prazo e flexibilidade no calendário, o Bolsa Família Indígena pode solucionar o problema da permanência de famílias em cidades que não têm estrutura para recebê-las. Para dificultar ainda mais, é comum não haver cédulas disponíveis para saque nas agências.

“Muitas vezes falta dinheiro na sede do município. Então o parente acaba tendo que esperar dias, quando o plano dele era voltar para casa no final da tarde. E aí falta um lugar para ficar, falta assistência. Os municípios não têm um espaço para receber as pessoas”, diz Macuxi.

Segundo a reportagem, é comum que mães com crianças passem até um mês nessas condições, por falta de dinheiro para retornar à aldeia.

Combate a retenção de cartões por terceiros

Outro problema enfrentado pelos indígenas diz respeito a retenção do cartão benefício social por parte dos comerciantes. Isso acontece quando o indígena precisa de um serviço ou mercadoria com urgência, mas não pode esperar na cidade até a data do saque. Com um calendário flexível esse problema seria solucionado.

“O parente vai até a cidade, mas ainda não está no prazo do saque, ou então o dinheiro não está disponível no banco. Então ele pega, por exemplo, um alimento ou uma peça para fazer manutenção do barco, que equivalem ao valor do benefício. E o comerciante fica com o cartão e as senhas”, descreve a gestora indígena.

Para corrigir o problema, a Funai apontou a necessidade de criar o programa “Comerciante Legal”. Nela, Juci Carneiro sugere que as compras possam ser feitas diretamente no cartão, sem a necessidade de saque.

Além do Bolsa Família Indígena, a Funai sugeriu adequações ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) para contemplar as particularidades geográficas e culturais dos povos indígenas. Por meio deste programa, o governo federal compra alimentos de pequenos produtores, incluindo quilombolas e indígenas.

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com informações do Brasil de Fato

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