Visibilidade Trans: artista denuncia assassinatos pelo mundo

Manauara Clandestina é a artista que já expôs pelo mundo a existência jovem de travestis e transexuais no Brasil, como forma de denunciar a baixa expectativa de vida.

Manauara Clandestina

A artista plástica trans Maria Letícia Manauara Clandestina viaja com sua exposição de polaroids de pessoas trans pelo mundo. Na exposição “Por enquanto 35”, ela denuncia a idade máxima que essas jovens podem chegar no Brasil, sem serem mortas. A expectativa de vida na média geral da população é de 75 anos. Embora essa população tenha cada vez mais visibilidade positiva na sociedade, esse é o dado sombrio do Dia Nacional da Visibilidade Trans, 29 de janeiro. 

No ano de 2022, foi monitorado pela Rede Nacional de Pessoas Trans do Brasil (Rede Trans Brasil) que houve 118 mortes violentas no país. Em números absolutos, o estado do Ceará foi o estado com mais registros de assassinatos desse tipo, seguido de Pernambuco. A Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) calculou 131 assassinatos e 20 suicídios.

Em 2022, a média de idade das pessoas trans assassinadas foi de 26 a 35 anos, sendo que a vítima mais jovem tinha 15 anos de idade. Quase 80% das vítimas eram pretas e pardas, a maior parte profissionais do sexo. Houve ainda 33 casos de tentativas de homicídio e 96 casos de violações de Direitos Humanos como proibição do uso do banheiro, agressão física e violência política de gênero. E a instituição brasileira que mais tem atuação hoje na proteção dos direitos humanos das pessoas trans no país é a Defensoria Pública. Mas isso pode mudar.

Debaixo do tapete

Há muita subnotificação e nenhum estatística oficial. Não existe interesse dos órgãos de Segurança Pública no Brasil em identificar se um crime cometido ocorreu contra uma pessoa travesti ou transexual, ou sequer gay ou lésbica, nem se sua identidade sexual ou de gênero foi o motivo do crime.

Mesmo com essa enorme subnotificação de casos, o Brasil é o país que lidera no mundo o índice de assassinatos de pessoas travestis e transexuais. Somos seguidos pelo México e a Colômbia. Este recorde constrangedor faz com que as polícias e governos evitem levantar os números exatos.

A maior parte das vítimas são mulheres trans e travestis, com aumento dos casos de violência doméstica, ou seja, causada por entes afetivos e familiares. Em relação à apuração dos fatos, percebe-se uma omissão do Estado frente a estes casos, quando não culpabilizam a própria vítima pelo seu assassinato.

Multiartista

Filha de pastores missionários da Assembleia de Deus, foi justamente dentro de um templo religioso que Manauara Clandestina começou, ainda na infância, a desenvolver atividades de canto, dança e teatro na igreja: “Apesar de sua estrutura opressora para pessoas LGBTs, a igreja foi o lugar que me acolheu em relação à arte. Meus pais também foram os grandes influenciadores para que isso acontecesse, mas a igreja foi um espaço fértil para uma criança que precisava de informações”.

“Por enquanto 35” é fruto de uma residência artística que Manauara ganhou em Londres, do Instituto Inclusartiz. O suporte das polaroids foi escolhido por serem imagens que vão se apagando com o tempo. Mas, enquanto existem, revelam a beleza e vitalidade dessas mulheres que buscam expressar sua beleza e originalidade única para o mundo. Também afirmam a vontade de ultrapassar a expectativa média de vida imposta pela violência. Manauara é artista residente do Piramidón – Centre d’Art Contemporani, em Barcelona.

As polaroids de Por Enquanto 35, de Manauara Clandestina

A artista também tem seu percurso na moda, que ela também usa como suporte para falar de suas vivências afetivas. Foi a partir de um convite da estilista Vicenta Perrotta para ser modelo das suas criações que ela começou a explorar essa possibilidade. Manauara assinou a direção criativa de diferentes desfiles da estilista, que resultaram em grandes performances dominadas principalmente por travestis negras. Uma de suas exposições é feita com roupas feitas de retalhos.

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