Agronegócio se descola de Bolsonaro e faz acenos a Lula

Apoio a Bolsonaro, embora ainda hegemônico no agronegócio, sofrerá “dissidências”

Na relação da chapa com os ruralistas, Alckmin é tido como “emissário da campanha no setor” e “porta-voz do Lula” [Foto: Ricardo Stuckert]

O agronegócio não está mais 100% alinhado à gestão Jair Bolsonaro (PL) – e não é por falta de diálogo. Ao contrário: conforme levantamento do Observatório “De Olho nos Ruralistas”, as multinacionais do setor tiveram nada menos que 216 reuniões com o alto escalão do governo. O total de agendas com representantes do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) é ainda maior: 278 encontros.

“As três principais corporações com essa facilidade de trânsito foram a sino-suíça Syngenta (comprada em 2016 pela ChemChina), com 81 reuniões; a JBS, com 75; e a fabricante de agrotóxicos alemã Bayer, com 60”, informa o Brasil de Fato. “Representantes da Bayer tiveram, ainda, outros 16 vezes encontros com autoridades do Executivo sem constar na agenda oficial, e chegaram a se reunir com o presidente.”

Reportagem da Reuters aponta, no entanto, que o apoio a Bolsonaro, embora ainda hegemônico no agronegócio, sofrerá “dissidências”. Segundo a agência, “representantes do setor abriram canais de negociação” com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em busca de alguns compromissos. Ainda que pontualmente, o agro começa a se descolar do bolsonarismo.

As adesões foram consideradas bem-vindas pela pré-campanha de Lula, que segue em busca da mais ampla frente para derrotar Bolsonaro. É o que justifica o apoio do petista à pré-candidatura do deputado federal Neri Geller (PP-MT) ao Senado. Ex-ministro da Agricultura no governo Dilma Rousseff PT), Geller é vice-presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).

Não bastasse a insatisfação com os rumos do governo Bolsonaro, expoentes do agronegócio apostam na vitória de Lula nas eleições de outubro e já querem antecipar conversas. Na visão de Geller, a aproximação de Lula com o agro “cresceu muito” nos últimos meses. Mas Lula – explica a Reuters “nunca esteve afastado do agro de fato”.

“Além de manter bom relacionamento com nomes importantes da área, como o ex-governador do Mato Grosso e ex-ministro Blairo Maggi, o petista já teve algumas reuniões com representantes do setor”, informa a agência. “Em janeiro deste ano, Blairo e Carlos Ernesto Augustin –outro empresário do setor e irmão de Arno Augustin, ex-secretário do Tesouro no governo Dilma– articularam um encontro com nomes do setor, que incluiu empresários ligados à Confederação Nacional da Agricultura (CNA).”

Um dos trunfos de Lula nessas conversas é o vice em sua chapa, o ex-governador paulista Geraldo Alckmin (PSB), tido como “emissário da campanha no setor” e “porta-voz do Lula”. Seu foco é no interior paulista, mas Alckmin “também deve ir a outros estados, em viagens independentes do ex-presidente, para conversar com o setor. Em agosto estão previstas algumas agendas no Tocantins e em Mato Grosso, em uma espécie de preparatória para as viagens de Lula”.

De acordo com o Correio Braziliense, Alckmin já tem “cumprido uma intensa agenda com caciques do agronegócio. Os encontros vêm acontecendo há algumas semanas, sem a presença do presidenciável, mas com o ex-presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Marcello Brito, a tiracolo”.

A ex-ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira concorda com a aproximação e diz que conversar com o agronegócio não inviabiliza avanços na pauta amboental. “Primeiro se tem que ganhar a eleição – e esses são arranjos que viabilizam a eleição. Outra coisa será a política depois da eleição”, afirma Izabella. “É na transição que se faz a convergência de ideias.”

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