Lula troca general no comando do Exército

O general Tomás Paiva é conhecido por sua defesa do respeito à democracia e ao resultado das eleições e será o novo comandante no lugar de Júlio César de Arruda.

Em menos de um mês, o comando do Exército troca de Marco Antônio Freire Gomes, para Júlio Cesar de Arruda e Tomás Ribeiro Paiva, em meio a série de controvérsias golpistas envolvendo militares.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) demitiu, neste sábado (21), o comandante do Exército, general Júlio Cesar de Arruda. No lugar dele, à frente da corporação, assumirá o também general Tomás Miguel Ribeiro Paiva. Paiva foi chefe de gabinete do general Eduardo Villas Bôas, que comandou o Exército durante o governo de Dilma Rousseff e no governo Temer.

Paiva foi destaque de noticiários durante a semana depois de, na quarta-feira (18), ter feito declarações incisivas contra os atos de terrorismo às sedes dos Três Poderes, em Brasília. Em sua fala, ele cobrava respeito ao resultado das eleições de outubro. “Democracia pressupõe liberdade, garantias individuais […] e alternância do poder”, disse o então comandante militar do Sudeste.

Arruda, por sua vez, foi empossado ainda em 30 de dezembro, durante o governo Jair Bolsonaro, em um acerto com a equipe de transição para que a troca do comando ocorresse antes da posse do novo governo.

Um dia antes da mudança, Lula realizou a primeira reunião com os chefes das Forças Armadas, desde 8 de janeiro, onde teriam sido discutidos os atentados contra a democracia, em Brasília. Segundo expôs reportagem do jornal americano Washington Post, baseado em fonte do alto escalão do governo, o general Arruda impediu prisões de bolsonaristas acampados no Quartel General do Exército em Brasília após os atos. Ele teria dito ao próprio ministro da Justiça, Flávio Dino, “Vocês não vão prender gente aqui”.

Trajetória

O paulistano Tomás Paiva começou a trajetória militar em 1975, em Campinas (SP). Ele foi Subcomandante do Batalhão de Infantaria de Força de Paz no Haiti e comandante da Força de Pacificação dos Complexos da Penha e do Alemão, no Rio de janeiro em 2012.

Em Brasília, atuou no comando do Batalhão da Guarda Presidencial, foi ajudante de ordens de Fernando Henrique Cardoso e chefiou o Gabinete do Comandante do Exército, em Brasília na gestão do general Villas Boas. Atualmente, após se tornar general e entrar para o alto comando, tornou-se chefe do departamento de Educação e Cultura do Exército.

Durante cerimônia, em São Paulo, em homenagem aos militares brasileiros mortos no Haiti, Paiva fez o discurso que chamou a atenção da equipe de governo. Além de defender a soberania do voto em Lula, ainda atacou o ambiente de desinformação sem controle entre os bolsonaristas. Ele reafirmou o “espírito de corpo” dos militares em defesa das instituições, independente do partido no comando.

“(Democracia) também é o regime do povo (…) É o voto. E quando a gente vota, tem que respeitar o resultado da urna. Não interessa. Tem que respeitar. É essa a convicção que a gente tem que ter, mesmo que a gente não goste”, afirmou Paiva.

Ele também disse que o Brasil passa “por um terremoto político”, estimulado por “ambiente virtual que não tem freio e de que todos nós, hoje, somos escravos”. E repudiou a adesão de militares a qualquer corrente política. “Ser militar é ser profissional, respeitar a hierarquia e a disciplina. É ser coeso, íntegro, ter espírito de corpo e defender a pátria. É ser uma instituição de Estado, apolítica e apartidária. Não interessa quem está no comando, a gente vai cumprir a missão do mesmo jeito”, completou.

Assista ao discurso do novo comandante do Exército que repercutiu durante o fim de semana:

Virada de página

Após o encontro, José Múcio Monteiro falou em “virar a página” dos atos golpistas. O ministro da Defesa disse também não ver envolvimento “direto” das Forças Armadas nos ataques em Brasília, e que os comandantes concordavam com a tomada de providências contra os militares eventualmente envolvidos nos atos.

Segundo Múcio, a troca aconteceu devidos aos últimos acontecimentos em Brasília, que causaram uma “fratura no nível de confiança” entre o atual governo e a instituição.

“Evidentemente que depois desses últimos episódios, a questão dos acampamentos e a questão do dia 8 de janeiro, as relações, principalmente no Comando do Exército, sofreram uma fratura no nível de confiança e nós achávamos que nós precisávamos estancar isso logo de início até pra que nós pudéssemos superar esse episódio”, declarou Múcio à imprensa.

Múcio afirmou, ainda, que com a troca o governo está “investindo mais uma vez na aproximação das nossas Forças Armadas com o governo do presidente Lula”.

Em entrevista à GloboNews, na última quarta-feira (18), Lula disse que os serviços de inteligência das Forças Armadas e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) falharam e não o alertaram da possibilidade de ataques golpistas. Além da crítica, Lula disse na entrevista que era necessário “não politizar” as instituições militares.

Repercussão

O deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP) afirmou que o General Tomás Miguel Paiva, comandante militar do Sudeste, “fala às tropas como um verdadeiro patriota, consciente do papel das Forças Armadas como instituição regular, permanente e de Estado. Respeito à Constituição e à democracia para servir ao Brasil”.

O deputado federal Renildo Calheiros (PCdoB-SP) considera que Paiva tem perfil legalista e contrário à vinculação dos militares a correntes políticas. “O Brasil precisa de Forças Armadas profissionais, que atuem como instituições de Estado como prevê a Constituição.”

O deputado federal Márcio Jerry (PCdoB-MA) afirmou que as Forças Armadas devem atuar sempre sob regência da Constituição. “Simples assim! Não confundir com membros das Forças Armadas que isoladamente agridem seu papel constitucional. Paz e unidade republicana, Brasil!”

A deputada federal Perpétua Almeida (PCdoB-AC) ressaltou que o novo comandante do Exército, General Tomás, “deixou bem claro sua posição sobre o papel das instituições e do bom militar: respeitar os valores da pátria, é respeitar o resultado das urnas assegurando a democracia”.