Vítimas de assédio na Caixa repudiam Bolsonaro: ‘se fosse com sua filha?’

Em entrevista ao Metropóles, presidente alegou não ter visto “nenhum depoimento mais contundente de qualquer mulher”

Jair Bolsonaro e o ex-presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães | Foto Isac Nóbrega/PR

Em carta aberta, o grupo de mulheres vítimas de assédio sexual cometido durante a gestão de Pedro Guimarães na Caixa Econômica Federal (CEF), considerou “estarrecedora” a declaração dada por Jair Bolsonaro (PL) sobre o episódio. Em entrevista ao Portal Metrópoles nesta segunda-feira (24), o presidente afirmou que não viu “nenhum depoimento contundente” nas denúncias.

Na ocasião, as vítimas relataram convites impróprios, toques indesejados além de outras formas de importunação. O assédio ainda ocorria em eventos, gabinetes, na garagem e dentro de carros da CEF. Mesmo com conhecimento do caso, Bolsonaro se limitou a dizer: “Não vi nenhum depoimento mais contundente de qualquer mulher. Vi depoimentos de mulheres que sugeriam que isso poderia ter acontecido. Está sendo investigado também”.

Em postagem no Twitter, a senadora Simone Tebet (MDB-MS) classificou como “inadmissível” a postura do mandatário. “Postura inadmissível para qualquer um, ainda mais para um presidente. Lamentavelmente, não é de se espantar, afinal, não é a primeira vez. Vamos tirar a faixa desse presidente que desrespeita e tira a voz de todas nós, mulheres”.

Nesta terça-feira (25), um dia após as declarações dadas pelo presidente, as advogadas que representam as vítimas divulgaram uma nota afirmando ser “estarrecedor” Bolsonaro dizer que “não sejam contundentes atos relatados e atribuídos ao presidente de uma instituição do porte da Caixa”.

E afirmam ser “motivo de tristeza que condutas como apalpar seios e nádegas, beijar e cheirar pescoços e cabelos, convocar funcionárias até seus aposentos em hotéis sob pretextos profissionais diversos e recebê-las em trajes íntimos, além de constantes convites para ‘massagens’, ‘banhos de piscina’ ou idas a ‘saunas’ sejam naturalizadas e tidas, repetimos, como ‘não contundentes’ pelo chefe do Poder Executivo”.

“Seria contundente, senhor Presidente da República, se o fato ocorresse com sua esposa ou filha? Acreditamos que sim. Pois saiba que, além de mulheres, também somos esposas, filhas, mães e profissionais que foram abusadas, lesadas e agredidas pela conduta de alguém que deveria ser líder, mas que optou por ser algoz.”.

Por fim, dizem que não vão se calar, apesar de posicionamentos como os de Bolsonaro. “Assim como em suas duras e desprezíveis palavras, fomos desacreditadas e relegadas à nossa própria sorte pela instituição que deveria garantir nossa integridade. Mas não nos calamos e não iremos nos calar.”

Caixa Econômica

Na última semana, a CEF confirmou o encerramento das investigações internas sobre as denúncias que envolvem o ex-presidente do banco, Pedro Guimarães contra servidores da instituição e evitou divulgar a conclusão. “O banco não divulga o documento, pois somente as autoridades competentes poderão quebrar o sigilo do conteúdo”, diz nota do banco.

A informação foi antecipada pela revista Veja e, segundo a reportagem, o relatório enviado ao MP possui 490 páginas. Guimarães caiu no dia 29 de junho após o Metrópoles revelar que o MPF investigava as denúncias de abuso. Daniella Marques o substituiu no cargo.

Leia a íntegra da carta  

Nota das vítimas de assédio sexual da Caixa em razão da recente entrevista do senhor presidente da República, Jair Messias Bolsonaro ao Portal Metrópoles

À vista de recente entrevista concedida pelo Sr. Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, ao Portal Metrópoles na qual é por ele afirmado não existir “nada de contundente” nas denúncias feitas daquele que ficou publicamente conhecido como o escândalo de assédio sexual na Caixa e no qual é investigado o ex-presidente daquele órgão, Sr. Pedro Guimarães, em nome e a pedido das VÍTIMAS que representamos na esfera criminal neste caso, temos a dizer:

Um, ser estarrecedor que para o Mandatário da nação não sejam contundentes atos relatados e atribuídos ao presidente de uma

instituição do porte da Caixa, que deveria ter instrumentos de controle e governança eficientes, consistentes em violações profundas aos corpos, às imagens e à intimidade de servidoras do órgão;

Dois, ser motivo de tristeza que condutas como apalpar seios e nádegas, beijar e cheirar pescoços e cabelos, convocar funcionárias até seus aposentos em hotéis sob pretextos profissionais diversos e recebê-las em trajes íntimos, além de constantes convites para “massagens”, “banhos de piscina” ou idas a “saunas” sejam naturalizados e tidos, repetimos, como “não contundentes” pelo Chefe do Poder Executivo;

Três, acima de tudo, é motivo de indignação e revolta que, ao minimizar a dor e o sofrimento já expressos em inúmeros depoimentos perante a Corregedoria da Caixa, o Ministério Público do Trabalho e, no âmbito criminal, o Ministério Público Federal, as vítimas tenham sua palavra posta em dúvida em contribuição ao processo de revitimização que um Presidente da República deveria ter como compromisso combater.

Por fim, em respeito à voz das vítimas reproduzimos integralmente parte sua manifestação: “Seria contundente, senhor Presidente da República, se o fato ocorresse com sua esposa ou filha? Acreditamos que sim. Pois saiba que além de mulheres, também somos esposas, filhas, mães e profissionais que foram abusadas, lesadas e agredidas pela conduta de alguém que deveria ser líder, mas que optou por ser algoz. E, assim como em suas duras e desprezíveis palavras, fomos desacreditadas e relegadas à nossa própria sorte pela instituição que deveria garantir nossa integridade. Mas não nos calamos e não iremos nos calar. A verdade, apenas a verdade, é suficientemente contundente para fazer justiça e para que outras mulheres não sofram o mesmo que nós.

Brasília, 25 de outubro de 2022.

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Com informações de agências

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