Dirigente sindical do Peru defende nova Constituição e direitos trabalhistas

Para o secretário-geral da Confederação Geral dos Trabalhadores do Peru (CGTP), Gerônimo López Sevillano, “a hora é de avançar contra o retrocesso herdado do fujimorismo”

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O Peru vive uma situação de instabilidade, com campanhas contra o presidente Pedro Castillo. Na opinião do secretário geral da Confederação Geral dos Trabalhadores do Peru, Gerônimo López Sevillano, há uma queda de braço entre democracia e barbárie, com a direita querendo o retorno aos tempos do ditador Alberto Fujimori, que governou o país entre os anos 1990 e 2000.

Segundo ele, a direita não aceita impor limites à terceirização, quer o Peru tomado por empresas privatizadas, em que impere o poder das transnacionais e dos bancos, completamente dependente do estrangeiro.

Por outro lado, os trabalhadores apostam na democracia defendida com força pela mobilização popular, pois “a hora é de avançar”. Gerônimo Lópes Sevillano avalia que o governo também peca ao não agir de forma mais ágil e eficaz no enfrentamento aos problemas e ao não dar seguimento a uma agenda desenvolvimentista.

Gerônimo Lopéz Sevillano, secretário geral da CGTP

Para o dirigente da Confederação Geral dos Trabalhadores do Peru (CGTP), a principal organização sindical do país, “a direita fascista, representada pelo fujimorismo, combate o presidente Pedro Castillo porque quer o país submisso, como ao longo de décadas. É contra o aumento do salário mínimo, o direito à negociação coletiva, de greve e de formar sindicatos. Não aceita impor limites à terceirização, quer o Peru tomado por empresas privatizadas, em que impere o poder das transnacionais e dos bancos, completamente dependente do estrangeiro”, afirma.

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O dirigente sindical diz que mesmo sem ter o governo, “a direita tem o poder político, o poder da República, e seus aliados são os grandes oligopólios. Então se posiciona em bloco. Sem ser governo, quer seguir fazendo o mesmo de antes”.

Ele explica que o presidente Castillo é governo, mas não tem o poder político. “O seu poder é a mobilização social do povo, dos trabalhadores e, por isso, deveria fortalecer suas bases de sustentação e aprofundar as mudanças pelas quais os peruanos foram às ruas”.

Uma das principais bandeiras que o presidente levantou ao longo da campanha, recordou Sevillano, é uma nova Constituição, um novo contrato social. Por isso, “o povo peruano exige uma Carta Magna discutida desde baixo, como acertamos com os comitês constituintes, organizados”. Por outro lado, há interesses do “Congresso retrógrado, que arquivou o Projeto de Lei apresentado pelo governo, porque não aceita qualquer tipo de mudança. Frente a isso o que o governo diz? Eu já apresentei o PL e agora a bola está nas ruas, para ser jogada pelo povo. É a população quem tem de exigir que se convoque a Constituição”.

Enquanto ocorre esta queda de braço e o governo vacila em aprofundar mudanças, “o Congresso, que é o nosso inimigo, está sabotando o desenvolvimento e modificando 54 artigos da Carta Magna, conforme os interesses do grande capital, tornando irrecuperáveis patrimônios públicos que foram privatizados e desnacionalizados, a fim de que não possam ser recuperados”.

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Ele se refere a mais de 230 empresas estatais privatizadas: “as de mineração, nas quais está o nosso ouro, prata e cobre; a Petroperu, com o petróleo e o gás; as elétricas; vendidas a preço de banana e onde desapareceram US$ 100 bilhões, em valores da época”, afirma.

O que restou como responsabilidade estatal foi a educação e a saúde, setores que agora estão sendo privatizados aos poucos, com os centros de saúde privada e a educação pública e gratuita debilitada. “Este governo, dirigido por um professor, tem a grande tarefa de ampliar o orçamento para reconstruir e valorizar o ensino público. Da mesma forma, na questão da saúde, em que as empresas se fizeram milionárias com o Covid-19. A pandemia deixou claro que estávamos sem estruturas hospitalares, sem pessoal, sem equipamento, porque era o que convinha ao poder econômico: lucrar com a desgraça da saúde da população”, explicou. 

Para perpetuar esta lógica excludente, denuncia o sindicalista, a direita conta com “toda a mídia escrita, radial e televisiva, que responde a um só monopólio e está aliada aos partidos de direita para derrubar Castillo. E, infelizmente, há pessoas que, por não verem mudanças, não analisam esta oposição golpista do Congresso, que barra qualquer avanço”, avalia.

