Mortalidade infantil yanomami supera a pior do mundo

Piores números foram verificados em 2020, mas podem ter piorado, conforme o garimpo desmontou as unidades de saúde, deste então.

Crianças desnutridas atendidas na unidade de saúde Surucucu, na Terra Yanomami (RR) Imagem: Antonio Alvarado/@antonioalvaradoc/Urihi Associação Yanomami

A mortalidade de bebês yanomamis antes de completarem um ano de idade alcançou 114,3 a cada mil nascidos em 2020. O dado consta no relatório Missão Yanomami, do Ministério da Saúde, que visitou o território em janeiro e trouxe relato meticuloso de como funcionam as unidades de saúde da região. A visita ocorreu, justamente depois do governo ser informado da morte de três crianças no final de dezembro por falha do serviço de atendimento.

A taxa é muito superior à registrada em Serra Leoa, país na África que tem o maior índice do mundo, segundo ranking da ONU. Lá, a estimativa é de 78,2 mortes a cada mil nascimentos por ano. No entanto, o relatório admite que os números de 2021 e 2022 podem ser revisados, devido a problemas de notificação e protocolo nas unidades de saúde.

Apesar de elevadíssima, a taxa deve estar subnotificada, já que existem áreas yanomamis que ficaram desassistidas porque foram tomadas por garimpeiros. As unidades de saúde foram desmontadas e viraram depósitos.

O relatório observa que, entre 2018 e 2022, o maior registro de óbitos ocorreu
em 2020, com 332 mortes, e apresenta uma taxa de mortalidade de 10,7 para cada 1.000
habitantes. Nesse mesmo período foram registrados 505 óbitos em menores de um
ano de idade.

Segundo o documento da Saúde, as principais causas para a elevada taxa foram:

  • Doenças preveníveis;
  • Falta de acompanhamento pré-natal pelas mães;
  • Falta de assistência médica e remoção aos indígenas;
  • Desnutrição materna e infantil;

Em 2020, morreram 126 bebês antes de completarem um ano. Ainda não há dados completos de 2021 e 2022, o que impede uma comparação. Esses números já eram alarmantes e foram comunicados ao Governo Federal, inclusive com diversas ações judiciais que não tiveram resposta adequada.

A taxa entre os yanomamis sempre foi maior do que a média do total registrado entre povos indígenas no país, mas essa diferença cresceu.

Segundo o Condisi (Conselho Distrital de Saúde Indígena), pelo menos cinco das 78 unidades no território yanomami foram desativadas por esse motivo. Com cada desativação, dezenas de aldeias são desassistidas, o que torna inviável registrar adoecimentos e mortes.

Pista do Jeremias, Homoxi, onde garimpeiros tomaram o posto de saúde em 2022 - Bruno Kelly / HAY - Bruno Kelly / HAY
Pista do Jeremias, Homoxi, onde garimpeiros tomaram o posto de saúde em 2022. Imagem: Bruno Kelly / HAY

Causas

Segundo o relatório, as principais causas de óbito são por “agravos preveníveis”. Contudo, o documento cita que as unidades não relatam no registro da morte o agravante principal, que seria a desnutrição.

Somente em 2022, entre janeiro e setembro, foram registradas 99 mortes de crianças menores de cinco anos por causa evitável, sendo 67 menores de um ano.

Ao longo dos anos, a frequência de baixo peso cresceu de 49,3%, em 2015, para 56,5% das crianças em 2021. Em algumas comunidades essa frequência chegou a 80% em 2022, como em Paapiu.

Criança desnutrida no chão da Casa de Atendimento Indígena, em Boa Vista. Imagem: Tom Costa Ministério da Justiça e Segurança Pública

Desnutrição se agrava

No que se refere ao manejo da desnutrição grave, o relatório cita que “não há cuidado em relação ao risco de Síndrome de Realimentação.” Esta é uma complicação que ocorre normalmente após um jejum prolongado de quem está desnutrido.

As mortes também ocorrem por falta de assistência. O relatório cita que três crianças de diferentes comunidades do território indígena que necessitavam de transporte aéreo morreram entre 24 e 27 de dezembro do ano passado. Duas delas eram menores de um ano.

Como já denunciado, o documento ratifica que houve, nos últimos anos, falta de profissionais de saúde e de remédios, que agravou ainda mais a situação sanitária.

Sem assistência de saúde, o relatório ainda cita que a cobertura vacinal de crianças vem caindo ao longo dos anos. De 80% de cobertura vacinal em 2018, caiu para 53% em 2022.

A verificação de malformação congênita e doenças da mãe.

Segundo o relatório, o baixo peso nas gestantes atingiu 46,9% delas em 2022. A desnutrição pode causar problemas no sistema de defesa e perdas de massa muscular e gordura. O criança já nasce prejudicada se a mãe não se nutriu bem, ou seja, ficou sem vitamina, sem proteína e até intoxicada.

O relatório conclui com recomendações pontuais para cada uma das unidades de saúde verificadas, assim como sugestões gerais para enfrentamento geral da situação.