Economista de Lula defende retomada do papel do Estado nos investimentos

Guilherme Mello defendeu a volta do modelo do Bolsa Família, mudança no controle fiscal com fim do Teto de Gastos e criticou a solução de Bolsonaro para os combustíveis

Guilherme Mello, assessor econômico da chapa Lula-Alckmin

O economista Guilherme Mello, que assessora a campanha do ex-presidente Lula (PT), afirmou nesta quinta-feira (15) que um possível governo da coligação Brasil da Esperança, a partir de 2023, buscará retomar investimentos e gastos em programas sociais, o protagonismo da Petrobras na economia e mudanças fiscais significativas diante da desmoralização e ineficiência do Teto de Gastos. Ele pontuou as medidas prioritárias da agenda de um novo governo no curto e longo prazos, com ênfase na retomada do papel do Estado na economia, por meio dos bancos públicos.

Mello saiu em defesa de uma política econômica anticíclica para atrair investimentos e alavancar o crescimento econômico. “É só seguir uma regra anticíclica, regra flexível, que priorize investimentos, gastos de boa qualidade, que garanta credibilidade. E para isso precisa de pacto político”.

Volta do Bolsa Família

Guilherme Mello

De acordo com o economista, nos primeiros meses, a gestão buscará a volta da valorização do salário mínimo, um novo programa de transferência de renda, renegociação das dívidas das famílias e impulso nos investimentos públicos.

“Nós substituímos um programa premiado mundialmente [Bolsa Família], que alcançava as pessoas, protegia as famílias e ajudou a tirar o Brasil do mapa da fome por um programa mal desenhado”, disse o economista sobre o Auxílio Brasil. 

Para ele, o programa é mal desenhado por permitir que um homem solteiro ganhe o mesmo que uma mãe com três filhos. Além disso, o programa retirou os incentivos à escolarização e à vacinação das crianças, marcas do antigo Bolsa Família, que faz falta.

O economista ainda garantiu que os R$ 600 do Auxílio Brasil serão mantidos, como tem dito Lula. “Temos que trabalhar com a conjuntura que temos ou criamos um abismo social no próximo ano. Quem ganha os R$ 600 não pode, de um ano para outro, passar para R$ 400”, afirmou.

A proposta vai no sentido oposto do governo atual, que enviou orçamento para 2023 com o menor valor histórico programado para os investimentos públicos, cerca de R$ 22,4 bilhões, dos quais apenas R$ 4,7 bilhões para infraestrutura. Tal valor equivale a aproximadamente 0,21% do PIB. Enquanto isso, apenas para as emendas de relator (orçamento secreto) estão destinados 19,4 bilhões de reais.

Estabilidade, credibilidade

Com essas medidas sociais, Mello admitiu que, no primeiro ano, haverá um aumento da dívida pública. Mas ressaltou que uma provável volta de Lula à Presidência tornará o ambiente econômico estável e que, a partir daí, as condições de crescimento retornam.

“Há um quadro de turbulência, mar revolto, que exigirá uma enorme habilidade para estabilizar”, afirmou. “Isso parece ser o avesso do que o atual governo faz. Ele trabalha na base do conflito e ameaça, e produz crises recorrentes”.

Mello defendeu a construção de um novo arcabouço fiscal, porque o atual, para ele, perdeu credibilidade ao ser alterado sistematicamente. A longo prazo, o economista pontuou a necessidade de uma reforma tributária e um novo modelo de regime de controle fiscal para substituir o Teto de Gastos. 

Questiona em entrevista, Mello explicou que a regra do teto como está, não existirá com Lula. “Iremos negociar com o Congresso e por meio de PEC, mudar a forma como se vinculam as despesas. Iremos ter um controle dos gastos públicos, mas com um novo desenho, o tornando mais flexível, priorizando investimentos e menos austero”.

”Precisamos de novo arcabouço fiscal crível, que priorize investimentos e gastos de qualidade. Ao longo do tempo, recupera crescimento, arrecadação, estabiliza dívida pública para em um momento reduzi-la”, avaliou.

Segundo Mello, a tributação dos mais rico beneficiaria 96% da população brasileira, e tem sido defendida pelas candidaturas adversárias, também. “É preciso tributar as grandes rendas e os grandes patrimônios e com o ganho de arrecadação diminuir a tributação sobre consumo e folha de salários”.

A proposta de uma alíquota de 15% sobre lucros e dividendos foi aprovada na Câmara dos Deputados, mas ainda precisa da apreciação do Senado. Segundo Paulo Guedes, a medida pode liberar 70 bilhões aos cofres públicos por ano, o que seria suficiente para bancar a manutenção do pagamento de 600 reais prometidos para o Auxílio Brasil, que tem um custo estimado de 52 bilhões de reais.

Nova Petrobras

O economista defendeu que a Petrobras se transforme em uma empresa de energia e desenvolva sua capacidade de refino, para evitar ser apenas exportadora de óleo cru. “É repensando o papel da Petrobras, como uma empresa de energia, mas também como instrumento de gerenciar choques de custo, como é o atual”, declarou.

“A Petrobras se tornou uma empresa exportadora de petróleo cru”, disse o professor da Unicamp, que prosseguiu: “[isso] quando até as grandes empresas privadas de petróleo estão cada vez mais se tornando empresas de energias renováveis. Estamos ficando no passado”.

Sobre o financiamento da empresa, Mello defendeu que uma parte do lucro da empresa seja destinado a investimentos em pesquisas.

“A Petrobras é líder em lucro global”, disse. “Ela precisa continuar financeiramente sadia, mas redirecionar parte significativa em reinvestimento em pesquisa, inovação e em áreas que vão garantir a soberania energética”.

Além de um papel voltado para buscas de novos modelos energéticos sustentáveis, o economista defendeu que a petroleira atue para evitar que os preços dos combustíveis sofram com os choques externos.

“Não é tirando do ICMS dos governadores e quebrando o financiamento da Saúde, da Educação e da Segurança Pública nos estados que se resolve o problema”, declarou em referência à medida do governo do presidente Jair Bolsonaro (PL). “Além de uma empresa de energia, será um instrumento de gerenciar choques de custo”.

Mello participou em Brasília de um seminário com assessores econômicos dos candidatos à Presidência da República para apresentar os programas de governo. O evento foi organizado pelo Conselho Federal de Economia (Cofecon), Conselho Regional de Economia do Distrito Federal (Corecon-DF) e Fórum Nacional pela Redução da Desigualdade. 

Participaram do evento, além de Mello, Carlos Arthur Newlands Junior, da candidata Sofia Manzano (PCB), Nelson Marconi, aliado de Ciro Gomes (PDT) e Eduardo Almeida, da campanha de Vera Lúcia (PSTU).

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