Sevillano conta que os meios de comunicação não publicam nenhuma mobilização dos trabalhadores, não cobrem nenhuma marcha, nenhuma entrevista, só dão espaço para a oposição contra Castillo.

Política antinacional e antitrabalhista de Fujimori

Desde o golpe de Alberto Fujimori, em abril de 1992, foi implementada uma política antitrabalhista que debilitou completamente o movimento sindical, período no qual poucas organizações sobreviveram. As privatizações jogaram milhares de trabalhadores e dirigentes sindicais na rua, muitos receberam incentivos para deixar os empregos, caso contrário, eram demitidos.

Pedro Castillo assinou compromisso com a CGTP e conclamou os trabalhadores a defenderem a democracia

Nesta trajetória, relatou o líder da CGTP, passaram décadas de neoliberalismo e corrupção comprovados, em que tivemos cinco presidentes sob julgamento, alguns na prisão e outro que se suicidou [Alan García].

Diante deste quadro, assinalou, “Pedro Castillo se apresentou como professor rural, camponês, um dirigente sindical do magistério, em contraposição aos Fujimori, respaldados por grupos mafiosos, metidos com o narcotráfico e com a corrupção – como no caso da Odebrecht e outras firmas de construção”.

Com isso, há muitas dificuldades para a implementação de um programa de governo. “A única sustentação social e política com que conta este governo é o povo organizado, são os trabalhadores, e sobretudo a CGTP que tem uma longa trajetória de lutas, um histórico de batalhas nas trincheiras democráticas”.

Neste contexto de mobilizações dos movimentos sociais ocorrem marchas camponesas e de trabalhadores, que entre outras reivindicações, propoem “uma nova Constituição e uma segunda reforma agrária frente à escassez de alimentos”. O dirigente sindical conta que esta reforma agrária seria dirigida ao pequeno agricultor que abastece o mercado nacional, hoje prejudicado pelas grandes cadeias exportadoras de alimentos. Também defende que uma nova Constituição garanta os direitos sociais e trabalhistas.

Negociação coletiva

Sevillano denuncia que por mais de quatro décadas os servidores do Estado, não tiveram negociação coletiva. A CGTP lidera as três confederações que dirigem cerca de 80% dos servidores e conseguiu aprovar uma lei no Congresso, ainda no governo de Martin Vizcarra (de julho de 2016 a março de 2018). A negociação coletiva no setor público para o reajuste se deu sobre o orçamento aprovado no governo anterior ao de Castillo, o que traz dificuldades.

Sevillano acredita que “não há falta vontade política por parte deste governo, tendo sido aprovado [no orçamento atual] 840 milhões de sóis [cerca de US$ 210 milhões], fazendo com que este aumento incida na valorização de pensões e aposentadorias, entre outros avanços”.

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A Central Sindical apresentou ao presidente peruano uma agenda trabalhista com a qual ele se comprometeu. Entre as reivindicações estão o aumento do salário mínimo – congelado há quatro anos -, a negociação coletiva por ramo de atividade, o direito à greve, e o tema da “suspensão perfeita” de trabalho, porque com a Covid-19 os empresários começaram a suspender funcionários a seu bel prazer, aplicando pausas temporárias na empresa. [O dispositivo permitia que o empregador suspendesse o pagamento do salário mensal, sem romper o vínculo empregatício].

Sevillano conta que, “conseguimos um aumento do salário mínimo de 930 para 1.025 sóis, o que não nos satisfaz porque a cesta básica familiar está em 1.800 sóis para quatro pessoas, mas é um avanço, um gesto deste governo depois de quatro anos”.

O governo também pôs fim ao mecanismo da ”suspensão perfeita de trabalho”. “Por este meio, os empresários pressionavam os trabalhadores a se demitirem. E chamavam a isso de ‘suspensão perfeita’. O governo entendeu nosso pleito e pôs fim a este dispositivo”.

Sobre a terceirização de quase 70% da mão de obra no Peru, a CGTP dialogou durante quatro meses com o governo e foi proposto um decreto para impor limite à terceirização na atividade-fim. Com maioria no Congresso, a direita apresentou um projeto de lei para derrubar este decreto. “Esta é uma luta que ainda estamos travando para conseguir frear mais este atentado”, conclui o dirigente da CGTP.

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