Bolsonaro manipula nome de Deus, mas não segue Jesus, diz Frei Betto

“Enquanto Jesus propõe ‘amai-vos uns aos outros’, ele insiste em estimular a prática de ‘armai-vos uns aos outros’. Ou ‘Pátria armada, Brasil’”, escreve Frei Betto

O presidente Jair Bolsonaro (PL) não vive “os valores ensinados pela Bíblia” e não pode ser considerado um “seguidor” de Jesus Cristo – mas faz “manipulação política do nome de Deus”. A denúncia é do frade dominicano Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto.

“O segundo mandamento da lei de Deus, conhecida como decálogo, é ‘não usar o santo nome de Deus em vão’. E, no entanto, nunca se viu um presidente da República evocar tanto o nome de Deus como o atual ocupante do Planalto”, escreveu o líder religioso em artigo publicado nesta quarta-feira (31) na Folha de S.Paulo.

“Que mal há em evocar o santo nome? Nenhum, se a pessoa se esforça por viver os valores ensinados pela Bíblia, considerada por nós, cristãos, a palavra de Deus. Não é o caso do Inominável”, agrega Frei Betto. “Enquanto Jesus propõe ‘amai-vos uns aos outros’, ele insiste em estimular a prática de ‘armai-vos uns aos outros’. Ou ‘Pátria armada, Brasil’.”

Segundo o frade, o uso da religião para fins eleitorais não é novo, mas o presidente brasileiro protagonizou uma série de fatos que o expõem junto à opinião pública. “Bolsonaro, na infância, foi batizado na Igreja Católica. Adulto, se fez batizar, na Judeia, pela igreja evangélica”, lembra Frei Betto. “Como se o sacramento do batismo admitisse segunda edição.  Mero jogo político ao perceber o crescimento dos evangélicos no eleitorado.”

Para o religioso, que foi torturado sob o regime militar (1964-1985) e teve de se exilar, a relação de Bolsonaro com a ditadura é outra evidência de sua ideologia essencialmente anticristã. “Como considerar discípulo de Jesus um homem que é devoto do coronel Brilhante Ustra, um dos mais cruéis torturadores da ditadura militar?”

Frei Betto afirma que Jesus criticou “duramente” quem se aproveita da própria religião ou se corrompe:  “Isso faz lembrar padres e pastores que falam mais do diabo que de Deus, ameaçam os fiéis com as penas do inferno, inflam nas pessoas os sentimentos de culpa, enquanto recolhem o dinheiro sofrido dos pobres para viverem como marajás. Por isso, estão dispostos a apoiar o governo que assegura seus privilégios, não cobra impostos das igrejas e concede a elas sistemas de rádio e televisão”.

O artigo de Frei Betto lembra o modo criminoso como Bolsonaro enfrentou a pandemia de Covid-19. “Ora, será que pode ser considerado seguidor de Jesus um governante que nada faz para impedir a mortandade de quase 700 mil pessoas por Covid e ainda receita medicamentos condenados pela ciência; libera a importação e o comércio de armas, para alegria dos bandidos; arranca recursos da saúde e da educação para abastecer orçamentos secretos; ignora as vidas dos indígenas; e faz piada de mau gosto a respeito dos quilombolas, como se fossem porcos pesados em arrobas?”

Frei Betto conclui: “Esta não é uma eleição entre o bem e o mal. É, sim, entre a morte e a vida. Você, eleitor cristão, escolhe. Mas tenha presente o que disse Jesus: ‘Ele não é o Deus de mortos, e sim de vivos’ (Mateus 22,32)”.

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