Emergência sanitária ainda é desnecessária para epidemia de varíola dos macacos

As características de contágio, baixa letalidade e baixa notificação de casos permitem que o sistema de saúde consiga manter o controle da epidemia. O importante agora é esclarecer a população sobre o risco de contágio.

Instalação do Centro de Operação de Emergências (COE) para a varíola dos macacos (monkeypox) no Brasil. Brasília, 29.07.2022. Fotos: SVS

Os Estados Unidos declararam, nesta quinta-feira (4), a varíola dos macacos uma emergência de saúde pública, com casos aumentando no país. O ministro da Saúde do Brasil, Marcelo Queiroga, por sua vez, disse hoje que, por enquanto, não vai declarar emergência de saúde pública por considerar que o sistema de saúde tem condições adequadas para atender o quadro que se anuncia.

O infectologista Marcos Boulos

O infectologista Marcos Boulos disse ao portal Vermelho que a emergência pública faz sentido nos EUA, que já soma um quarto de todos os casos da doença no mundo, com 6,6 mil notificações. Segundo dados da OMS, mais de 26 mil casos em 80 países já foram confirmados. A decretação autoriza que o governo invista mais no atendimento e atenção específica a esta doença, podendo acelerar a produção e distribuição de vacinas.

“Aqui também é provável que a emergência seja declarada, não tão longe, para dar uma atenção privilegiada para a doença”, disse o médico. Para ele, quando os números chegam ao patamar dos EUA, ligam um sinal de alerta para o risco de progressão geométrica da contaminação.

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Coordenação nacional

Boulos, no entanto, concorda com o ministro que o número de casos ainda não é significativo para afetar de forma danosa o sistema de saúde, como ocorreu com a covid. Também não é uma doença tão grave e letal como a varíola, que era particularmente perigosa para crianças. São raros os casos de mortes notificados.

De acordo com o Ministério da Saúde, o Brasil registra 1.860 casos confirmados de varíola dos macacos nos estados de São Paulo (1.404), Rio de Janeiro (200), Minas Gerais (75), Distrito Federal (37), Paraná (36), Goiás (38), Bahia (12), Ceará (4), Rio Grande do Norte (4), Espírito Santo (5), Pernambuco (7), Tocantins (1), Acre (1), Amazonas (3), Pará (1), Paraíba (1), Piauí (1), Rio Grande do Sul (18), Mato Grosso do Sul (5), e Santa Catarina (7).

Ele acredita que, até o momento, as medidas de coordenação nacional esperadas estão sendo tomadas. “Basta ver que já estão se mobilizando para adquirir vacinas. Embora a produção ainda seja muito limitada, mas, pelo menos, não estão recusando a compra da vacina, como ocorreu com a covid-19. Aparentemente estão fazendo a lição de casa”, analisou o especialista.

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O Ministério da Saúde espera que o primeiro lote com 20 mil doses do imunizante contra a varíola dos macacos chegue no final do mês de agosto. As vacinas foram encomendadas junto à Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) e à Organização Mundial de Saúde (OMS).

Para Boulos, o fundamental agora é educar e vacinar grupos em que a doença está incidindo mais, como profissionais de saúde e pessoas que estão praticando sexo de forma mais intensa e promíscua. 

No entanto, o infectologista considera que o momento é delicado para campanhas de conscientização sanitária. Ele observa que o Brasil passa por um quadro político muito intenso, no meio de uma pandemia que ainda não terminou. “Está havendo, sim, alguma noticiação, em que a população pode encontrar informação adequada sobre a doença”.

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Progressão geométrica

Outra aspecto que diferencia a postura diante desta epidemia é o fato da monkeypox não ser predominantemente de transmissão aérea. No caso da covid, a transmissão aérea coloca toda a população em risco de contágio. 

A transmissão por gotículas respiratórias é mais rara, pois demanda contato próximo e prolongado. Por isso, o uso de máscaras como uma proteção contra a infecção é recomendado para situações específicas, como em hospitais.

Para esta varíola, a contaminação se dá por contato físico, principalmente com as feridas. Desta forma, se observa que as primeiras vítimas têm sido pessoas que fazem sexo com muitos parceiros, embora ambientes aglomerados também possam espalhar o vírus. 

A doença apresenta sintomas leves, incluindo febre, dores e lesões na pele cheias de pus, como espinhas, e as pessoas tendem a se recuperar num período de duas a quatro semanas.

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“O mais necessário no momento é orientar o sistema de saúde sobre uma doença nova que não era atendida, até então. Os médicos precisam estar atentos às peculiaridades de diagnóstico para não comer bola”, recomendou.

A testagem da monkeypox também é menos complicada que a covid. O diagnóstico é fundamentalmente clínico, baseado nas lesões cutâneas. O PCr ainda não está suficientemente desenvolvido, o que demanda preparação dos laboratórios de testagem.

Estado com maior incidência

O governo de São Paulo anunciou, hoje, o lançamento de iniciativas de combate à doença. O plano de enfrentamento inclui a criação de um centro de controle e de uma rede integrada para o diagnóstico laboratorial e atendimento a pacientes com a doença.

Na maior parte dos casos, a doença não requer internação hospitalar. No entanto, diante de quaisquer sinais ou sintomas como febre alta e súbita, dor de cabeça e aparecimento de aumento nos gânglios é necessário procurar atendimento médico especializado ou unidades básicas de saúde (UBSs). O isolamento reduz os riscos de transmissão da doença. Os pacientes devem evitar o compartilhamento de objetos pessoais como toalhas e roupas de cama.

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O secretário de Ciência, Pesquisa e Desenvolvimento em Saúde de São Paulo, David Uip, afirmou que profissionais da saúde foram capacitados para o diagnóstico da doença. Há também tratativas de articulação municipal com treinamento das vigilâncias epidemiológicas.

Além dos hospitais gerais, as maternidades têm competência para atender alta complexidade, protocolando o pré-natal, perinatal e puerpério. A assistência aos pacientes inclui equipes com a participação de dermatologistas, pneumologistas, infectologistas, enfermeiros e dentistas.

O Governo de São Paulo também divulgou protocolos clínicos específicos para mulheres grávidas, puérperas e lactantes com a doença. No estado de São Paulo, já foram registradas duas gestantes com a infecção.

Foi recomendado dar preferência pela cesariana, a depender das lesões causadas pela doença (que costumam atingir a área genital) e suspender a amamentação do bebê por pelo menos 14 dias. O objetivo é evitar o contato físico entre o bebê e a mãe contaminada, pois são considerados grupo de risco para letalidade.

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