Tuberculose está entre principais ameaças no território Yanomami

A chegada repentina é como um anúncio daquilo que os profissionais locais falam desde que a força tarefa começou: a situação em campo está muito pior.

Força Nacional do SUS reforça atendimentos na Casai em Boa Vista | Foto: reprodução/saúde.gov

A crise humanitária instaurada nos territórios Yanomami está longe de acabar. Isso porque antes de encerrar os atendimentos nesta quarta-feira (25), os médicos e enfermeiros da Força Nacional do Sistema Único de Saúde (FN-SUS) atenderam quatro pessoas com suspeita de Tuberculose. Mas esses não são os primeiros pacientes com suspeita da doença. Na verdade, existe uma estrutura inteira dentro da Casai (Casa de Apoio à Saúde Indígena), em Boa Vista (RR), resguardada apenas para pessoas com esse quadro, que é altamente contagioso.

No entanto, a chegada repentina é como um anúncio daquilo que os profissionais locais falam desde que a força tarefa começou: a situação em campo está muito pior.

“Amanhã nosso assunto será tuberculose”, disse o médico emergencista Antonio Cedrim, de 45 anos, à equipe de reportagem do Ministério da Saúde após avaliar os casos. Profissional do SAMU e voluntário experiente nas missões da Força Nacional do SUS, Cedrim falou sobre as principais dificuldades encontradas no primeiro dia de missão e salientou que, mesmo com a prevalência de doenças endêmicas como a malária, a tuberculose causa muita preocupação.

“O que me chamou mais atenção mesmo são os pacientes que estão aqui em tratamento de Tuberculose, e a gente sabe que já saíram da fase de ser transmissores ativos, mas em coletas de histórias e anamnese desses pacientes a gente pôde perceber que muitas vezes são casos de má adesão ao tratamento que muitas vezes não foi seguido de forma adequada”.

O médico explicou que uma das dificuldades é que os pacientes indígenas precisam ser convencidos a tomar os remédios e serem monitorados para que não abandonem o tratamento antes do término, o que muitas vezes atrasa o processo de alta e faz com que famílias inteiras permaneçam na Casai, contribuindo para a superlotação do local.

Desnutrição

Há muito se tem falado que a invasão do garimpo ilegal ameaça a saúde dos indígenas, uma vez que o mercúrio contamina os rios e o barulho das máquinas espanta os animais. Além disso, o contato com o homem branco também é responsável pelo contágio de doenças que podem ser fatais para eles, como gripe e a Covid-19. A junção desses dois fatores diz muito sobre o estado de desnutrição em que os indígenas foram encontrados.

Ao Estadão, Olivia Yanomami, de aproximadamente 25 anos, explica o drama na região de Surucucu, dentro da reserva. “Muitos estão morrendo de fome. Estão muito magros”, disse ela com o filho caçula no colo – só pele e osso, com tosse insistente e feridas na cabeça, aparentemente por uma infecção. Olivia estava acompanhada das duas filhas mais velhas, também crianças.

Segundo ela, na reserva Yanomami, onde vivem cerca de 30,4 mil indígenas, a terra já não é mais fértil para fazer a roça do seu povo e é difícil encontrar animais durante a caça. “Banana tem nada, macaxeira tem nada, milho tem nada, cana tem nada, mamão tem nada”, disse. Mesmo doações de cestas básicas têm efeito limitados. A dieta dos Yanomami é baseada, principalmente, em mandioca, frutas, caça e pesca. “Não come arroz, macarrão, come farinha”, diz Olivia.

Os quadros de desnutrição grave são visíveis. E isso não acomete só as crianças, explica o enfermeiro Bruno Lopes, de 32 anos, voluntário pela primeira vez em uma missão da FN-SUS. “O atendimento que mais me impressionou até agora foi de uma mãe que estava amamentando, mas pesava pouco mais de 27 kg”.

O enfermeiro Bruno Lopes em atendimento a paciente indígena | Foto: Igor Evangelista/MS

Lopes, que também é enfermeiro na UTI em um hospital de Montes Claros (MG), está acostumado a lidar com situações extremas. Ele repete, porém, o que tem sido o mantra de todos os colegas: nada do que viveu na vida pessoal ou profissional o preparou para a situação encontrada em Roraima. Ainda assim, a resposta que deu quando questionado pela equipe de reportagem da Saúde sobre o motivo que o levou a aceitar participar da missão, diz muito sobre os profissionais que aceitam o chamado da FN-SUS.

“Mesmo que eu não tivesse noção de como as coisas seriam aqui, foi a relevância da causa humanitária que mais pesou para que eu aceitasse essa missão. Acredito que o trabalho que estamos realizando tem uma grande importância”, finaliza.

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com informações de agências

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